Topo

"Tenho que me adequar?" Como L. Munniz, elas sofrem ao comprar roupa grande

Lettícia Munniz - Paola Guzman/Mega Models
Lettícia Munniz Imagem: Paola Guzman/Mega Models

Lucas Vasconcellos

Colaboração

27/09/2019 04h00

A história é velha e conhecida das brasileiras: roupas que só vestem basicamente um tipo de corpo -- que lembra um pouco o da Barbie. O padrão, além de inatingível, não condiz com as curvas que vemos no Brasil, como destacou a humorista e modelo Letticia Munniz. Nesta quinta-feira (25), ela publicou uma série de vídeos em seus Instagram relatando a dificuldade em encontrar roupas que, apesar de na etiqueta dizerem ser seu tamanho, na verdade não servem.

Letticia usa 46, mas no vídeo, o zíper de uma saia GG não serve. Para encontrar uma camisa na mesma loja, ela precisou ir até a sessão masculina e pegar um modelo XG, pois no feminino nada cabia.

Assim como Letticia, outras muitas mulheres enfrentam uma maratona para encontrar roupas que combinem com seu estilo e tipo de corpo. É verdade que as coisas têm mudado nos últimos anos, mas ainda há muito o que ser feito, inclusive por marcas plus size que ignoram que o tamanho dos seios, quadris e barrigas não são o mesmo para todas as mulheres, por exemplo.

Universa conversou com três mulheres que vestem tamanhos acima do 46 e elas compartilharam as dificuldades em encarar um provador.

"Eu que tenho que emagrecer e me adequar?"

"Quando vou às lojas experimentar e os modelos não servem, eu saio frustradíssima. Por isso, virei adepta das compras pela internet, porque não tem meu manequim nas lojas físicas. Para garantir, em sites compro um número maior que o meu, porque ao menos posso ajustar. Como moro em uma cidade de interior, a situação é mais complicada: quando encontro algo, está sempre muito caro, acima do que a peça de fato vale. E além de tudo, elas em geral não têm estilo. A maioria das peças para mulheres gordas têm cara de roupa para vovozinhas mesmo. Por isso, se vejo algo que me agrada e serve bem, compro de uma vez.

Alessandra Alves gordofobia - Divulgação - Divulgação
Alessadra no dia de seu casamento: vestido feito sob medida e doado para outra noiva plus size
Imagem: Divulgação

Gosto muito de camisas de alfaiataria, macaquinhos, vestidos mais descolados, mas sempre tem que ser malha, algodão, coisas que tem elasticidade. Dizer que essa situação não me incomoda profundamente é mentira. Tento sempre enxergar o copo meio cheio e procuro não me deixar abater. Mas fico olhando um bando coisas que eu gostaria de usar e não tenho possibilidade, não por falta de coragem minha, mas porque o mercado não está preparado para grandes mulheres como eu. E não enxerga que somos jovens, descoladas e que queremos nos vestir assim. Nos enxergam como pessoas que precisam se esconder atrás de pano sem corte algum e com estampas horrorosas. Ficar limitada assim é um saco. Agora, eu que tenho que emagrecer e me adequar? Acho que não. As marcar precisam entender que nós existimos, consumimos e somos lindas e sexy e que precisamos de roupas que correspondam ao nosso estado de espírito".

Alessandra Alves, 32, de Mariana/MG, usa 52.

"O caimento parece ajudar a esconder o corpo, em vez de valorizá-lo"

"Eu compro roupas em lojas de departamento, quase sempre na mesma loja, do mesmo shopping, que é em Osasco (SP), porque lá tem várias lojas populares. Mas, de fato, só encontro roupas de tamanhos grandes em duas delas. As opções, além de serem beeem escassas, geralmente tem tons escuros ou aquela modelagem 'minha tia também usa'. Quando vou a uma loja, geralmente já chego preparada para passar raiva. Eu preferiria apenas comprar on-line, mas tem vezes que você quer sentir a roupa, ver como fica. E alguém fala: 'Ah, mas tem um monte de loja on-line' — se eu falar para essas pessoas que têm faculdade a distância, que têm restaurantes delivery, então ficarão em casa para sempre? Normalmente, quando escolho uma roupa, sempre pego um número maior que o meu, que oficialmente é 52, mas nunca serve. É uma enganação com a qual aprendi a lidar. A frustração, na maioria das vezes, é que quando a roupa entra, não necessariamente serve, porque o caimento parece ajudar a esconder o corpo, em vez de valorizá-lo. Quando eu era mais nova, sempre que tinha algum evento, como festa ou casamento, e pedia um vestuário específico, e eu não conseguia nada que me servisse (e olha que nem era gorda como sou hoje), sempre ouvia: 'se você se esforçasse para emagrecer um pouco, não precisaria passar por isso'. E acontece até hoje.

Recentemente, eu pensei em mudar um pouco, por que de que adianta você pensar em não se importar e ficar bem, se na hora do vamos ver não tem você na arara ou na vitrine? É como se dissessem, 'você quer ser gorda, quer estar fora do padrão? Tudo bem, mas você vai ser fora do padrão DENTRO dessas opções limitadas aqui'. E machuca a autoestima, porque não dá para ter uma identidade e quando você tem, nem sempre consegue expressá-la no seu modo de se vestir. Por exemplo, eu gosto muito de cultura pop e de futebol, sempre gostei muito de ter camisetas do São Paulo, só que preciso me limitar aos modelos que entram — mas quantas vezes eu já quis outra coisa e simplesmente não servia em mim e eu acabava comprando e dando para outra pessoa, porque eu realmente achava aquilo legal.

Existem lojas que realmente oferecem opções, elas estão começando a surgir. Aí a questão, infelizmente, é o valor. Nada é, de fato, acessível, porque muitas delas são pequenas empresas que pagam impostos caros. Dá para entender o valor que cobram, mas não quer dizer que se ajustem a minha realidade financeira. Lojas de departamento fazem média dizendo que tem peças, mas que plus size vai só até o 52? É difícil ter autoestima quando a palavra de ordem na moda para mulheres gordas é disfarçar e esconder o próprio corpo".

Carolina Rossini, 31 anos, de São Paulo, usa 52

"As marcas só enxergam mulheres que não têm coxão"

Toalá Antônia - Divulgação - Divulgação
Toalá: dificuldade em encontrar roupas desde a adolescência
Imagem: Divulgação

"Hoje, aos 28 anos, dependendo da loja, uso tamanhos que variam entre 48 e 52. Mas sou plus size desde a adolescência — e na época, usava roupas para senhora. O principal problema da moda é que as marcas não pensam em quem é gorda, pois só enxergam as mulheres magras e sem coxão. E quando a empresa é especializada em moda plus size, infelizmente cobra um preço alto, ou não pensam na diversidade dos corpos, tanto que, quando quero algo específico, faço com costureira. Me dói muito entrar em lojas que gosto, que têm peças que me interessam, e não encontro roupa para mim no setor feminino. Outro dia, perguntei em uma loja de departamento famosa sobre a sessão plus size. A vendedora disse que não tinha, pois não vende. Como assim? Eu estava lá querendo comprar! Apesar disso, não tenho problemas de autoestima — eu acho que é por causa da educação que sempre tive em casa. A minha mãe ressaltava o quanto eu era bonita e fazia questão de ressaltar e me lembrar disso".

Toalá Antônia, 28 anos, de São Paulo/SP, veste entre 48 e 52