Topo

Estupro e suas marcas: o que Lady Gaga e outras famosas já relataram

Lady Gaga relembrou, em documentário, a violência sexual que sofreu - Reprodução/Instagram
Lady Gaga relembrou, em documentário, a violência sexual que sofreu Imagem: Reprodução/Instagram

De Universa

21/05/2021 12h07

Lady Gaga revelou em entrevista ao programa "The Me You Can't See", lançado nesta sexta-feira (21) na Apple TV, que foi estuprada aos 19 anos por um produtor musical e que a violência resultou em uma gravidez indesejada.

Abalada, a cantora relembrou que foi chantageada dentro de um estúdio: ou cedia à violência ou teria as músicas queimadas. "Eu simplesmente congelei e eu não consigo nem lembrar. Primeiro senti uma dor total, depois fiquei paralisada", disse. Gaga revelou ainda que passou meses trancada convivendo com o agressor e que ele a deixou na esquina da casa dos pais quando se deu conta de que ela estava grávida.

Além dos machucados pelo corpo, riscos de contrair uma infecção sexualmente transmissível e de engravidar, a violência sexual deixa também profundas marcas psicológicas. Estudos brasileiros e internacionais, além da experiência dos profissionais especializados, apontam que o episódio pode ser estopim para diferentes condições. De acordo com o Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), ao menos 23,3% das vítimas notificadas desenvolvem estresse pós-traumático. Fora ele, ansiedade, transtornos alimentares, fobias e vício em drogas também são repercussões possíveis.

É o caso da cantora, cujos traumas persistem. Em 2019, ela conta que teve um surto psicótico durante as gravações do filme "Nasce uma Estrela" e entrou em estado de paranoia. Para além do diagnóstico de fibromialgia, relatou que passou anos sofrendo com as mesmas dores no corpo que sentiu na hora do abuso. "Já fiz tantas ressonâncias magnéticas e exames que não encontram nada. Mas meu corpo se lembra", declarou.

Não importa o local: seja na indústria artística, no meio acadêmico ou dentro da própria casa, mulheres seguem sofrendo em episódios de violências sexuais. No Brasil, em 2019, foram registrados 66.123 boletins de ocorrência de estupro e estupro de vulnerável em delegacias, o equivalente a uma agressão a cada oito minutos.

Relembre a seguir relatos de sobreviventes que, como Lady Gaga, também carregam as marcas dessa violência:

Luiza Brunet : "Você finge que não aconteceu. Mas volta, constantemente, porque é um trauma"

Luiza Brunet sofreu abuso por parte de um homem de 50 anos - Zô Guimarães/UOL - Zô Guimarães/UOL
Luiza Brunet sofreu abuso por parte de um homem de 50 anos
Imagem: Zô Guimarães/UOL

A Universa, a ex-modelo e empresária relembrou o primeiro episódio de violência de que foi vítima, aos 13 anos. Devido às condições financeiras da família, ela lembra que aos 12 anos precisou trabalhar como doméstica. Neste primeiro emprego, sofreu abusos cometidos por um homem de aproximadamente 50 anos, que costumava frequentar o local.

"Ele sabia quando eu ficava sozinha em casa. Ele entrava e ia direto onde eu dormia. E batia na porta. Não consigo e nem quero lembrar o que ele falava, mas ele me encostava na parede e eu ficava imóvel. E me cheirava e colocava a mão no meu peito e dentro da minha calcinha. Me lembro de um gemido também. Não houve penetração", contou.

O medo de ser mãe estava entre os principais traumas que Luiza desenvolveu. "Fiquei achando que o abuso poderia ser repetir com meus filhos. Resisti a ter babá porque achava que alguém poderia abusar deles."

Hoje, depois de ter sofrido violência física durante o relacionamento com ex-marido, o empresário Lírio Parisotto, ela reflete: "Aprendi muito com tudo isso, com o abuso que sofri aos 13 e com as agressões que sofri aos 54. Essa pausa na minha vida, de estar sozinha agora, é como uma limpeza mental e física para me livrar de todos os resíduos que me levam àquela primeira lembrança do abusador. Agora me sinto como uma orquídea florescendo, pronta para começar a olhar pela janela."

Alexandra Gurgel: "Levei muito tempo para ter relações novamente"

Alexandra Gurgel iniciou a vida sexual em uma relação sem consentimento - Carol Caixeta/UOL - Carol Caixeta/UOL
Alexandra Gurgel iniciou a vida sexual com uma relação sem consentimento
Imagem: Carol Caixeta/UOL

Se hoje a ativista é uma inspiração para mulheres que buscam elevar a autoestima e aceitar o próprio corpo, no passado isso não poderia estar mais longe da realidade. Alexandra, que odiava a própria imagem e lutava contra o espelho, viveu uma relação abusiva quando era mais nova.

Aos 18 anos, conheceu o primeiro namorado. "Minha primeira vez foi um estupro. Ele era evangélico. Não usava camisinha e me dava pílula do dia seguinte. Tomei mais de 17. Meu ginecologista falou que não fiquei estéril por um milagre. Tinha final de semana em que eu tomava três pílulas", disse a Universa.

O que viveu na época se transformou em dificuldades para se relacionar novamente. Somadas aos dogmas e tabus religiosos, foram responsáveis por adiar as novas experiências sexuais de Alexandra até os 26 anos. "Levei muito tempo para me masturbar. Nunca tive educação sexual para me conectar com meu corpo."

Naomi Wolf: "Achava que eu deveria me envergonhar por ter sido abusada"

Naomi Wolf sofreu violência sexual duas vezes - David Levenson/Getty Images - David Levenson/Getty Images
Naomi Wolf sofreu violência sexual duas vezes
Imagem: David Levenson/Getty Images

A jornalista e escritora, autora do livro "O Mito da Beleza", também falou publicamente sobre suas experiências. A Universa, rememorou o episódio em que foi sexualmente abusada por um professor da Universidade de Yale, aos 19 anos. Falou também sobre um estupro sofrido aos 7, cometido por um rapaz que cuidava dela enquanto os pais estavam fora de casa.

"Por muito tempo, não falei sobre o abuso que sofri, porque remonta a um tempo da minha vida em que era vergonhoso ter sido estuprada uma vez. Isso ter acontecido duas vezes, então, era incrivelmente vergonhoso", disse na ocasião.

O sentimento relatado, a vergonha, é o principal trauma que carrega. Entretanto, hoje, já conseguiu ressignificar o processo de falar sobre o assunto. "Acho importante contar essas histórias, porque quero ser um ser humano completo e não ter uma parte importante da minha vida trancada, esquecida em um porão. Falar sobre isso protege as meninas. Como mulheres, vivemos em um campo de batalha. Sobreviver a uma agressão sexual é estar na linha de frente dessa guerra."