Até barata: engenheiro cria exército de 'insetos-robôs', mas encara dilema

Um grupo de especialistas desenvolveu uma tecnologia que equipa insetos, como besouros e baratas, com uma "mochila eletrônica" para auxiliar na busca por vítimas de eventuais desastres.

O que aconteceu

O estudo tem sido conduzido na Austrália. Lachlan Fitzgerald, estudante da Universidade de Queensland, é um dos responsáveis pelo projeto, liderado pelo professor T. Thang Vo-Doan. Fitzgerald contou, em entrevista à rede norte-americana CNN, que sempre teve "um grande fascínio" por insetos. Fitzgerald revelou também que não sente nojo ao manipular enormes besouros e as baratas escavadoras nativas da Austrália, cujo tamanho pode atingir oito centímetros.

Segundo Vo-Doan, as baratas representam uma ótima opção para a criação de um "exército" de insetos-robôs. "A barata é uma plataforma incrível não somente para a robótica, mas também para estudos de biomecânica, pois elas aguentam situações adversas", declarou à CNN.

T. Thang Vo-Doan com um dos insetos do laboratório da Universidade de Queensland, na Austrália
T. Thang Vo-Doan com um dos insetos do laboratório da Universidade de Queensland, na Austrália Imagem: Reprodução/CNN Science

As placas eletrônicas desenvolvidas pelos pesquisadores são implantadas nas "costas" dos insetos. Para a realização deste processo, os insetos são submersos em gelo como forma de anestésico. A "cirurgia" consiste na fixação do chip com a utilização de fita dupla face.

Os cientistas garantem que a presença da "mochila" eletrônica não causa impactos na vida dos animais que as vestem. "A ciência não sabe se eles [os insetos] são seres conscientes", explicou Fitzgerald à CNN. Segundo o engenheiro, os insetos que recebem a placa eletrônica têm a mesma expectativa de vida dos demais animais da universidade. "Acho que eles não se importam [em usar o chip]".

A agilidade, a resistência e a capacidade de adaptação dos insetos chamam a atenção dos cientistas. Essas características, segundo os especialistas, fazem com que os insetos apresentem vantagem em relação a robôs 100% artificiais, podendo ser usados em operações de busca e resgate.

Nós vemos um futuro em que, depois de um desastre urbano, em que os humanos não conseguem acessar o local do desastre de maneira segura, nós conseguiremos enviar um exército de insetos-robôs para navegar pela zona do desastre de forma rápida e eficiente, encontrar eventuais sobreviventes e reportar essa localização.
Lachlan Fitzgerald à CNN

Insetos são controlados via chip

Após a fixação do chip, os cientistas conseguem controlar para onde os besouros e baratas devem ir. A partir da emissão de pulsos eletrônicos, as antenas dos insetos recebem a indicação da direção a seguir, além de receber estímulos para aumentar ou diminuir a velocidade de locomoção.

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Espécimes que receberam a "mochila" eletrônica. O dispositivo pode ser controlado pelos cientistas para direcionar o animal
Espécimes que receberam a "mochila" eletrônica. O dispositivo pode ser controlado pelos cientistas para direcionar o animal Imagem: Reprodução/CNN Science

Os pesquisadores ressaltam que não realizam comandos desnecessários com os animais via chip. "A beleza de um sistema biohíbrido [em que componentes naturais e sintéticos agem em conjunto] é que nós só iremos intervir caso o inseto saia do caminho que queremos que ele siga", disse Fitzgerald à CNN.

Para os pesquisadores, a total compreensão de como manipular os insetos a partir de placas eletrônicas pode levar décadas. Segundo Fitzgerald, o esforço e a demora valerão a pena. "Algumas equipes estão trabalhando em coisas que podem não parecer realidade agora, mas em 20 anos poderão ser enormes inovações tecnológicas [...] O que me anima é o potencial de salvar uma vida que seja com uma tecnologia assim."

Uso gera debates sobre ética

O uso de insetos como objetos de pesquisa divide a opinião de especialistas e da comunidade. Além do estudo na Universidade de Queensland, outras equipes de cientistas ao redor do mundo vêm utilizando diferentes espécies para seus respectivos estudos.

Em pesquisa do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), por exemplo, as águas-vivas foram as escolhidas. No estudo "Construindo águas vivas biônicas para exploração oceânica", os pesquisadores instalam um marca-passo no animal para monitorar o oceano. "Essas criaturas simples podem viajar facilmente até as profundezas dos oceanos de uma forma que nós humanos, apesar de toda a nossa sofisticação, não conseguimos", diz o estudo.

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De acordo com o Caltech, a preocupação ética é levada em consideração durante todo o processo envolvendo animais. Conforme declaração à CNN, o instituto explicou que inclui bioeticistas em pesquisas do tipo para garantir que as manipulações realizadas não gerem nenhum tipo de resposta de estresse nas águas-vivas envolvidas.

Fitzgerald reconhece que manipular besouros e baratas pode ser uma iniciativa polêmica. "Acho que é uma preocupação válida [debater a ética no uso de animais em estudos]. No entanto, acho que o potencial dessa tecnologia em salvar vidas em desastres urbanos supera qualquer hesitação que você possa ter", disse.

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