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Pedido feito na UTI: "Graças às enfermeiras, realizei meu sonho de casar"

Pedido feito na UTI: "Graças às enfermeiras, realizei meu sonho de casar" - Arquivo Pessoal
Pedido feito na UTI: "Graças às enfermeiras, realizei meu sonho de casar" Imagem: Arquivo Pessoal

Bárbara Therrie

12/04/2020 04h00

Juntos há oito anos, a vendedora Amanda Costa Werneck, 25, e o caminhoneiro Emerson Werneck, 32, viveram um trauma: perderam um filho com 1 ano e 8 meses. Tempos depois, um susto: repentinamente, Emerson teve que ser internado com fortes dores abdominais quando estava longe de casa.

Na UTI do hospital em Foz de Iguaçu (PR), ele fez uma surpresa à vendedora: pediu-a em casamento na frente dos profissionais de saúde. As enfermeiras organizaram tudo, do vestido de noiva à recepção, tudo foi feito no próprio hospital. Nesse depoimento, Amanda divide a história do casal:

Casamento no hospital - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Amanda e Emerson, no casamento no hospital
Imagem: Arquivo Pessoal

"Eu e o Emerson nos conhecemos em 2012 pelas redes sociais. Nós tínhamos alguns amigos em comum, eu vi uma foto dele no Facebook, o achei bonito e enviei uma solicitação de amizade. Ele aceitou e nós começamos a conversar. Emerson é caminhoneiro, estava sempre viajando, por isso, demoramos um pouco para nos ver pessoalmente.

Durante uma festa em uma praça no nosso bairro, um amigo comentou que o Emerson estava lá. Nos encontramos, ficamos e começamos a namorar. Com oito meses de namoro, eu engravidei e nós fomos morar juntos. Não foi uma gravidez planejada, mas ficamos felizes, eu tinha planos de ser mãe.

Filho diagnosticado com leucemia

Tive uma gestação difícil, com vários episódios de sangramento, risco de aborto, internação e muito repouso. Apesar dessas intercorrências, o Pedro nasceu saudável no dia 14 de maio de 2014. Até o sexto mês meu filho estava ótimo, mas, a partir daí, teve vários problemas de saúde.

Demoramos seis meses para descobrir que ele tinha leucemia. Foram oito meses de tratamento com quimioterapia. Dois dias antes de fazer o transplante de medula óssea, o Pedro teve insuficiência respiratória, hemorragia pulmonar e faleceu com 1 ano e 8 meses, no dia 27 de janeiro de 2016.

Uma parte de mim morreu com o meu filho. Até hoje não consigo superar a morte dele.

Um tempo depois, meu marido voltou a trabalhar e fui viajar com ele de caminhão por três meses. Nós dávamos força um para o outro, mas evitávamos tocar no assunto. Ele dizia que tínhamos que dar continuidade à nossa vida. Era triste, mas ele estava certo. A vida continuava.

Sonho de casar na igreja

Casamento na igreja - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Com o padre, na capela do hospital
Imagem: Arquivo Pessoal

Apesar de morarmos juntos, eu e Emerson não éramos casados no papel nem no religioso. Nós somos católicos, eu queria casar não somente para estar na lei dos homens, mas principalmente na lei de Deus. Meu sonho era casar na igreja, vestida de noiva, toda de branco e com a minha família presente.

Eu me emocionava e chorava toda vez que ia a algum casamento. Achava linda a pregação do padre e a troca de votos. Sempre falava para o meu marido: 'Vamos casar, Emerson. Vamos oficializar a nossa união'. Mas ele dizia que precisávamos esperar mais um pouco, que não era o momento, que tínhamos que juntar dinheiro. Os anos foram se passando e a gente continuava na mesma.

Em 18 de novembro de 2019, meu marido foi internado com fortes pontadas e dores na barriga durante uma viagem a trabalho em Foz do Iguaçu (PR). Ele foi transferido do atendimento de emergência para o Hospital Municipal Padre Germano Lauck.

Viajei de Ribeirão Branco, no interior de São Paulo, até Foz para ficar com ele. Ao longo dos dias, o quadro dele se agravou e ele teve várias complicações: diarreia, a barriga ficou grande e inchada, saiu líquido dela, ele teve síndrome urêmica e os dois rins pararam de funcionar.

Ele ficou duas semanas na UTI e teve de fazer hemodiálise, durante cinco horas, todos os dias. Fazia vários exames, mas os médicos não conseguiam fechar um diagnóstico. Eu ficava muito nervosa por essa situação. Já tinha perdido meu filho, não queria perder meu marido.

Pedido de casamento na UTI

festa - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Na confraternização depois da cerimônia religiosa
Imagem: Arquivo Pessoal

Com o tempo, Emerson fez amizade com as enfermeiras. Um dia elas comentaram que havia tido um casamento na capela do hospital e perguntaram se meu marido era casado. Ele respondeu que apenas morava comigo, mas que meu sonho era casar. As enfermeiras o encorajaram a fazer o pedido, disseram que organizariam tudo.

