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Como restaurantes japoneses driblaram a pandemia com boas embalagens

Tradição japonesa na sacola do motoboy - Angelo Dal Bó
Tradição japonesa na sacola do motoboy
Imagem: Angelo Dal Bó

Gabriela Mendes

Colaboração para Nossa

05/09/2021 04h00

"Tsutsumu" é um termo japonês que expressa o cuidado com o embrulho. Seu ideograma simboliza a imagem de uma criança dentro do ventre da mãe, remetendo à ideia de proteger aquilo que é precioso.

No Japão, esse cuidado vai muito além dos presentes e está em todos os produtos, principalmente nos alimentos, desde a garrafa d'água ao bentô para viagem. Graças ao design inteligente, as embalagens japonesas estão entre as melhores do mundo - adequam-se à rotina corrida e mantêm a qualidade do conteúdo.

Apesar da cultura nipônica estar acostumada com o "take away", muitos restaurantes japoneses aqui no Brasil ainda não tinham incorporado essa dinâmica e o atendimento presencial era maioria no setor.

Especialidades do Aizomê, de Telma Shiraishi - Rafael Salvador/Divulgação - Rafael Salvador/Divulgação
Especialidades do Aizomê, de Telma Shiraishi
Imagem: Rafael Salvador/Divulgação

Com o boom do delivery imposto pela pandemia, porém, eles tiveram que se adequar aos novos tempos. A tarefa foi desafiadora já que os melhores endereços pensam em todos os sentidos na hora de servir uma refeição.

Tem o cuidado com a cerâmica, a montagem dos pratos, o frescor dos alimentos, a valorização dos aromas... Como até os mínimos detalhes importam, a estética é um ponto chave.

Mas como transmitir toda essa experiência pela mala do motoboy? A resposta foi resgatar o "tsutsumu" e focar nas embalagens.

Hospitalidade na caixinha

Ryo - embalagem - Angelo Dal Bó - Angelo Dal Bó
Papel e fitas japonesas
Imagem: Angelo Dal Bó
Ryo - embalagem - Angelo Dal Bó - Angelo Dal Bó
Embrulho de profissional
Imagem: Angelo Dal Bó

Celso Ishiy, sócio do Ryo Gastronomia, na Zona Sul de São Paulo, onde apenas seis clientes eram atendidos por vez, conta que testou mais de 50 deliveries diferentes na cidade para entender a melhor forma de levar o cuidado para a casa do consumidor.

Ele e a equipe botaram em prática o conceito de "omiyage", que faz referência ao hábito nipônico de entregar uma lembrancinha quando se visita a casa de alguém. Como o restaurante passaria, então, a ir até as residências das pessoas, era importante deixar clara a preocupação com o embrulho.

O chef Edson Yamashita escolheu que a fita e o papel seriam japoneses e colocou uma professora para ensinar os funcionários a fazer o embrulho como se fosse um presente".

Ryo - embalagem - Angelo Dal Bó - Angelo Dal Bó
"Tsutsumu" e "omiyage" na entrega
Imagem: Angelo Dal Bó

No Mitsubá, restaurante da Zona Sul do Rio de Janeiro, o delivery já estava sendo programado antes mesmo da pandemia. Por sorte, as embalagens estavam desenhadas na cabeça.

O sócio Breno Naar conta que escolheu, desde o início, opções biodegradáveis de bagaço de cana. "Ressaltei a importância das embalagens sustentáveis porque nossos principais insumos dependem do meio ambiente".

Para transmitir a experiência de ir ao restaurante na entrega, a brigada replicou a montagem do prato presencial e usou a identidade visual do ambiente para as embalagens. Breno afirma que, na caixinha perfeita, o sushi ganha protagonismo e mostra a sua beleza.

Também fez parte da estratégia a contratação de motoboys, treinados para chamar o cliente pelo nome.

Mitsubá - embalagens - Divulgação - Divulgação
Apresentação é replicada no dlivery do Mitsuba
Imagem: Divulgação

Versatilidade em tempos de crise

Dessa forma, alguns restaurantes conseguiram levar o "omotenashi", a arte da hospitalidade, até o cliente. A palavra japonesa é o norte de Telma Shiraishi, chef do Aizomê, que tem duas unidades em São Paulo.

Como a gente faz para o cliente perceber o nosso cuidado na casa dele? Com certeza a embalagem diz muito sobre isso".

Até chegar ao modelo atual, Telma fez vários ajustes. Em certo momento ela trabalhou, ao mesmo tempo, com 12 fornecedores de embalagens para suas diferentes preparações.

Antes de criar a sua própria equipe de delivery, ela contou com a ajuda dos próprios garçons que tinham moto.

Aizomê - embalagem - Rafael Salvador/Divulgação - Rafael Salvador/Divulgação
No início, delivery do Aizomê era feito pelos próprios garçons
Imagem: Rafael Salvador/Divulgação

"Como não podíamos fazer atendimento presencial, eles iam de bom grado fazer a entrega para os nossos clientes fiéis. Foi muito bacana porque os consumidores se sentiam como se estivessem no restaurante. Manter essa conexão foi importante".

Com o passar dos meses, Telma percebeu que o delivery era uma tendência para ficar e se jogou de cabeça no "novo normal". Isso incluiu a criação do movimento Água no Feijão, para distribuir quentinhas a pessoas em situação de vulnerabilidade, e a adaptação dos negócios.

Bentô Box: do virtual para o físico - Divulgação - Divulgação
Bentô Box: do virtual para o físico
Imagem: Divulgação

A unidade do Aizomê nos Jardins ganhou um empório com produtos e presentes japoneses. Como uma espécie de meio do caminho entre o atendimento presencial formal e o delivery, a loja oferece de ingredientes para preparar refeições em casa às cerâmicas para servir.

Outro nascimento da pandemia foi a Bentô Box, que atendia via entregas comidas rápidas e econômicas e agora também conta com uma unidade física no Parque Ibirapuera.

Para Telma, é impossível voltar para a vida de antes de março de 2020.

O normal não existe mais. Tudo mudou, o mercado mudou, os hábitos dos clientes mudaram e cabe a gente estar atento a isso".