Topo

'Capitãs' deputadas podem mudar bancada da bala, sugerem especialistas

kátia sastre - Mauricio Sumiya/Futura Press/Folhapress
kátia sastre Imagem: Mauricio Sumiya/Futura Press/Folhapress

Marcos Candido

Da Universa

09/11/2018 04h00

A delegada Sheila Pedrosa (PSL), eleita deputada estadual em Minas Gerais, foi estimulada por amigos da Polícia Civil a representar a categoria na Assembleia Legislativa mineira. Embora se una a uma bancada majoritariamente masculina do partido considerado conservador, ela deve levar temas como violência doméstica para a pauta da segurança pública.

“Quando fui vereadora em Juiz de Fora, no interior de Minas Gerais, criei projetos como um banco de emprego para mulheres vítimas de violência doméstica. Criei também uma campanha para estimular denúncias de abuso sexual em transporte coletivo, chamada 'Meu corpo não é coletivo’”, explica. Recebeu 80 mil votos para o cargo como deputada estadual.

Assim como ela, o país terá mais mulheres ligadas à área de segurança pública na Câmara Federal e Assembleias Legislativas dos Estados em 2019. Para especialistas, a presença delas pode introduzir temas como violência sexual e doméstica às ‘bancadas da bala’. 

Veja também

Quantas são e quantas serão

A nível estadual, cinco delegadas foram eleitas ao cargo de deputada estadual. Em 2014, foram apenas duas. Na ocasião passada, um delegado, um capitão, um major, dois cabos e um soldado do sexo masculino foram eleitos aos mesmos cargos nos estados. (Conheça as deputadas abaixo).

Em Brasília, duas mulheres da polícia militar vão assumir ao posto de deputada federal. Nas eleições passadas, nenhuma candidata ligada à segurança pública foi eleita para o mesmo cargo. Em comparação, naquele ano foram eleitos dois majores, quatro delegados e dois capitães da polícia do sexo masculino.

Casos de repercussão versus cargos

A maioria das eleitas neste ano atuou em delegacias de proteção à mulher, ou ganharam reconhecimento a partir de episódios de grande repercussão.

Entre os casos de destaque, estão a cabo da polícia militar Kátia Sastre (PR), que em maio deste ano atirou e matou uma assaltante em frente a uma escola em Suzano, na Grande São Paulo. A campanha de Kátia, conhecida como “Mãe PM”, mostrou as imagens da cena capturadas por câmeras de segurança. Usou como slogan de campanha a frase “atirei, e atiraria de novo”.

Outro episódio de repercussão foi o da Major Fabiana, da polícia militar do Rio de Janeiro. Em 2014, elas tornou-se conhecida ao controlar um tumulto próximo à favela do Jacarezinho. À paisana, abordou suspeitos com um revólver em punho e saltos cor-de-rosa. As imagens do episódio viralizaram nas redes.

Estados têm deputadas mais ligadas à defesa da mulher

Nos estados, as demais deputadas tiveram atuação em casos de feminicídios de grande repercussão estadual, estiveram à frente de delegacias de proteção à mulher ou ocuparam altos cargos da polícia -- com experiência na política e uma linha mais próxima aos direitos humanos.

A cientista politica e mestre em políticas públicas pela Universidade de Oxford Juliana Moura Bueno, as mulheres ligadas à segurança pública, mesmo de partidos considerados mais ‘linha dura’, podem ser unir com deputadas de diferentes espectros ideológicos em prol das mulheres.

“Por solidariedade, elas podem ser unir para evitar o sucateamento de políticas como o Ligue 180 e ampliação da Casa da Mulher Brasileira para auxílio de vítimas de violência doméstica”.

“No geral, a mulher faz o exercício, socialmente construído, de se colocar no lugar do outro. É mais fácil ela conhecer a dor de uma mãe que teve o filho assassinado, e defenda de forma incisiva leis mais duras ao homicídio, ou leis que protejam a mulher vítima de estupro. Não se pode generalizar, cada mulher tem um conjunto de crenças, mas elas trabalham e pensam mais na coletividade”, explica.

Apesar disso, ela cita ainda a imposição dos votos de bancada, que pode impor decisões mais punitivas, como redução da maioridade penal. “A fidelidade partidária de bancada para aprovar projetos de lei, sabemos que partidos como PSL, PR e DEM adotam políticas conservadoras neste tema [da segurança pública]”.

Segurança & Mulheres

Para Renato Meirelles, presidente do instituto de opinião pública Locomotiva, o que pode ter promovido a introdução de mulheres em bancadas tradicionalmente masculinas foi a reserva de 30% do fundo de campanha para candidaturas femininas.

Já na questão mais simbólica, a inclusão de mulheres na bancada de segurança tem a ver com o desgaste dos políticos tradicionais. Em pesquisa encabeçada pelo instituto de Meirelles, 90% delas não se sentiram representadas por políticos atuais, mas 72% se interessam em algum grau por política.

“Assim, mulheres eleitas passaram por três processos, que correm em paralelo: tratam do aumento da participação das mulheres na política, o desgaste das instituições tradicionais o tema concreto da segurança pública. No imaginário do eleitorado, assim como um médico entende de saúde, um militar pode entender de segurança pública”, explica.

Para o pesquisador, mesmo com pautas diferentes de bandeiras feministas em relação a temas como aborto, em comum introduzem uma defesa em prol da Lei Maria da Penha na esfera da ‘bala’.