Em 16 de dezembro, fui para mais uma visita. Conversamos o de sempre, disse que ele aparentava estar melhor, perguntei como tinha sido o dia dele. Na hora de ir embora, uma das técnicas pediu para eu aguardar um pouco e o colocou sentado.

Na frente das enfermeiras, do médico e dos outros pacientes, ele perguntou: 'Você quer casar comigo?'.

Respondi: 'Eu quero'. Ele me deu um abraço e todos bateram palmas e nos parabenizaram. Não esperava aquela atitude do meu marido, ele é supertímido.

Casamento na capela do hospital

Quando respondi que sim, imaginava que iríamos organizar o casamento na igreja depois que ele recebesse alta. Mas a enfermeira-chefe da UTI me chamou na saída e perguntou se eu aceitaria casar na capela do hospital em dois dias.

Fiquei surpresa e disse que sim. Não estava acreditando. Como seria tão rápido? A única coisa que ela me pediu foi a nossa certidão de nascimento. Disse para eu ficar tranquila que ela e as outras enfermeiras e técnicas organizariam tudo, eu não precisaria fazer nada.

Pensei que seria uma cerimônia bem simples, só eu, meu marido e o padre, mas, naquele mesmo dia, a enfermeira me mandou mensagem perguntando alguns detalhes do casamento: como eu gostaria da decoração, se queria um vestido branco simples ou um de noiva e qual música gostaria que tocasse.

No dia seguinte, fui visitar meu marido. Ele comentou que estavam providenciando um terno para ele. Disse que Deus estava usando aquelas profissionais para realizar nosso casamento. Minha sogra também estava no hospital. Ela ficou alegre por nós, disse que nós merecíamos essa felicidade por tudo que já tínhamos passado juntos.

Vestido parecia ter sido feito sob medida

Ao terminar a visita, fui provar o vestido. A amiga de uma enfermeira o emprestou, além do véu, da grinalda e da sandália dela. Ele era lindo, todo rendado, com uma abertura nas costas.

O vestido ficou perfeito em mim, não precisou de nenhum ajuste, era como se ele tivesse sido feito para mim. Fiquei muito emocionada.

Em 18 de dezembro de 2019, o grande dia, cheguei mais cedo para me arrumar. A filha de uma enfermeira era maquiadora e me deu a maquiagem de presente. Uma das enfermeiras fez escova no meu cabelo, enrolou as pontas e fez um moicano na franja. Uma outra doou o buquê.

Eu me olhava no espelho e me achava linda. Graças às enfermeiras, estava realizando o meu sonho de casar. Tenho um sentimento inexplicável por elas, uma gratidão imensa de pessoas que vou levar com carinho para o resto da minha vida.

Entrei sozinha na capela ao som de "Aleluia". Meu marido chorou ao me ver. Eu fiquei emocionada ao vê-lo na cadeira de rodas. O padre fez a pregação e a parte que mais me tocou foi quando prometemos que estaríamos juntos na saúde e na doença — exatamente o que estávamos vivendo naquele momento.

Nós trocamos simbolicamente as alianças que já usávamos, que tinha sido dos avós do meu marido. Nos beijamos e fomos declarados marido e mulher.

Festa com música

Todos os convidados, formados pelas enfermeiras, técnicas, médicos, parentes das pessoas que estavam internadas, minha sogra e minhas duas cunhadas, celebraram conosco. Depois fomos para outra sala para a confraternização.

A decoração estava bonita e delicada, toda em amarela e azul. O bolo, os docinhos e os salgados, uma delícia. Apesar de não ter sido no lugar que eu havia idealizado, meu casamento no hospital foi lindo, com direito a vestido, decoração, música e festa.

Emerson ficou pouco na confraternização, ele ainda estava abatido, precisava descansar.

Ele me disse que, ao se ver naquela situação doente, ele compreendeu que a vida é um sopro, que devemos fazer as coisas no presente, depois pode ser tarde demais.

Acho que ele ficou com medo de piorar, de não se curar e de não casar comigo. Naquele mesmo dia, ele saiu da UTI e foi para o quarto.

Ao total, ele ficou internado 44 dias. Apesar de não ter recebido um diagnóstico, ele melhorou: a barriga desinchou, os dois rins voltaram a funcionar, ele teve alta e nós fomos para casa no dia 31 de dezembro de 2019, deixando para trás as coisas ruins e trazendo conosco as coisas boas para o ano que se iniciaria.

Emerson continuou a fazer acompanhamento médico em Itapeva, em São Paulo, e nunca mais teve nenhum problema. Casamos no cartório no dia 6 de fevereiro. Agora oficialmente marido e mulher, com ele bem de saúde, estamos lutando por mais um sonho: ter um outro filho.

Esse bebê não vai substituir o Pedro, que, se estivesse vivo, hoje teria quase 6 anos. Mas nos dará a oportunidade de um recomeço para a nossa família."