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Com 20 kg a mais, até a grana aumentou: "Não penso mais em dieta"

Com 20 kg a mais, Vanessa se considera mais feliz - Acervo pessoal
Com 20 kg a mais, Vanessa se considera mais feliz Imagem: Acervo pessoal

Ana Bardella

De Universa

25/10/2019 04h00

"Não se destrói o patriarcado com fome": a frase, dita pela nutricionista Fernanda Imamura, virou estampa de pano de prato — e logo em seguida viralizou no Instagram. A profissional, que exerce a nutrição comportamental, se declara contra as dietas por um motivo específico: quando as mulheres estão obcecadas com o próprio peso, policiando cada refeição e odiando a própria imagem, não têm energia para fazer mais nada.

"Tirei a inspiração do livro O Mito da Beleza, escrito por Naomi Wolf", conta Fernanda. Em um dos trechos da obra, a pesquisadora norte-americana afirma: "Fazer dietas é o sedativo político mais potente na história das mulheres". Parece radical? Não para quem sentiu os efeitos da obsessão por emagrecer na própria pele.

"Minha vida financeira melhorou"

Vanessa  - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Hoje a publicitária foca a energia em outras coisas
Imagem: Acervo pessoal

Vanessa Musskopf, publicitária de 35 anos, começou a ficar paranoica em relação à alimentação ainda na adolescência. "Nos anos 90 a magreza era lei, pouco se via de corpos diferentes sendo representados em revistas ou na TV", lembra. Foi por não aceitar a própria imagem que ficava longos períodos sem comer e desenvolveu compulsão alimentar. Somente aos 34 anos o cenário mudou. "Fui diagnosticada com depressão e resolvi investigar meu comportamento", conta.

A publicitária buscou uma terapeuta e uma nutricionista comportamental. "Desde então passei a focar minha energia e, consequentemente, meu tempo, em atividades mais prazerosas. Aprendi mais sobre colagens, astrologia e fotografia", lista. Mas a transformação não ficou só nos hobbies: Vanessa notou a diferença no bolso. "Senti que precisava aperfeiçoar meu negócio e expandir minha rede de contatos. Deixei de ser a pessoa cujo grupo de amizades giravam em torno de beleza ou dietas", relata.

Hoje ela tem 20 kg a mais do que costumava ter, mas não considera isso um problema. "Não enxergo mais a comida como punição. O processo de amar meu corpo tem sido construído dia a dia e passou bem longe das academias e das clínicas de estética. Cada vez mais percebo que autoestima tem a ver com me permitir ser quem eu sou", diz.

"O feminismo me mostrou: estava de dieta há anos e não sabia"

Bianca só entendeu que não gostava da imagem quando se percebeu feminista - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Bianca só entendeu que não gostava da imagem quando se entendeu feminista
Imagem: Acervo pessoal

Bianca Cecília dos Santos tem 34 anos e trabalha como secretária. "Sempre fui gordinha, mas gostava de pensar que o peso não era uma questão para mim. Mesmo me considerando bem resolvida, pensava todos os dias que não podia comer pão ou tomar sorvete, porque essas eram coisas que engordavam", conta. A sombra do emagrecimento a qualquer custo também permeava sua rotina de atividades físicas. "Eu ia para a academia odiando muito, mas achava que essa era a única possibilidade. Nenhum outro tipo de exercício traria um retorno rápido para a balança", detalha.

Quando a ficha caiu? "Tinha 25 anos quando me familiarizei com a palavra feminismo. Fui estudar, pesquisar. E de repente entendi: estava de dieta há anos sem saber. Meu corpo sempre me incomodou, mas só agora tinha coragem para admitir", relembra. Agora, ela tenta desconstruir a visão de anos que teve sobre a própria imagem. "Estou em processo de aprendizagem. Percebo o quanto era cruel comigo mesma. Hoje sou mais gentil", conclui.

Nutricionista contra a dieta?

Fernanda explica que a abordagem comportamental é uma forma diferente de trabalhar a alimentação. "Não quer dizer que o paciente vá comer tudo o que quiser e na hora que quiser. Levamos em conta diversos fatores para promover autocuidado e saúde", diz. Na área, as dietas radicais não aparecem como método de trabalho. "Elas são feitas para não funcionar. E quando a pessoa falha, só fica mais frustrada", esclarece.

Apologia à obesidade? Não, diversidade.

"O que noto é que as pessoas têm confundido a diversidade de corpos com uma espécie de promoção da obesidade", ressalta. Na visão da especialista, isso ocorre porque muitos enxergam o ódio ao corpo como agente de transformação, como se ele estimulasse uma mudança. "A ideia é endossada por profissionais da nutrição, inclusive. Mas a verdade é que o ódio só causa frustração e não motiva ninguém", argumenta.

"A pessoa que odeia a própria imagem não cuida do corpo. Pelo contrário: pouco se importa com a própria saúde. A tendência é que ignore a existência dele. Com isso, não se interessa por fazer atividades físicas, esquece os exames e nem vai aos médicos", exemplifica. O caminho proposto para se reconectar com o corpo? Parar de idealizar. "É preciso entender que tudo bem ser da forma como é e estudar o que pode ser feito com o corpo dentro dos limites dele naquele momento", garante. É dessa forma, a especialista explica, que se inicia o processo de aceitação.