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Congelamento de óvulos: uma questão de liberdade ou nova pressão?

Daniela Carasco

do UOL, em São Paulo

13/11/2017 04h00

Um dos maiores desejos da relações públicas Cecília Manzoli, 33, é ser mãe. Solteira e preocupada com o envelhecimento natural dos ovários, que aumenta ainda mais depois dos 35 anos, ela passou a cogitar o congelamento de óvulos. Assim, pode adiar por mais alguns anos os planos de gravidez. Só que, paradoxalmente, a possibilidade vista como uma nova liberdade veio acompanhada de uma pressão pessoal.

“A maternidade virou uma questão mais efetiva, e, aí, comecei a me cobrar mais sobre ter filhos. No fundo, apesar de saber que serei bem-sucedida, mesmo não me tornando mãe, me bate uma dúvida”, conta. “Só não congelei até agora por conta do alto custo.”

A história de Cecília expõe a enorme contradição que vem surgindo com o aumento das informações sobre o congelamento de óvulos. Segundo Ana Rosa Detilio Monaco, psicóloga do Centro de Reprodução Humana Fertvitro, “apesar da liberdade de poder adiar a maternidade, existe uma pressão de pensar em algum momento em cumprir o papel da maternidade, imposto socialmente”.

A especialista lamenta que, mesmo depois de tantas conquistas das mulheres, elas carreguem ainda a responsabilidade de ter um filho quase que sozinhas.

Quais têm sido as motivações delas?

Edson Borges Júnior, especialista em reprodução humana e diretor da clínica Fertility, recebe semanalmente em seu consultório cerca de dez pacientes interessadas em congelar óvulos, com idades a partir dos 30 anos. Entre as motivações, estão a necessidade de priorizar a carreira à maternidade e a ausência de um parceiro.

A procura só aumenta. De acordo com o Relatório de Sistema Nacional de Produções de Embriões (SisEmbrio) da Anvisa, as clínicas especializadas em reprodução humana na cidade de São Paulo notaram, nos últimos quatro anos, um crescimento de 80% da procura pela técnica de congelamento.

“O aumento da informação gerou uma mudança de comportamento entre as mulheres, que, em sua maioria, procuram o procedimento por indicação de amigas. Elas têm tido cada vez mais consciência sobre o envelhecimento dos óvulos e seu impacto na fertilidade”, conta Edson.

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O congelamento é a nova pílula?

Ao contrário da psicóloga, Edson enxerga apenas os benefícios do congelamento. “É como garantir uma reserva, que proporciona maior autonomia de postergar a gravidez”, diz. E vai ainda mais longe: compara a técnica à revolução proporcionada pela pílula anticoncepcional. Desde os anos 1960, ela dá às mulheres poder sobre o controle de sua fertilidade. Responsabilidade que vem sendo cada vez mais questionada.

Ana Rosa prefere alertar para os conflitos que vêm surgindo por conta do congelamento. “O maior deles é que, ao tomar essa decisão, a mulher assume para si que não está dando conta de tudo o que achava que deveria –ser boa profissional, ter sucesso e construir uma família.”

Congelamento não é garantia e custa caro

Ambos convergem quanto às expectativas. Afinal, o congelamento não é uma garantia de gravidez a longo prazo, é só uma possibilidade maior. “Mesmo tendo congelado, elas podem não conseguir engravidar no futuro”, diz Ana Rosa. 

A orientação é para que o procedimento seja feito até os 35 anos, uma idade decisiva para as mulheres. A partir deste momento, a qualidade dos óvulos é impactada pelo processo de envelhecimento, reduzindo então as oportunidades de fecundação. Se a futura mãe tem 60% de chances de engravidar naturalmente aos 35 anos, aos 40, ela tem 30%. E a queda é cada vez mais acentuada com o tempo.

O problema é que, assim como foi relatado por Cecília, trata-se de uma alternativa cara, quase um privilégio. Edson explica que, a cada tentativa, a mulher gasta entre R$ 15 mil e R$ 17 mil reais. Em algumas clínicas, o valor chega a R$ 20 mil. Ele inclui as duas etapas do procedimento: estimulação hormonal e vitrificação. Para a manutenção do congelamento, ela precisa desembolsar, ainda, uma taxa anual de R$ 1.000, em média.

“Infelizmente, não existem alternativas de suporte àquelas que não têm condições financeiras para tal. Isso só vai acontecer quando a técnica for subsidiada pelo sistema público de saúde ou pelos convênios médicos. A curto prazo, não vejo isso acontecendo no Brasil”, conclui.