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Lito Cavalcanti

Fórmula 1: Em dois dias, a volta ao paraíso

Carlos Sainz na chegada à pista de Melbourne em março; piloto vai correr pela Ferrari em 2021 - William West/AFP
Carlos Sainz na chegada à pista de Melbourne em março; piloto vai correr pela Ferrari em 2021 Imagem: William West/AFP

18/05/2020 11h50

Bastaram dois dias para que a Fórmula 1 retomasse sua posição costumeira no noticiário. A saída de Sebastian Vettel da Ferrari, que anunciou para seu lugar o espanhol Carlos Sainz, deu início a um efeito dominó que pode redundar em uma aposentadoria precoce por parte do tetracampeão mundial e o retorno de Fernando Alonso à categoria.

Tudo começou na segunda-feira da semana passada, quando veio a público a saída do tetracampeão. O relacionamento de Vettel com a equipe começou a se deteriorar no ano passado, com a ascensão do recém-chegado Charles Leclerc, e culminou com o acidente em Interlagos, que causou o abandono dos dois carros. Ao retornar aos boxes, o alemão não encontrou o apoio que esperava. Aquela já não era mais a sua equipe.

Pelo que consta, a decisão de cortar os laços veio de Maranello. A negociação com o jovem espanhol para substitui-lo foi iniciada ainda em dezembro do ano passado. Sem carro para 2021, Vettel resolveu não esperar por um comunicado da Ferrari e tomou a iniciativa, revelando o que se passava para a imprensa alemã.

Essa atitude mostra sua determinação de agir por conta própria e intensifica a tensão entre piloto e equipe. Como seu contrato só se encerra no fim deste ano, não é exagero afirmar que Vettel tem como objetivo superar Leclerc durante o que resta deste campeonato - que se revela mais plausível a cada dia.

No radar, uma luta entre Vettel e Leclerc

Sem outra perspectiva que não seja provar seu valor como piloto, o alemão não tem outra saída que não seja desmentir os que já não veem nele um piloto digno de seu passado. E se em 2019 ele já não aceitava ordens da equipe para beneficiar Leclerc, seria ingenuidade acreditar que ele venha a fazê-lo agora.

O que se terá pela frente, caso a Fórmula 1 de fato retome suas atividades neste ano, é uma luta encarniçada entre os pilotos da Scuderia Rossa. De um lado, Vettel determinado a provar que a Ferrari fez a escolha errada; do outro, