Novo 'Matador de Aluguel' é bem ruim. Mas também é muito bom
Poucos filmes são tão desavergonhadamente cafonas como "Matador de Aluguel", fita de ação que Patrick Swayze encabeçou em 1989. Foi esse ar assumidamente vulgar, sem absolutamente nenhum refinamento, que fez de um produto B, destinado a mofar nas prateleiras das locadoras, um filme cult. Assumir seus defeitos, veja só, tem seus méritos.
Uma refilmagem não teria a menor chance de engrandecer o material original, e foi justamente nesse espírito que o diretor Doug Liman colocou Jake Gyllenhaal à frente da nova versão de "Matador de Aluguel", que sabiamente se esquivou de um lançamento em cinemas para aninhar-se nos corredores da vídeo locadora do século 21, a plataforma de streaming.
A diferença do chassi original para o novo modelo é o brilho na produção e um investimento mais polpudo na pirotecnia. Tirando isso, é mesmo western moderno que apresenta um anti-herói solitário, refugiado em uma cidade minúscula, que combate meia dúzia de malfeitores para salvar uma população combalida pela violência. Não existe subtexto, não existe entrelinhas: não há nada ali além do que desfila ante nossos olhos.
O verniz do novo século em "Matador de Aluguel" faz de seu protagonista, Dalton (Gyllenhaal), um ex-lutador de MMA. Caído em desgraça, ele precisa fugir de seu passado ganhando a vida em lutas clandestinas nos fundos de bares decrépitos. É assim que Dalton chama a atenção de Frankie (Jessica Williams), que busca desesperadamente um leão de chácara parrudo para defender seu bar nos rincões da Flórida.
O lugar é ímã de cliente tosco, e há de se perguntar se o esforço em manter seu estabelecimento vale a pena quando Frankie vê seu bar, a Taverna (ou "Road House"), pulverizada a cada noite. Mas lógica nunca foi o forte do cinema de ação dos anos 1980, então não há porque buscar alguma fagulha aqui. Dalton logo identifica os elementos que procuram confusão e procede com a quebradeira antes de levar a trupe ao hospital. Nosso herói tem consciência.
Claro que existe um arremedo de plot, com um empresário inescrupuloso (Billy Magnussen) querendo a todo custo se apropriar do bar - seu plano é construir uma fileira de espigões cafonas no litoral, a exemplo de algumas cidades no Sul do Brasil, para atender a demanda de outros ricos sem noção (de classe, estética) como ele.
Para completar o bingo do cinema tosco, temos também a mocinha que se mostra refém em potencial (Daniela Melchior), o chefe de polícia corrupto (Joaquim de Almeida que, juro, é chamado "Pau Grande"), a criança esperta (Hannah Lanier, que parece fazer parte da trama, mas meio que não faz) e, claro, um vilão ainda mais casca-grossa que Dalton.
E foi aí que "Matador de Aluguel" me perdeu. Porque tudo bem colocar gente de talento mimetizando o cinema podreira de eras passadas. Doug Liman, que tem "Swingers", "A Identidade Bourne" e "No Limite do Amanhã" no currículo, ao menos sabe o que está fazendo. Mas nada justifica escalar o lutador Conor McGregor como antagonista. O que era só cafona se torna uma piada.
McGregor, que coleciona dúzias e dúzias de títulos como lutador profissional, não entende o básico sobre atuação. Sua linguagem corporal é errada, sua composição de personagem é equivocada. Ele é apresentado como uma figura imponente e ameaçadora, mas o efeito é de um brutamontes de desenho animado. Em vez de aprender com Vinnie Jones, que saltou do esporte para o cinema como um sujeito perigoso de verdade em "Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes", McGregor não passa de alívio cômico.
Dependendo de sua disposição para encarar "Matador de Aluguel", esse tropeço pode até ser uma vantagem. Afinal, a caricatura também era um traço do cinemão da testosterona de quatro décadas atrás, e um personagem patético traz mais autenticidade à experiência. Some os efeitos especiais inapropriados (as cenas de luta são prejudicadas com tanto retoque digital) com um roteiro mais gritado do que interpretado e o pacote nostálgico está completo.
Há de se admirar a completa disposição dos responsáveis pelo novo "Matador de Aluguel" em abraçar a 'tosqueira'. E não tem como torcer contra Jake Gyllenhaal, que em nenhum momento empurra o personagem com a barriga, se esforçando ao máximo para ressaltar uma lasca de motivação dramática em Dalton. É cinema de sofá para curtir, esquecer e, o principal, não esquecer de rebobinar antes de devolver.
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