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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Cadeia e bloqueios: como Alemanha mantém neonazismo sob controle

Colunista de Universa

03/11/2022 11h45

No dia das eleições, a advogada Thaís Cremasco assistia à apuração da eleição com o filho, Antônio, de 15 anos, quando o menino, aluno do Colégio Porto Seguro, que tem origem alemã e é um dos mais famosos colégios de elite de São Paulo, foi adicionado a um grupo de WhatsApp chamado "Fundação Antipetismo".

O garoto, negro, se surpreendeu com o conteúdo do grupo e mostrou para a mãe. Em entrevista a Universa, ela disse que se deparou com frases racistas, classistas e também com símbolos nazistas. Uma das publicações tinha uma imagem de Hitler e os dizeres: "se ele faz com os judeus agora faço com os petistas". Agora, a mãe espera que eles sejam expulsos da escola.

Se morassem na Alemanha, terra de alguns de seus professores (a escola tem o alemão como segunda língua), esses estudantes não seriam só expulsos da escola. Eles teriam que se entender com a justiça. Se fossem maiores de idade, seriam presos, simples assim. Como não são, teriam penalidades de acordo com a sua idade, como multas, detenção em centro para menores infratores etc.

Na Alemanha, onde moro há sete anos, fazer qualquer alusão ao nazismo é crime. E a lei costuma ser cumprida.

Uma prova disso, um dia depois do fatídico 30 de outubro, um jovem de 19 anos foi preso em Eckental, na Bavária, depois que a polícia encontrou um grafite recém-pintado em uma estação de trem. O acusado tentou fugir, mas ele tinha tinta nas mãos e por isso foi preso.

O nazismo, infelizmente, ainda é presente na Alemanha. Mas ele é combatido todos os dias. Procurando nas notícias de jornal, você percebe que quase todo dia uma pessoa é presa em todo o país por usar símbolos nazistas. A lei é clara. É crime. Pronto.

E não são só os símbolos que podem dar prisão. Os gestos também, como, por exemplo, a saudação que ficou conhecida como "heil hitler". Exemplo: em setembro, um jovem fez a saudação em frente a uma delegação de atletas israelenses em Munique. Foi preso.

Lembrei esses casos quando vi ontem, no meio das muitas imagens absurdas de manifestações golpistas Brasil afora. vídeos de pessoas cantando o Hino Nacional e, com os braços esticados, fazendo que parece ser uma saudação nazista em São Miguel do Oeste, em Santa Catarina.

A imagem causou repulsa de entidades como a Confederação Israelita Brasileira, que pediu investigação e punição dos atos.

Sim, no Brasil nazismo também é crime. O que falta é a lei ser aplicada.

Mostrei o vídeo para meu parceiro, que é alemão e cientista político e ele disse na hora: "manda eles virem fazer isso aqui que serão presos."

"Nazis Raus"

E a liberdade de expressão? Como fica?

Não existe "liberdade de usar símbolos ou gestos nazistas". Mas, no caso da Alemanha, existe, sim, o Direito à Manifestação. Por isso, é comum que manifestações de extrema direita aconteçam, inclusive com a participação de neonazistas conhecidos e perigosos. Nesse caso, cabe à população civil tentar impedir que os fascistas marchem.

É normal que, quando uma manifestação de extrema direita é marcada, exista um protesto 10 vezes maior de pessoas que são contra os fascistas. Essas manifestações reúnem antigas, outros movimentos antifascistas e qualquer pessoa que seja contra o fascismo, como eu, como você. Os partidos políticos às vezes participam, mas as manifestações não são organizadas por eles, mas pela população, que grita: "Nazi Raus" (fora, Nazis).

Não há conivência. A ideia é realmente não dar espaço para os fascistas. Se dá certo, nem sempre. Em 2017, o partido de extrema direita AFD, amigos de Jair Bolsonaro, chegou ao parlamento Alemão. Mesmo assim, a popularidade deles se mantém estável, até em queda. Nas últimas eleições, eles tiveram cerca de 10,3 % dos votos.

O segredo? Se manter alerta, vigilante e levar a sério máxima "kein Platz für Nazis" (nenhum lugar para Nazis).