Major Fabiana (PSL-RJ), 38 anos, deputada federal

Em campanha, Major Fabiana aparece ao lado do presidente eleito Jair Bolsonaro e Flavio Bolsonaro - Reprodução - Reprodução
Em campanha, Major Fabiana aparece ao lado do presidente eleito Jair Bolsonaro e Flavio Bolsonaro
Imagem: Reprodução

Com 57.611 votos, a candidata pelo PSL Major Fabiana venceu com o slogan "a mulher na segurança". A oficial da Polícia Militar ficou ficou conhecida em 2014, depois de ter controlado um tumulto próximo à Favela do Jacarezinho, onde um ônibus havia sido incendiado. Usando salto alto cor-de-rosa, ela empunhou o revólver a um grupo considerado suspeito; o registros da ação viralizaram na rede.

Cabo Kátia Sastre (PR-SP), 42 anos, deputada federal

Tornou-se famosa após atirar e matar em um assaltante. Durante a campanha, usou as imagens que capturaram o momento do disparo. Se tornou deputada federal, sem ter assumido cargos políticos anteriormente. Teve 264 mil votos válidos, ou 1,25% dos válidos no Estado de São Paulo.

A cabo da polícia militar Katia Sastre, que atirou e matou assaltante em São Paulo; foi eleita como deputada federal - Mauricio Sumiya/Futura Press/Folhapress - Mauricio Sumiya/Futura Press/Folhapress
A cabo da polícia militar Katia Sastre, que atirou e matou assaltante em São Paulo; foi eleita como deputada federal
Imagem: Mauricio Sumiya/Futura Press/Folhapress

Delegada Sheila (PSL-MG), 40 anos, deputada estadual

A delegada Sheila, da Polícia Civil no interior de Minas Gerais. Já foi vereadora - Divulgação - Divulgação
A delegada Sheila, da Polícia Civil no interior de Minas Gerais. Já foi vereadora por três mandatos
Imagem: Divulgação

Foi delegada regional da polícia civil no interior de Minas Gerais, e foi eleita como vereadora em 2016. Mais moderada, afirma ter sido eleita para representar a segurança pública mineira, que segundo ela carecia de um representante. Tem como bandeira combate à pornografia infantil e criação de projetos para combater a violência contra mulher. 

Delegada Gleide Ângelo (PSB-PE), 52 anos, deputada estadual

Delegada Gleide Ângelo foi eleita como deputada estadual com votação expressiva; trabalhou em investigações de crime de grande repercussão no estado - Divulgação - Divulgação
Delegada Gleide Ângelo foi eleita como deputada estadual com votação expressiva; trabalhou em investigações de crime de grande repercussão no estado
Imagem: Divulgação

Se tornou conhecida por desvendar crimes de grande repercussão em Pernambuco. Já foi do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e Delegacia de Homicídios, pela unidade de Roubos e Furtos e pela Delegacia de Homicídios de Olinda. Esteve envolvida na investigação do caso Beatriz Mota, menina de 7 assassinada brutalmente no interior de Pernambuco, em 2015. Em abril, a delegada filiou-se ao partido com a bandeira de dar apoio à mulheres vítimas de violência.

Delegada Graciela (PR-SP), 54 anos, deputada estadual

Vídeo de campanha da delegada Graciela, eleita como deputada estadual em São Paulo; vereadora por 3 mandatos, disputou prefeitura de Franca (SP) - Reprodução - Reprodução
Vídeo de campanha da delegada Graciela, eleita como deputada estadual em São Paulo; vereadora por 3 mandatos, disputou prefeitura de Franca (SP)
Imagem: Reprodução

Foi titular da delegacia especializada à proteção da mulher em Franca, interior de São Paulo. Em 2016, disputou e perdeu o cargo para prefeita da cidade. Foi vereadora de 2001 a 2012.

Delegada Martha Rocha (PDT-RJ), 59 anos, deputada estadual 

Delegada Martha Rocha, em discurso na Assembleia Legislativa fluminense; A oficial vai cumprir o segundo mandato como deputada estadual - Reprodução - Reprodução
Delegada Martha Rocha, em discurso na Assembleia Legislativa fluminense; A oficial vai cumprir o segundo mandato como deputada estadual
Imagem: Reprodução

Foi a primeira mulher na história a chefiar a Polícia Civil do Rio de Janeiro. Participou do projeto de criação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs). Além da formação em direito, tem especialização em Direitos Humanos. Em 2019, cumprirá seu segundo mandato na Assembleia Legislativa fluminense.

Delegada Adriana Accorsi (PT-GO), 45 anos, deputada estadual

A delegada Adriana Scorci, deputada estadual por Goiás. Já teve passagens por setores de direitos humanos da polícia civil goiana - Divulgação - Divulgação
A delegada Adriana Scorci, deputada estadual por Goiás. Já teve passagens por setores de direitos humanos da polícia civil goiana
Imagem: Divulgação

Em 2012, foi a primeira mulher a ocupar o cargo de Delegada Geral da Polícia Civil de Goiás. No ano seguinte, assumiu a Secretaria Municipal de Defesa Social. Em 2003, foi promovida a delegada titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depai). Em 2011 assumiu a Superintendência de Direitos Humanos da Secretaria da Segurança Pública de Goiás.