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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Superman sem Henry Cavill e a faxina que pretende consertar a DC no cinema

Henry Cavill em "O Homem de Aço" - Warner
Henry Cavill em 'O Homem de Aço' Imagem: Warner

Colunista do UOL

16/12/2022 06h00

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Não se constrói um universo com um remendo. Ou melhor: não se faz um omelete sem quebrar alguns ovos. Os primeiros anúncios de James Gunn e Peter Safran à frente da DC no cinema, ainda que não oficiais, mostraram que a dupla não vai deixar pedra sobre pedra para limpar o terreno.

A primeira baixa é justamente o ator que assumiu, há quase uma década, o papel do herói símbolo do estúdio. Henry Cavill não será mais o Superman no cinema, deixando um legado que nunca conseguiu ganhar tração. De "O Homem de Aço" a "Liga da Justiça", o ator representou bem o personagem fisicamente, mas nunca teve um filme que acompanhasse seu entusiasmo.

Tudo é, afinal, parte do plano. Há algumas semanas James Gunn disse no Twitter - hoje fonte de informação mais veloz do que press releases dos estúdios - que o Superman era uma das prioridades, se não a maior delas, entre os projetos da nova DC.

Por fim, o diretor/roteirista/produtor revelou que ele mesmo está trabalhando no roteiro de uma nova aventura do herói, a ser retratado como um repórter iniciante em Metrópolis, ao mesmo tempo que se revela ao mundo como o Superman. Henry Cavill, calejado com uma década usando a capa, não se encaixa no papel. Adeus, Henry!

A decisão mostra a total bagunça em que se encontra a DC após a saída do executivo Walter Hamada e as medidas para dar um norte não só ao selo de super-heróis, mas também a toda a Warner Bros. Discovery pelo presidente da empresa, David Zaslav. Afinal, não faz nem dois meses que Cavill anunciou seu retorno como o Superman, depois de uma ponta ao fim de "Adão Negro". Nem dois meses!

Essa confusão, uma fileira de decisões ruins e filmes sofríveis, é o legado de Zack Snyder para a DC. O cineasta comandou "O Homem de Aço" e ganhou as chaves do reino, desenhando "Batman vs. Superman" e "Liga da Justiça", e produzindo "Mulher-Maravilha", "Aquaman" e "Esquadrão Suicida".

Embora a ideia fosse espelhar o universo compartilhado da concorrente, a Marvel, as ideias de Snyder nunca voaram alto. Não havia uma conexão real entre os filmes, os personagens pareciam aleatórios entre cada projeto.

Sua saída de "Liga da Justiça" durante a produção provocou uma crise criativa e de liderança para os heróis da DC. Quando ele finalmente executou sua visão da equipe de heróis em um filme de 4 horas para a HBO Max, não foi um retorno celebrado, e sim uma despedida honrosa.

Sem Snyder, ou qualquer outra liderança, imperou o desleixo e os projetos que talvez, mais ou menos, um pouquinho, de certa forma, se conectavam. Vieram "Shazam!", "Aves de Rapina" e o desastroso "Mulher-Maravilha 1984". James Gunn lançou seu "O Esquadrão Suicida" em meio à pandemia e, embora superior a tudo que o precedeu, mal pagou seus custos.

A coisa parecia caminhar a uma nova direção, ainda carregando o legado de Snyder, com "Adão Negro". Dwayne Johnson se envolveu nas negociações para recuperar Henry Cavill como Superman e não se furtou em anunciar a "nova hierarquia do poder" para a DC, ele à frente. Isso foi, repito, há menos de dois meses. Absolutamente tudo mudou.

James Gunn e Peter Safran assumiram a liderança no recém-batizado DC Studios, prometendo colocar a casa em ordem. Fãs de Zack Snyder clamaram pela volta do diretor e dos astros que ele trouxera ao tabuleiro, mas isso nunca esteve na mesa. Cavill, por sua vez, removeu-se da série "The Witcher" e estaria garantido em "O Homem de Aço 2". Ben Affleck e Gal Gadot não estariam muito atrás, certo? Certo?

Bom, não se constrói um universo com um remendo. Se Gunn usasse atores, personagens, filmes ou linhas narrativas de projetos anteriores, a faxina ficaria pela metade. Radicalizar não é um capricho, e sim uma decisão criativa e corporativa lógica. O novo universo tem ênfase no "novo".

Assim, a diretora Patty Jenkins não retornará com um terceiro "Mulher-Maravilha". É incerto que Gal Gadot também retome a personagem. Sem Cavill, e com um novo "Superman" a caminho, todo o universo DC respira e pode, de fato, experimentar um plano coeso, em que diversas equipes criativas trabalhem em uníssono. Sabe, mais ou menos como a Marvel faz, e muito bem, desde 2008.

Restam, claro, os penduricalhos. A DC ainda tem três filmes na lata que trazem a herança de Zack Snyder. A lógica dita que cada um deles representa o fim da linha para todos os envolvidos. "Shazam! Fúria dos Deuses" estreia em março, seguido de "The Flash" em junho e "Aquaman e o Reino Perdido" em dezembro.

Cada um deles deve ser, digamos, desconectado do universo DC, apresentados portanto como aventuras solo que encerram o ciclo destes personagens em sua encarnação atual. Gunn pretende usar Cavill no futuro como outro personagem em outros filmes da DC (o que eu duvido que vá acontecer). O produtor tem discutido com Ben Affleck para que ele dirija um projeto do estúdio (já isso eu acho mais provável que aconteça).

Outros filmes permanecem no cronograma, ora cuidando de seu próprio cantinho (como a continuação de "Coringa"), ora como um novíssimo herói que, aposto, será encaixado na visão de Gunn (o caso de "Besouro Azul"). O universo do Batman nas mãos de Matt Reeves permanece um mistério.

James Gunn e Peter Safran prometem divulgar seu grande plano para a próxima década da DC no cinema em janeiro. Com o terreno livre, Superman à frente, será a primeira vez que os personagens terão chance concreta em bater de frente com a concorrência. Os fãs mais radicais lamentam a partida de Cavill e Gadot e clamam, em vão, pelo retorno da visão de Zack Snyder. O snyderverso acabou. Eles vão superar.