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Rússia pode ser banida de tecnologia bancária global; entenda o que é Swift

Míssil balístico intercontinental lançado durante exercício nuclear na Rússia - Ministério da Defesa da Rússia/Handout via Reuters
Míssil balístico intercontinental lançado durante exercício nuclear na Rússia Imagem: Ministério da Defesa da Rússia/Handout via Reuters

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt*, em São Paulo

24/02/2022 14h59Atualizada em 24/02/2022 19h27

Com o início dos ataques russos na Ucrânia, países ocidentais reagiram para punir a ação liderada por Vladirmir Putin. Só que a resposta não veio na forma física, como envio de tropas para a região, mas sim com armas invisíveis: sanções políticas e econômicas que envolvem o bloqueio de um sistema que deixaria os grandes bancos da Rússia de fora do mercado global, representado pela sigla Swift.

Sem essa tecnologia, os russos ficariam impossibilitados de receber e enviar dinheiro para fora do país. Isso dificultaria muito as negociações internacionais, como o comércio de óleo, gás, metais e componentes para indústria, que acontecem em dólar. Também desencadearia a desvalorização da moeda local (o rublo russo) e causaria saídas maciças de capital.

"Não serei diplomático quanto a isso. Todos os que têm dúvidas sobre se a Rússia deve ser banida do Swift têm que entender que o sangue de homens, mulheres, crianças ucranianas inocentes estará em suas mãos também. [É preciso] proibir a Rússia no Swift", afirmou Dmytro Kuleba, ministro de Relações Exteriores da Ucrânia

Além desse tipo de sanção, os Estados Unidos, por enquanto, anunciaram penalidades simbólicas — de pouco impacto pelos críticos. Mas medidas mais severas podem ser anunciadas, pelos EUA e a União Europeia (UE), se a Rússia avançar com os ataques.

O que é o Swift?

Swift envolve um sistema digital que conecta os bancos do mundo todo uns aos outros, permitindo movimentações financeiras ágeis e seguras. A sigla significa Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication (Sociedade de Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais).

Ela foi fundada em 1973, por 239 bancos de 15 países, para melhorar a comunicação e padronizar transações internacionais, como ordens de pagamento e transferências.

Atualmente, esse acordo global conta com mais de 11.000 instituições de 200 países. Cada banco possui um código Swift, também chamado BIC (Bank International Code ou Código Internacional Bancário, em português).

É uma combinação de 8 a 11 caracteres, divididos em quatro partes, com a seguinte estrutura: AAAA BB CC DDD

  • AAAA: quatro letras que identificam a instituição bancária
  • BB: duas letras que identificam o país de origem; no caso do Brasil, é BR
  • CC: letras e/ou números que identificam a localização do banco
  • DDD: (opcional) representa a agência; bancos com apenas uma unidade ou virtuais não têm esta última parte do código

Por exemplo: o código do Banco Inter é ITEMBRSP; o do Banco do Brasil é BRASBRRJ (pode ser complementado com três dígitos relativos à agência) e sua filial em Tóquio é BRASJPJT.

Assim, qualquer instituição bancária no mundo pode ser facilmente identificada como origem ou destino de uma transação, mesmo com os diferentes idiomas.

Diante da ameaça de exclusão do sistema na Rússia, o governo de Moscou está se movimentando para criar seu próprio sistema de pagamentos internacionais.

Mapa Ucrania - Arte/ UOL - Arte/ UOL
Imagem: Arte/ UOL

Como funciona?

O Swift é basicamente uma plataforma de mensagens financeiras (da sigla FIN), que registra as transações e envia ordens de pagamento, mas não faz a custódia dos valores — elas são concretizadas diretamente entre uma instituição e outra.

As partes trocam informações em tempo real pelo sistema conectado com diversos países, com regras de segurança e criptografia (que embaralha os dados para que eles não sejam identificados facilmente), mas precisam ter um relacionamento bancário entre si para efetivar a operação.

Cada mensagem FIN é representada por um código de três dígitos:

  • o primeiro identifica a categoria a qual pertence
  • o segundo e o terceiro caracterizam o tipo de conteúdo

As transações realizadas com intermédio da plataforma estão sujeitas a uma taxa, que costuma variar entre 3% e 5%, dependendo do valor da operação.

No ano passado, o Swift registrou um recorde de 50,3 milhões de mensagens em um só dia, em 30 de novembro. A média de 2021 foi de 42 milhões de mensagens diárias — a mais alta da história.

Até aqui deu para perceber que um banco — ou, pior, um país inteiro — fora do sistema Swift se tornaria um pária no sistema financeiro global.

Algo parecido já ocorreu com o Irã, em 2012. Bancos iranianos foram retirados do sistema após uma sanção da União Europeia e dos Estados Unidos ao programa nuclear do país. Ele foi readmitido somente em 2016.

Quando os bloqueios terminaram na época, o Irã teve liberação de US$ 100 bilhões iranianos que estavam congelados em contas do exterior, o fim do embargo ao petróleo local e a eliminação da restrição bancárias e de seguros que afetavam o país.

Ameaças virtuais

O campo de batalha invisível vem se instalando há anos entre os países, tendo se intensificado nos últimos meses. Desde 2014, quando a Rússia invadiu a Ucrânia e anexou a Crimeia, os EUA têm mantido sanções contra o país.

Outras foram impostas por questões como ciberataques, interferência eleitoral, proliferação de armas e comércio ilícito com a Coreia do Norte.

Nas últimas semanas, a Ucrânia se tornou alvo de diversos ataques cibernéticos. Sites bancários e governamentais (como do Ministério da Educação e da Ciência) ficaram indisponíveis. Até mensagens com a descrição "se preparem para o pior" foram exibidas. Boa parte logo voltou ao normal — os EUA culparam a Rússia por isso.

As ameaças virtuais não são recentes. Em 2015, a Ucrânia atribuiu a hackers russos uma ação virtual que deixou 250 mil pessoas sem eletricidade no país. Uma ação semelhante envolvendo Rússia e Ucrânia aconteceu no começo de 2022.

Isso mostra que uma ação hacker bem executada pode hoje substituir um ataque físico, feito com mísseis. Ataques militares feitos em conjunto com outras técnicas, como desinformação, sabotagem ou investidas em sistemas de computadores, são conhecidos como "guerra híbrida". É uma forma de desestabilizar adversários de diferentes formas simultaneamente.

Os efeitos de uma guerra cibernética na região seriam globais. Um ataque russo à infraestrutura ou sistemas de telecomunicações ucranianos pode afetar milhares de empresas ocidentais. Uma em cada cinco empresas da Fortune 500 depende serviços de TI do país, de acordo com o Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia.

Outra arma poderosa no arsenal dos EUA são as restrições de importação, por exemplo, de peças de smartphones, aeronaves e automóveis fabricados na Rússia. Até agora, a sanção mais dura veio da Alemanha, que suspendeu a certificação do gasoduto russo Nord Stream 2, que está pronto para levar gás natural até o país, através do Mar Báltico.

Os Estados Unidos e a União Europeia têm se mostrado dispostos a atacar a economia russa, mesmo que isso signifique preços mais altos de combustíveis e componentes.

*Com informações de matéria de Guilherme Tagiaroli e agências internacionais.