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Destaque no sumô japonês, brasileiro de 160 kg será homenageado em SP durante o Carnaval

Paulista Ricardo Sugano luta entre os grandes e leva marcas do Brasil ao sumô japonês - Divulgação/família Sugano
Paulista Ricardo Sugano luta entre os grandes e leva marcas do Brasil ao sumô japonês Imagem: Divulgação/família Sugano

Bruno Freitas

Do UOL, em São Paulo

13/02/2012 06h00

Ele pesa 160 kg, mede 1,94 m e receberá uma homenagem em São Paulo durante o Carnaval. Mas não se trata de um novo rei momo da estação, e sim do melhor lutador de sumô da história do Brasil. Ricardo Sugano competiu na elite da modalidade no Japão no último ano e visita o país de origem por poucos dias, para satisfação da colônia nipônica ligada ao esporte.

A homenagem a Ricardo Sugano acontecerá no dia 19 de fevereiro, em pleno domingo de Carnaval, no bairro do Bom Retiro, em um ginásio que tradicionalmente abriga eventos do sumô em São Paulo. O atleta de 25 anos será exaltado pela façanha de ser o primeiro representante brasileiro na história a figurar entre os melhores do Japão.

"Ele está há seis anos no Japão. Foi o único brasileiro que chegou à primeira divisão, o único entre os 14 que nós já mandamos para lá que conseguiu subir", diz Isao Kagohara, dirigente da Confederação Brasileira de Sumô. "Vamos fazer [a homenagem] no domingo de Carnaval mesmo, não tem outra data", acrescenta o dirigente.

Há seis anos no Japão na batalha na carreira no sumô, o paulista Ricardo conseguiu ingressar em 2011 na seletíssima categoria Makuuchi, a mais nobre das seis que compõem este esporte no Japão. Apenas cerca de 40 lutadores, ou sumotoris, disputam esta faixa principal. Eles têm suas lutas transmitidas pela TV japonesa e embolsam salários que podem chegar a US$ 28 mil mensais, tirando as premiações.

Apesar da felicidade de chegar à elite, Sugano sofreu recentemente uma lesão na coluna e teve desempenho ruim nos últimos três eventos que participou. Por isso, hoje corre o risco de cair de divisão.

"Ele está com uma contusão há algum tempo na coluna. Não tem tempo de se tratar, porque só descansa dois dias entre competições e exibições pelo interior do Japão. Quem sabe a gente consiga curar a coluna nestes dias no Brasil", afirma Itiro Sugano, pai do lutador.

Ricardo passará apenas cinco dias em solo brasileiro. O lutador chega no sábado (18.02), um dia antes da homenagem do sumô local. No país, terá a oportunidade de visitar a avó, que está hospitalizada. 

CRISTO REDENTOR COMO REFERÊNCIA NA ROUPA DE LUTA

Na companhia de Sugano na elite, para todo o fanático público japonês ver, uma identificação do lutador com o seu país de origem. Ricardo usa um kesshou mawashi, espécie de cinto para o cerimonial pré-luta, com a imagem do Cristo Redentor e com a bandeira do Brasil. No dohyo (espaço de combate), poucos sabem seu nome real, pois se apresenta com o codinome de Kaisei Ichiro.

TRADIÇÕES PRINCIPAIS

AOS INICIANTES
É preciso ter no mínimo 1,73 m, 75 kg e ensino fundamental completo
ENSINO OBRIGATÓRIO
História do sumo, filosofia esportiva, poesia e caligrafia
COMIDA DOS GIGANTES
Duas grandes refeições por dia, geralmente um cozido de carne e legumes, e média de 5 mil calorias diárias
FORMATO DE DISPUTA
Seis torneios por ano, três em Tóquio, um em Osaka, um em Fukuoka e outro em Nagoya. Cada um tem duração de 15 dias

Antes de Sugano, outros quatro brasileiros chegaram à quinta categoria na hierarquia do sumô japonês, a segunda em importância. Sendo assim, os antecessores não conseguiram o feito que Ricardo comemorou. Em seu ano de estreia na elite, o paulista igualou um recorde de 30 anos, com nove vitórias seguidas.

Atualmente cerca de 10% dos lutadores entre as seis categorias do sumô japonês são estrangeiros, mas poucos têm chamado tanta atenção quanto Ricardo. Em 2008, ainda em etapa inicial dentro da hierarquia do esporte, o brasileiro e sua batalha foram tema de um documentário da Fuji TV, uma das principais do Japão.

Sugano chegou ao Japão dois anos antes disso, com um repertório de poucas palavras conhecidas na língua japonesa, mas muita vontade de aprender. Campeão novato no Brasil, ele teve a chance de ingressar na famosa academia Tomozuna Beya, em Tóquio, na escola que propagandeia formar lutadores desde 1757.

No começo, como novato que se preza, Ricardo teve que passar por uma série de sacrifícios. Como quase tudo na cultura japonesa, o funcionamento da academia prevê devoção silenciosa aos integrantes mais velhos, em troca de recebimento de aprendizado. O brasileiro entrou na Tomozuna Beya ajudando nas tarefas de limpeza e cozinha. Na hora do almoço, precisava ficar de pé ao lado da mesa esperando os veteranos terminarem a refeição, sempre atento para repor o arroz das tigelas assim que elas se esvaziassem.

VITÓRIA DE RICARDO SUGANO EM 2007

Mas a escalada até a categoria principal conferiu ao brasileiro uma série de novos privilégios. Tradicionalmente, os integrantes da faixa de elite podem, entre outras coisas, lançar sal na arena antes dos combates e vestir quimonos mais grossos durante o frio do inverno.

Para quem vê de fora com olhares pouco respeitosos, o sumô pode ser descrito como um festival de trombadas entre dois gordões usando uma espécie de fralda. Mas existe muito mais conteúdo nesta antiga modalidade japonesa do que uma mera interpretação superficial possa imaginar.

Alega-se que o esporte tem cerca de 2 mil anos de existência e nasceu como parte dos ritos xintoístas, espiritualidade típica japonesa. A devoção do público é das mais fervorosas, com traços de religiosidade. Quem consegue a denominação de Yokozuna, campeão supremo, mais alto grau na diferenciação entre os lutadores, é tratado com status de divindade.

A plateia dos combates da categoria principal costuma ser das mais heterogêneas, mesclando vários tipos de fãs, de senhoras de quimono a membros da máfia Yakuza, que nos últimos anos tiveram descoberta estratégia de usar as posições nas primeiras filas para enviar mensagens aos comparsas através das transmissões de TV.

GLOSSÁRIO BÁSICO DO SUMÔ

Sumotori: lutador
Yokozuna: campeão supremo
Dohyo: arena de luta
Kesshou mawashi: cinto de luta para cerimônia
Shio-barai: arremesso de sal na arena
Rei: cumprimento formal entre os adversários
Kimaritê: golpe decisivo