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Redes sociais: como os filtros prejudicam sua saúde mental

Na busca por likes, usuários de redes sociais usam ferramentas de modificação de imagem e filtros - Getty Images
Na busca por likes, usuários de redes sociais usam ferramentas de modificação de imagem e filtros Imagem: Getty Images

Karina Hollo

Colaboração para Universa

10/01/2022 04h00

O padrão de beleza do século 19, ilustrado em anúncios de revista da época, exigia uma cintura tão fina que era impossível de uma mulher alcançá-la naturalmente. As que mordiam a isca e tentavam se encaixar nesses moldes apelavam para espartilhos superapertados, que inclusive faziam mal à saúde. No começo dos anos 2000, o Photoshop virou um aliado das mulheres que queriam propagar barrigas ainda mais retas, seios empinados e bumbuns mais redondos, disparando uma busca por dietas malucas. Hoje, o que pega são os filtros de Instagram. Demi Lovato, por exemplo, usa o tempo todo - o que passa uma ideia irreal e isso, lógico, afeta os seus seguidores.

O quanto a busca pelo rosto perfeito pode ser prejudicial à saúde mental? "Esse ideal é um fenômeno observado em função da pressão das redes sociais, numa busca compulsiva por likes. Usando as ferramentas de modificação de imagem ou os filtros, muitos querem ter aquela aparência que no mundo real é difícil ou até impossível de atingir", analisa André Maranhão, médico cirurgião plástico membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.

E aí, a pessoa exibe uma excelente aparência na rede social, mas por vezes tem dificuldade em estabelecer relações pessoalmente, uma vez que ao vivo a história é diferente. "Isso pode levar a uma baixa autoestima e, em casos mais severos, a depressão", alerta ele.

Tem mais: nessa busca, muitos podem procurar tratamentos estéticos de baixa qualidade ou profissionais não formados adequadamente e acabar sendo expostos a riscos como infecções, deformações e necroses de difícil correção.

Filtro todo poderoso


É fato que hoje as redes sociais influenciam muito o ideal de corpo e rosto - com direito a aplicativos e filtros que moldam face, afinam o nariz, deixam a boca mais preenchida, eliminam manchas, dão um ar mais coradinho, secam o abdômen? "Há 20 anos atendo pacientes que chegaram até mim ansiosas para terem corpos parecidos aos das celebridades e, agora, querendo fazer procedimentos da moda influenciadas pelo que veem nas redes sociais", fala o cirurgião plástico Victor Cutait, de São Paulo, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).

Ele ressalta que é muito importante informar sobre os riscos e intercorrências que podem acontecer, especialmente no pós-cirúrgico, além de entender as expectativas de cada paciente, suas motivações e fazê-lo entender que cada pessoa é única e que a beleza é múltipla e não possui um padrão. "Muitas vezes, o que as pessoas precisam é de uma boa orientação e até mesmo tratar problemas psicológicos, como transtornos dismórficos, alimentares, depressão - mas não de uma plástica."

Os perigos da busca por perfeição

Bem, eles são muitos. A insatisfação gerada por distúrbios psicológicos se retroalimenta em um ciclo vicioso, tipo: a pessoa faz um procedimento para ter mais likes, isso não acontece e acaba procurando outra intervenção em seguida. "A exposição, principalmente dos jovens, a excessos e deformidades numa fase muito prematura gera mais conflitos psicológicos, além do risco de tratamentos sem indicação adequada e, por vezes, feitos por profissionais não habilitados", alerta André.

A queda do fake


"Acredito que uma das maiores tendências em 2022 seja tratamentos que tragam resultados cada vez mais naturais, valorizando as características próprias de cada pessoa, sem a necessidade de ter um rosto parecido com 'aquele filtro do Instagram'", fala a dermatologista Fabiana Seidl, do Rio de Janeiro, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica. "Esse será o ano em que o 'fake' será substituído pela realidade e autenticidade", aposta ela.

Tratamentos para amenizar a acne e manchas - e até poros mais abertos - continuam hit. Já os injetáveis devem ser usados com cuidado. "Eles são os mais procurados para o embelezamento da face, o que atraiu todo tipo de profissional em busca de maior rentabilidade. Há a ilusão de que um produto injetável pode resolver qualquer desequilíbrio anatômico, seja na face ou no contorno corporal, o que pode levar a excessos e distorções", ressalta André.

Uma grande procura ocorre também em relação ao aspecto do nariz, e a banalização do tratamento vem gerando muita deformidade. "A rinomodelação (com preenchedores) é um procedimento de aumento de proporções, no qual se injeta na ponta para levantar ou no topo. Porém, nestas áreas estão os vasos mais nobres, se houver um deslize técnico, há risco de necrose do nariz ou de cegueira, e não será de fácil resolução", explica André. Já a rinoplastia mal feita pode gerar atrofias da abertura nasal, desabamento da ponta nasal, entre outros problemas.

Tratamentos e cirurgias plásticas podem ser uma ferramenta de empoderamento e conquista da autoestima. Porém, essa pressão exagerada para atingir uma perfeição de app faz a gente perder o foco da nossa melhor versão e reforça o mito da beleza a qualquer custo.