Topo

Histórias do Mar

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Quem é o velejador de 50 anos que venceu 80 barcos na maior regata do país

Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga
Imagem: Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga

Colunista do UOL

28/09/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Competindo contra outros 80 barcos, o velejador pernambucano Hans Hutzler, de 50 anos de idade, foi o primeiro a completar o percurso da principal regata oceânica do Brasil, a Refeno, que começou no último sábado, entre Recife e a ilha de Fernando de Noronha.

Mas sua vitória teve um detalhe ainda mais relevante do que a idade avançada em relação aos adversários: ele foi o único competidor que navegou sozinho no barco.

Foi a primeira vez, em 33 anos de existência da competição, que um veleiro conduzido por um só velejador recebeu a Fita Azul, prêmio que é dado ao primeiro barco a cruzar a linha de chegada.

32 horas navegando sem descansar

Enquanto todos os demais concorrentes competiram em equipes, que chegaram a ser de dez pessoas a bordo, Hans velejou em solitário, apesar de a competição, de 300 milhas náuticas, ou cerca de 550 quilômetros de extensão, ter durado (para ele, que foi o primeiro a chegar), mais de 32 horas navegando sem parar, no mar aberto.

"Foi cansativo, mas gratificante", disse o velejador, que competiu com um catamarã, um tipo de barco bastante ágil, com dois cascos.

Velejador Hans Hutzler - Refeno - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga
Imagem: Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga

"O segredo foi ter um bom barco e usar uma estratégia diferente da dos demais competidores".

Escolheu outra rota

Velejador Hans Hutzler - Refeno - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga
Imagem: Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga

"Antes da largada, eu analisei bastante a meteorologia e tracei uma rota diferente, que me permitiria ser mais beneficiado pelos ventos. E deu certo", comemorou o pernambucano, que também atribuiu a vitória à agilidade do seu barco, o catamarã Aventureiro 4, de 15 metros de comprimento, que ele comprou no ano passado, na Europa, e trouxe navegando para o Brasil, com a família a bordo.

Só que, na prova, Hans preferiu competir sozinho, apesar do esforço constante de erguer e trocar pesadas velas, sem ter ninguém para ajudá-lo, ao longo de toda a prova.

Velejador Hans Hutzler - Refeno - Diego Albuquerque/AfterClick/Cabanga - Diego Albuquerque/AfterClick/Cabanga
Imagem: Diego Albuquerque/AfterClick/Cabanga

"Eu optei por uma rota fora do habitual, para me beneficiar de ventos mais intensos, que eu sabia que iriam soprar. Daí, na madrugada do primeiro dia, eu já estava na frente".

Velejador Hans Hutzler - Refeno - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga
Imagem: Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga

"Foi uma vitória da estratégia".

Dois sustos

Mesmo assim, Hans passou por pelo menos dois sustos durante a travessia.

O primeiro foi quando seu barco foi colhido por um "Pirajá", nuvens baixas que trazem rápidas tempestades e aceleram brutalmente os ventos, ao amanhecer do segundo dia de prova.

"Tive que ser rápido nas manobras com as velas, já que não tinha ninguém para ajudar, mas sem deixar o barco sair da rota. Por sorte, consegui".

Já o segundo susto veio quando ele já estava praticamente cruzando a linha de chegada na ilha, a menos de três milhas de distância.

"O piloto automático, que me ajudava a manter o rumo, desligou do nada e o barco deu uma ´chicotada` tão forte para o lado que arrancou uma das ferragens que sustentava a vela principal. Um dos cascos chegou a sair fora d´água. Mas fiz um quebra-galho e consegui cruzar a linha de chegada".

Seis horas à deriva no mar

Por outro lado, o primeiro contratempo que o velejador enfrentou, a rápida tormenta, acabou sendo benéfico para ele, porque o seu maior adversário na competição, o veleiro trimarã Patoruzú, tricampeão da prova, não teve a mesma sorte.

Ao enfrentar as fortes rajadas de vento trazidas pela tempestade , um dos cabos de aço que sustentam os três cascos se rompeu, deixando o barco à deriva por mais de seis horas, até que um reparo de emergência pudesse ser feito, pela própria tripulação.

Mesmo assim, apesar de não ter mais chances na prova, a equipe do Patoruzú resolveu completar a competição, navegando com extrema cautela por mais de 20 horas, a fim de cruzar a linha de chegada - feito que a equipe comemorou como se fosse uma vitória.

Velejador Hans Hutzler - Refeno - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga - Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga
Imagem: Tsuey Lan Bizzocchi/Cabanga

Atração na premiação

A festa de premiação da Refeno acontece hoje, em Fernando de Noronha, com os vitoriosos em cada categoria recebendo seus troféus (clique aqui para ver os vencedores em todas as classes).

Mas o grande vencedor será mesmo o pernambucano Hans Hutzler, o único que decidiu encarar o desafio sozinho no barco — e aos 50 anos de idade.

"Vencer essa regata desse jeito foi a melhor maneira de comemorar meu meio século de vida", disse o velejador, feliz da vida.