Professora chamada de 'macaca' em sala de aula: 'Escola está sendo omissa'
Na lista de presença de uma das salas de aula, no lugar onde deveria constar o nome da professora Ana Koteban, 41 anos, estava escrita a palavra "macaca". A ofensa racista, registrada na Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio Professor Linneu Prestes, localizada em Santo Amaro, zona sul de São Paulo, foi identificada primeiro por outros dois educadores da instituição, que levaram o ocorrido à secretaria da instituição, e depois avisaram Ana.
Em entrevista a Universa, ela conta que o episódio aconteceu no dia 24 de outubro e que a diretoria da escola tomou conhecimento da situação por volta das 10h, mas só a notificaram no final da tarde. Para Ana, a instituição tem sido omissa e negligente no enfrentamento ao caso de racismo.
"Na minha percepção, uma ação institucional deveria ter sido adotada e eu deveria ter sido informada imediatamente. Para mim houve uma negligência, algo dessa gravidade não pode ser tratado como um assunto deixado para depois. Será que se o colega não tivesse comentado, eu não ficaria sabendo e nada teria sido feito a respeito?", diz.
No dia 26, a professora registrou um boletim de ocorrência por injúria racial na Delegacia de Polícia de Repressão aos Crimes Raciais e de Delitos de Intolerância (Decradi), e no dia 27, ao questionar membros da gestão da escola se a Secretaria Municipal de Educação havia sido notificado do ocorrido, recebeu como resposta que nada havia sido feito até então.
"O modo de operação do racismo institucional se dá pela omissão. Quando uma escola reproduz uma educação sem levar em conta esses fatores da diversidade, está reproduzindo a desigualdade que existe na sociedade, então quando a escola não faz nada para enfrentar essa situação, ela está colaborando", afirma Ana, que é professora de sociologia.
Menos de uma semana depois, no dia 1º de novembro, foram encontrados símbolos nazistas em uma das mesas da escola, as quais Ana fotografou e encaminhou para a Decradi incluir nas investigações. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que "diligências estão em andamento visando à identificação da autoria dos crimes''.
Ana, que esperava acolhimento frente à situação, foi notificada pela escola por cobrar posicionamento dos colegas e dos alunos. Segundo a educadora, uma aluna disse que se sentiu agredida pela cobrança e outra funcionária da instituição afirmou que foi assediada moralmente.
"Essa senhora registrou junto ao diretor uma reclamação dizendo que eu cometi assédio moral contra ela, porque eu perguntei no corredor da escola se as pessoas não têm vergonha de ficar cooperando com a normalidade institucional em um ambiente no qual aconteceu um crime gravíssimo", relata a professora.
'Impacto emocional muito grande'
A falta de acolhimento e demora da escola para se posicionar sobre o caso tem provocado um "impacto emocional muito grande" na professora, segundo ela descreveu. "Eu não estou calma, não estou tranquila", afirma.
"Se somos uma sociedade que pretende efetivamente combater o racismo, todos nós precisamos nos responsabilizar sobre isso e ter cuidado com a vítima. O problema de resolver o racismo é que esperam que a pessoa negra, que é a vítima, dê a resposta sobre o que as pessoas brancas têm que fazer e como elas têm que se posicionar", desabafa Ana.
O que diz a Secretaria Municipal da Educação
Universa entrou em contato com a Secretaria Municipal da Educação (SME) que afirmou, por meio de nota, que "repudia qualquer ato de discriminação e racismo" e que a a Diretoria Regional de Ensino instaurou apuração interna para investigar a ocorrência.
Além disso, a pasta afirmou que o Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem, que conta com psicopedagogos e psicólogos, "prestará todo o apoio necessário durante o processo" e que está acompanhando o caso. O comunicado também diz que a escola promove ações constantes com temáticas antirracista e inclusivas.
No entanto, Ana afirmou que não recebeu nenhum tipo de assistência até o momento, que não tem ciência de nenhum processo administrativo em andamento e que não recebeu nenhuma informação por escrito.
"Ontem a supervisora foi até a escola, não para falar comigo e sim para falar com o diretor e resolver as burocracias. Eu pedi para falar com ela, ela disse que seria bom me ouvir e eu falei tudo o que tinha acontecido e que achava que isso tinha que ser tratado institucionalmente. A resposta dela foi que a escola está pensando", afirma a professora.
A educadora também afirma que nenhuma medida efetiva foi tomada por iniciativa da instituição de ensino e que o assunto tem sido tratado como "um problema da professora Ana Paula".
"Como se fosse um assunto pontual, uma brincadeira de mau gosto. Todas as ações que aconteceram até agora têm sido por pressão minha e de estudantes e colegas de trabalho que passaram a se posicionar", afirma.
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