'Houston, temos problemas': engenheiro ajudou a resgatar Apollo 13 em 1970

Neil Armstrong e Buzz Aldrin ficaram mundialmente famosos como os primeiros seres humanos a pisar na Lua, mas o projeto Apollo não teria tido sucesso se não fosse pelo time de engenheiros que trabalharam no controle das missões aqui na Terra.

Jerry Woodfill era um desses engenheiros. Aos 22 anos, ele entrou para a Nasa e foi o único responsável pelo sistema de alarmes de emergência das missões Apollo. Ele morreu em 2022, aos 79 anos, quando ainda trabalhava na agência.

Em 2021, em entrevista a Tilt por meio de uma videochamada, Jerry exclamou: "Por favor, deixe isso claro na sua matéria: eu não estou aposentado". Bem-humorado, ele lamentou o erro de outros repórteres que já o citavam como "ex-engenheiro". "Eu trabalho na Nasa há 55 anos e espero chegar a 60!"

Na época da entrevista, Jerry já não trabalhava mais com a mão na massa, operando missões ao espaço como na década de 1960. Seu cargo era mais como o de um "evangelista" da Nasa: ele chegava a dar 40 palestras por ano ao redor dos Estados Unidos, tentando atrair jovens para a agência espacial norte-americana.

Com a pandemia de covid-19, Jerry fazia tudo pela internet e conseguiu alcançar até jovens de outros países. Em abril de 2021, deu uma palestra virtual para estudantes do colégio paulista Objetivo sem sair de sua casa em New Orleans, nos EUA.

O que não mudava era o orgulho que Jerry sentia de contar histórias das missões Apollo. "Fico mais orgulhoso conforme os anos passam. É como se você pescasse um peixe enorme e pudesse contar essa história várias e várias vezes."

O que rolou

De todas as missões Apollo em que Jerry trabalhou, a mais emblemática foi a Apollo 13. Lançada em abril de 1970, esta deveria ter sido a terceira vez que astronautas da Nasa pisariam na Lua. Mas a explosão de um tanque de oxigênio mudou os planos dos astronautas.

A história foi contada nos cinemas dezenas de vezes e mitificou o bordão "Houston, we have a problem" ("Houston, temos um problema"). O que muita gente não sabe é que quem estava do outro lado daquela ligação e ouviu o alerta preocupado dos astronautas foi Jerry.

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Jerry Woodfill em seu primeiro dia de trabalho na Nasa, em 1965
Jerry Woodfill em seu primeiro dia de trabalho na Nasa, em 1965 Imagem: Divulgação/Nasa

Formado em engenharia elétrica pela Universidade de Rice, no Texas, Jerry chegou à Nasa em 1965, inspirado pelo discurso que ouviu de John F. Kennedy no campus de sua faculdade em 1962. Na ocasião, o então presidente americano declarou que os EUA pousariam na Lua até o fim daquela década.

"Eu não queria ir para a Lua. Nem achava que iria me formar, estava prestes a largar a faculdade", disse Jerry. "Mas eu ouvi [Kennedy] falar. E suas palavras meio que entraram em mim". Desde então, Jerry repetia em suas palestras a mesma frase que tornou o discurso do presidente famoso no mundo inteiro: "Faremos isso não porque é fácil, mas porque é difícil".

Contratado pela Nasa —que, na época, corria contra o tempo para cumprir a promessa de Kennedy, mesmo com orçamento apertado e um planejamento arriscado—, Jerry foi escalado para cuidar dos sistemas de alerta das naves que levariam astronautas à Lua.

Em 1970, quando Jim Lovell (vivido nos cinemas por Tom Hanks) ligou do espaço para o controle da missão Apollo 13 em Houston para avisar que um tanque de oxigênio tinha explodido e a missão estava em perigo, foi um alarme desenhado por Jerry que o alertou.

Quando o nível de oxigênio dentro da cápsula começou a diminuir e o de dióxido de carbono começou a subir, uma espécie de sirene tocou no ouvido dos astronautas e o fizeram olhar para o painel da nave, onde eles puderam ver exatamente qual era o problema. Jerry foi o responsável por inserir aquele alarme sonoro nas cápsulas.

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O que aconteceu depois virou história. Sabendo que não conseguiriam pousar na Lua e voltar sem oxigênio, os astronautas da Apollo 13 tiveram que mudar o rumo da nave com a ajuda do controle da missão na Terra. O dramático retorno dos astronautas para casa em segurança marcou Jerry. "Uma experiência única na vida. Já contei essa história 3.000 vezes e nunca me canso!"

Jerry Woodfill (à esq.) trabalhando no controle das missões Apollo na Nasa na década de 1960
Jerry Woodfill (à esq.) trabalhando no controle das missões Apollo na Nasa na década de 1960 Imagem: Divulgação/Nasa

"Nunca quis ser astronauta"

Apesar do fascínio pelas missões Apollo, Jerry admitia que nunca quis ser astronauta. Ele lembrou que ganhou uma bolsa de estudos na Universidade de Rice por conta de um único jogo de basquete em que foi bem. Lá dentro, tinha as piores estatísticas do time e notas quase abaixo da média.

Por isso, ele sentia orgulho de ter entrado na Nasa mesmo após tantos "fracassos". "Eles me contrataram como engenheiro de falhas. E eu bem sabia como falhar", brincava. "Mais do que isso, eu sabia como superar uma falha."

"Kennedy disse que enviaríamos um homem para a Lua e o traríamos de volta em segurança para a Terra. Eu era o cara responsável por trazê-los de volta à Terra em segurança. Entre ser astronauta e isso, sempre achei que tinha o melhor trabalho. Ir à Lua é legal, mas não é melhor poder voltar?"

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Seu trabalho, até o dia em que morreu, não era desenvolver alarmes de emergência, mas o de inspirar as futuras gerações de cientistas, engenheiros e astronautas —inclusive no Brasil— a buscarem um lugar na conquista do espaço.

"Vocês estão fazendo coisas boas e dando a sua contribuição. Eu era só um cara em meio a 500 mil pessoas. Mas eu fiz uma coisa que fez diferença. Pessoas de todo o mundo, Índia, China, Israel e Brasil, estão fazendo a diferença. Somos um só planeta. Estamos nessa juntos."

* Com informações de reportagem publicada em 08/09/2021

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