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Paraquedista que ficou tetraplégica após cirurgia volta a saltar

Paraquedista Raquel Zendron, que ficou tetraplégica após cirurgia, voltou a saltar - Arquivo pessoal
Paraquedista Raquel Zendron, que ficou tetraplégica após cirurgia, voltou a saltar Imagem: Arquivo pessoal

Ed Rodrigues

Colaboração para Universa

06/10/2021 04h00

O que seria uma cirurgia para aliviar dores no braço fez com que a paraquedista Raquel Zendron, 34 anos, perdesse os movimentos. O problema ainda sem explicação médica mudou a vida da goiana de Anápolis, que precisou adaptar tudo no seu cotidiano e adiar um casamento. A condição de Raquel, no entanto, não a impediu de voltar a fazer o que mais ama: saltar de paraquedas. Pouco mais de um ano após do procedimento que a deixou tetraplégica, ela voltou aos céus recentemente na companhia do marido.

O salto duplo foi registrado por amigos da escola de paraquedismo e as imagens viralizaram. "Meu marido me disse: 'Você pode fazer tudo que quiser, mas com adaptações'. E assim minha felicidade em saltar me foi devolvida", conta Raquel a Universa.

A paraquedista afirma que sempre gostou de esportes radicais. Fez seu primeiro salto de paraquedas aos 19 anos, em Anápolis (GO), cidade a pouco mais de 100 km de Goiânia.

"Foi um salto duplo. Na época, nem sabia que existia curso e que poderia seguir com isso. Em 2017, fiz outro salto duplo com amigos. Foi muito legal e pensei: 'é isso que eu quero para minha vida'. Queria fazer o curso. E foi naquele dia que conheci meu marido, que participava de uma competição, dentro do avião", lembra.

Paraquedista - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
A paraquedista Raquel Zendron, 34 anos
Imagem: Arquivo pessoal

Daí para a frente, os saltos ocorriam a cada 15 dias. Raquel já havia saltado 65 vezes quando ficou paralisada. "Meu último salto foi em agosto de 2019", relembra.

Um problema em um dos braços levou a paraquedista a ser submetida a uma cirurgia de hérnia de disco, no início de 2020. As dores que sentia provocaram perda na força do braço esquerdo. Segundo ela, o procedimento seria relativamente simples, uma vez que não haveria a necessidade de colocar qualquer tipo de utensílio não biológico, como parafusos, por exemplo.

Era para ter sido um procedimento tranquilo. Mas quando terminou, eu estava sem movimento algum. Só mantive o dos ombros. Os médicos até hoje não sabem dizer o que aconteceu. Tive uma lesão medular na C5 e C6, como se tivesse sofrido um acidente.

Raquel Zendron, paraquedista

Raquel ficou 15 dias na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e mais uma semana no hospital. No começo da recuperação, ela não tinha consciência da gravidade da lesão. "Eu achava que tinha um edema e que isso passaria rápido", diz.

Paraquedista - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Paraquedista que ficou tetraplégica volta a saltar
Imagem: Arquivo pessoal

"Graças a Deus, já recuperei alguns movimentos depois da fisioterapia. Para minha lesão, estou melhor do que o esperado. Fiz cirurgias recentes, há seis e sete meses, que ajudaram muito. Já tenho movimentos dos braços e consigo equilibrar o tronco me apoiando. Antes disso, eu dizia que era uma gelatina."

A recuperação de Raquel tem participação do marido, o também paraquedista e militar Jefferson Lages, 33 anos.

"Desde o primeiro momento, tive de manter a calma, ajustar a administração da família, ainda em formação. Me esforcei constantemente para manter a esperança dela. Disse sempre que, apesar de tudo, eu estaria junto a ela, independentemente de qualquer diagnóstico médico", diz Jefferson.

O cuidado e o carinho do marido, além do esforço de Raquel nas sessões de fisioterapia, deram força para que ela decidisse voltar a saltar, mesmo que de maneira adaptada. "Meu marido me ajudou muito. Ele me dá força na recuperação e me ajuda com os exercícios de fisioterapia."

Eu já tinha pensado em saltar, mas não sabia se poderia. Perguntei aos médicos e eles disseram que sim. Foi uma festa para nós e os amigos. O pessoal da escola e meu marido já foram fazendo a preparação. Tudo para ter bastante segurança

Raquel Zendron

O retorno ao salto, explica Jefferson, não foi exatamente como eles gostariam, porque antes da cirurgia Raquel já era capaz de saltar sozinha.

"Assim que nos conhecemos, o plano era continuarmos nos especializando no esporte enquanto construíamos nossa vida de casal. Seguir viajando e saltando em outros locais. Ainda não foi o que aconteceu, mas trazer aquele sorriso novamente ao rosto dela, poder juntar os amigos para um salto especial, vê-la sentindo novamente o vento no rosto, que eu sei que ela tanto ama, foi uma experiência de vida espetacular", avalia.

Paraquedista - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
A paraquedista Raquel Zendron e o marido, Jefferson Lages
Imagem: Arquivo pessoal

Medidas de segurança

Para realizar o salto, algumas medidas de segurança foram tomadas. Em primeiro lugar, o salto duplo foi guiado por um paraquedista experiente, que apontou quais seriam as possibilidades e limitações de movimentos.

"O Paulinho Marques dizia e apenas executávamos as ações se a Raquel estivesse confortável. Além disso, todos os paraquedistas que ali estavam eram amigos de longa data e extremamente experientes —Bruno Ayres, Nathan Carvalho, Clariana Ferreira, Helio Rubens, Allender Durigon, Paulo Junior. Somando o total de saltos de cada um temos mais de 10 mil saltos", diz Jefferson.

Senti uma felicidade. Não senti medo, nem nada. Pensei que poderia ficar triste por não ter o controle do paraquedas. Mas fiquei agradecida a Deus por poder retornar, pelo marido e amigos que tenho. Foi felicidade plena.

Raquel Zendron

Na preparação foram utilizadas duas faixas de velcro para manter as pernas de Raquel juntas, sendo uma fita colocada na coxa e outra nos calcanhares.

"Foram utilizados dois mosquetões nas fitas de velcro e uma corda passando pelos mosquetões e presa no tirante de peito, para manter as pernas levemente flexionadas durante a queda livre. Quando o paraquedas estava aberto, serviu para puxar um pouco mais as pernas para realizarmos um pouso mais seguro", explica.

Novas prioridades

Hoje Raquel e Jefferson moram juntos na casa dos pais dela em Anápolis. A mudança foi necessária por causa do espaço, mais confortável para a fisioterapia, e pela possibilidade de ter uma rede de apoio mais bem estruturada.

O problema na cirurgia fez com que o casal adiasse a cerimônia de casamento. Eles chegaram a ver o local onde morariam e a mobília para a residência, mas precisaram rever o planejamento e as prioridades.

"Estávamos noivos, com casamento marcado para 2020. Já tínhamos visto a casinha em Rondonópolis. Quinze dias antes da cirurgia, a gente estava lá para ver os móveis. Tivemos de adiar um pouco os planos, mas em agosto do ano que vem vamos oficializar", diz Raquel, animada.