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Fabi Gomes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Os perrengues de uma maquiadora nas semanas de moda

Perrengues fashion - Thomas Barwick/Getty Images
Perrengues fashion Imagem: Thomas Barwick/Getty Images

Colunista de Universa

20/09/2022 04h00

Lá vem história... Aproveitando a temporada internacional de desfiles, deu vontade de compartilhar um dos tantos causos que já vivi na moda. Pra quem não sabe, antes de um desfile acontecer, há todo um preparo prévio que envolve essa grande engrenagem.

Fora toda produção (idealização, criação, desenvolvimento, styling, etc) da coleção em si e da realização do evento, há também os testes feitos com o pessoal responsável pela beleza do dia. Por "beleza", entenda-se cabelo, maquiagem e unhas. É onde eu entro, na maquiagem.

E o que se faz nesse teste? Idealmente, é nesse dia que se chega ao resultado final do look a ser usado pelas modelos no dia do desfile. Participam do processo: estilista (que pode ou não também ser a pessoa responsável pela direção criativa da marca) mais, muitas vezes, o stylist (pessoa responsável por fazer a curadoria de moda e montar os looks, temperando cada um com espírito do tempo, agregando ou retirando elementos) e a pessoa responsável pela maquiagem. E qual é o papel dela no processo?

Materializar a maquiagem (já que é o profissional que tem o conhecimento e técnica para tal), com base na visão e orientação de estilista e stylist, agregando, quando há esse espaço, suas percepções e propostas.

Tô fazendo essa introdução meio didática e longa pra levar vocês comigo na emoção e no momentum. No final do parágrafo anterior, menciono "quando há esse espaço", porque algumas vezes o/a estilista realmente caga quilos (perdoem minha finesse) para o que o profissional de beleza pensa ou diz. Bem, quando é assim, normalmente essa pessoa caga quilos para qualquer outro profissional que esteja abaixo dele (quase todos nesse contexto). São os enfant terrible da moda. Não precisam da opinião de mais ninguém, porque a própria genialidade e pensamento avançado lhes bastam.

Temos um pequeno cenário organizado, não é? Pois bem. Numa das tantas temporadas que participei, assinando looks de beleza para desfiles, vivi um inferno (não foram poucos). Naquela temporada, havia um dia no qual eu assinaria três desfiles. Seria o dia mais desafiador, não só pela demanda emocional envolvida, mas também pela agenda.
Dias antes, rolaram os testes de maquiagem. Acontece que, dois desses testes aconteciam no mesmo dia, e, coincidentemente, os desfiles também seriam no mesmo dia, um logo após o outro.

O primeiro teste era com um estilista que desfilaria pela primeira vez naquela importante semana de moda. Um desfile muito aguardado, tanto pela estreia, quanto por todas as críticas positivas ao trabalho dele.

Mesmo antes do dia do teste, o estilista já estava em contato comigo, compartilhando material e detalhes da coleção. Me contou sobre a inspiração, mostrou a trilha sonora e me levou por seu processo criativo. Ou seja, no dia do teste, eu já tava munida de informação e ideias. Sem falar no cuidado demonstrado ao incluir os profissionais envolvidos mais intimamente no processo. Ou seria melhor falar inteligência?

No dia do teste, o processo foi rápido e assertivo. Chegamos ao look sem sofrência e comemoramos juntos o resultado. Fruto de uma dinâmica plural, construída com escuta, trabalho e respeito.

Acontece que, saindo desse teste, eu ia para o seguinte. Assim mesmo, de um para outro. Acontece também que os desfiles seriam em ordem inversa --primeiro o desse segundo teste, em seguida o do teste mágico e respeitoso.
Chegando no atelier dessa segunda pessoa (estilista das antigas, que já gozava de algum respeito, assim como de histórias absurdas envolvendo assédio moral no mundo da moda), me deparo com duas modelos com maquiagem prévia e precariamente esboçada. Nessa época, eu já trabalhava há anos nesse meio. Portanto, já tava mais do que ligada que respeito e escuta não seriam servidos ali.

E, adivinhem, senhoras e senhores, o look era muito, mas muito parecido com o que eu havia acabado de criar para o promissor e aguardado estilista minutos atrás.

Arregalei os olhos e pensei: "Pqp, e agora?"

Continua na coluna da próxima semana...

Enquanto isso, para a fofoca pela metade não matar fofoqueiros, vem bater papo comigo no Instagram, em @fabi.gomes.