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Mônica Sousa: Quando entrei na empresa do meu pai, torceram o nariz pra mim

Mônica Sousa e a versão em pelúcia do primeiro Sansão, que era amarelo - Divulgação
Mônica Sousa e a versão em pelúcia do primeiro Sansão, que era amarelo Imagem: Divulgação

Natália Eiras

Da Universa

04/07/2019 04h00

A cena de "Laços", filme da Turma da Mônica com atores reais que está em exibição nos cinemas, que mais emocionou Mônica Sousa, 58, foi a que "ela" teve que se controlar para não brigar com Cebolinha. "Meu olho encheu de lágrima. Tenho que racionalizar minhas emoções antes de sair brigando", diz ela. "Trabalho isso todos os dias", diz a segunda, dos 10 filhos do cartunista.

Diretora-executiva da área comercial da Maurício de Sousa Produções, Mônica é responsável por 150 dos 350 funcionários da empresa criada pelo pai há 59 anos. "Quando cheguei na empresa, todo mundo torceu o nariz para mim. Achavam que eu era espiã da diretoria", diz ela.

Mônica diz ter se apaixonado por vendas quando começou a trabalhar, aos 18 anos, na lojinha do parque da Turma da Mônica. "Vendi muito bem e percebi que gostava disso. Ficaria entediada sendo artista", fala a diretora, que é cercada por eles na família.

Em entrevista a Universa, ela conta ainda o que aconteceu com um gerente que a maltratava na empresa do pai. Leia abaixo:

Seu pai criou a Mônica, a personagem briguenta, quando você tinha dois para três anos. Com quem, nessa idade, você já brigava?
Eu batia nas minhas irmãs! Minha madrasta da época falava para elas duas se juntarem para bater em mim.

Quando cresceu um pouco e entendeu sua personagem gostou dela?
Tive várias fases com a Mônica. Uma vez, eu achei que era tão forte quanto ela, arranjei briga e levei uma surra na rua. Meu pai teve que fazer um trabalho de conscientização de que aquilo era uma ficção. Já na adolescência, eu não gostava muito, porque, querendo ou não, meu pai estava denunciando o meu gênio para todo mundo. É uma época da vida em que você quer ser mais feminina, mais sensual. Depois de um tempo, tive que aceitar que ela é briguenta e que eu também tenho isso. No entanto, falava para o meu pai que criança nenhuma era brava como a Mônica até ter a minha filha. Paguei a minha língua. Ela não leva desaforo para casa desde bem pequena.

Qual é a cena do filme com a qual você mais se identifica?
Tem um momento em que a Mônica precisa se segurar bastante para não brigar com o Cebolinha, porque, no contexto do filme, ela não poderia. Eu me identifiquei com ela ali porque várias vezes ao dia preciso segurar a emoção e racionalizar. Nunca fui fofinha. Sou moleza com o meu neto e com os meus bichos, mas me falta essa fofura, inclusive na vida profissional.

Quando teve dimensão da relação afetiva que muitos brasileiros têm com a Turma da Mônica?
Foi nos anos 1980, quando excursionei pelo Brasil para o lançamento do primeiro álbum de figurinhas da Turma. Eu tinha por volta de 20 anos e estava em um trio elétrico na Bahia, com atores vestidos como os personagens. Pais e crianças cercaram o trio e ele não conseguia andar. Foi quando eu tive a noção da loucura, a paixão que a população tem por esses personagens.

Nas tirinhas, Mônica era chamada de baixinha, gorducha e dentuça. O "gorducha" já não é mais usado. Como foi a decisão de tirar o termo?
O mundo muda, então temos que evoluir junto. Era uma coisa que estava afetando a criançada, por isso não usamos mais o "gorducha". Aconteceu algo semelhante com o Chico Bento. Ele não nada mais peladinho como no começo das histórias. Antigamente, mostrávamos os personagens soltando balões, hoje em dia não. Eu não participei da mudança dos termos, isso foi algo discutido no estúdio. O que eu tenho feito ativamente é criado projetos como o Donas da Rua. Algumas das atividades dele são um time de futebol feminino e historinhas da Turma em que mulheres importantes da história são homenageadas.

Ter seu nome usado como "xingamento" para baixinhas e dentuças mexeu de que forma com sua autoestima?
Eu era baixinha mesmo, e ainda sou, tenho 1,52m e, claro, não tem muito o que fazer. Mas sempre tive uma autoestima bem boa em relação a isso. Têm pessoas que me contam que eram chamadas de Mônica e que têm orgulho disso. Porque a Mônica é conhecida por ser mais forte do que os meninos e saber o que quer.

Como foi começar a trabalhar na empresa de seu pai aos 18 anos de idade?
Tive que provar que eu era muito boa não só para o meu pai, mas também para mim mesma. Não queria estar na empresa por ser filha do dono, mas para fazer algo interessante. Quando entrei no departamento comercial, as pessoas viraram o nariz para mim, achavam que eu era uma espiã. O gerente da área foi o pior de todos comigo. Ele me maltratava, não queria me dar acesso aos contratos e não passava nada para mim. Mas foi um aprendizado.

E o que aconteceu com esse gerente?
Continua lá! O Wagner, hoje em dia, é a pessoa que mais confio. Ele fez o que fez por ser rigoroso com a empresa. Nós nos respeitamos e nos gostamos.

Como é ser executiva numa empresa cujo sobrenome é artístico?
Fiquei apaixonada por vendas por ser um trabalho em que tenho que brigar o tempo inteiro. É instigante, sempre existe um desafio. Adoraria ser artista, porém ficaria entediada. Todo mundo acha que sou forte, mas o que me deixa triste é dizerem que não entendo algo 'porque não sou artista'. É o que falam quando querem me tirar de lado. Trabalho há mais de 30 anos com isso; não tem mais que existir esse estigma. Conquistei o meu espaço quando comecei a faturar muito dinheiro para a Maurício de Sousa Produções, além de eu deixar claro que respeitava a área das outras pessoas, principalmente, a do estúdio.

O que você já fez, contrariando uma ordem de seu pai, que deu certo?
A gente discute pra caramba, mas nunca o desrespeitei. O meu pai costuma deixar para lá, seguir a vida depois de uma discussão. Eu sou do tipo que fica guardando para, depois, lançar "eu falei". Ele não gosta que eu faça isso, mas não aguento. Por exemplo: tempos atrás, descobri que muita gente devia para a gente. As empresas não faziam isso com os nossos concorrentes. Mostrei para o meu pai que deveríamos ser mais duros, senão não poderíamos pagar os funcionários. Somos flexíveis, sabemos das dificuldades do Brasil. Mas não vou aceitar desrespeito. Defendo com unhas e dentes a empresa da minha família.