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Tatiana Vasconcellos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

No auge da cultura do cancelamento, quem não tem medo de ser cancelada?

Bárbara Heck, última eliminada do "BBB", disse que tinha medo de ser massacrada pelo público - Reprodução
Bárbara Heck, última eliminada do "BBB", disse que tinha medo de ser massacrada pelo público Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

18/02/2022 04h00

No auge da cultura do cancelamento, cá estou eu, inaugurando novos caminhos, sem medo de ser cancelada. Mentira, pensei nisso a semana toda. O gatilho foi o "BBB". Uma das participantes, Bárbara Heck, estava no paredão e apavorada com a possibilidade de estar sendo massacrada aqui fora por algum erro que tenha cometido. Esse é um medo geral no programa e fora, uma preocupação que vem com a exposição: ser cancelado por ser percebido como machista, racista ou LGBTQIA+fóbico. Note que a preocupação não é olhar para si, entender, identificar a questão e se propor a melhorar. É ser percebido como preconceituoso.

Pois bem, apesar de estar acostumada com a exposição pública, tenho me preparado para estar neste espaço de Universa consciente do lugar que ocupo no mundo: mulher, urbana, branca, cisgênero, heterossexual e privilegiada. É fácil errar desse lugar quando estamos desatentas.

Lembrei de uma ocasião na rádio CBN, onde apresento o programa "Estúdio CBN", em que reclamava da chuva persistente por vários dias em São Paulo. "Ai, não aguentamos mais chuva". Recebi um textão de uma conhecida, agricultora, que me ouvia. Assumi a falta de empatia, agradeci sinceramente pela bronca e, até hoje, toda vez que falo da previsão do tempo, me lembro dela e da importância da chuva para quem planta.

Durante muito tempo fui cobrada a saber tudo e a não errar. Era proibido errar. E eu acreditei nisso. Como prêmio, ganhei uns troféus e sintomas físicos de ansiedade. Levou tempo — do calendário e de análise —, mas compreendi o óbvio: ninguém sabe tudo, ok não saber tudo, todo mundo erra.

Ainda fico brava comigo quando erro, sobretudo quando isso fere alguém. Mas não faço parte do grupo que quando é exposto não se responsabiliza, que não se importa em ser preconceituoso, mas tem pânico de parecer preconceituoso. É o pessoal que pede desculpa "a quem se sentiu ofendido", sem admitir que fez ou falou merda.

Procuro parecer o que sou. Vivo atenta, todos os dias busco melhorar, desafiar minha formação, me desfazer de preconceitos, sem deixar de reconhecer que eles existem em mim. Felizmente, estou cercada de gente crítica, atenta e generosa que me aponta os vacilos e os erros para que eu possa notá-los, pensar sobre eles, me corrigir. E me desculpar quando é o caso.

O lance é reconhecer, recalcular a rota e seguir em frente somando aprendizados. Somos seres complexos, contraditórios e estamos em transformação.

Neste espaço, quero contar histórias, minhas e dos outros, e quero levantar temas para a gente conversar, costurar referências e transformar em texto bom de ler e de ouvir. Dizem que eu escrevo como falo, gosto disso. Vamos juntas?

Sugestão de música: "An Honest Mistake" - The Bravery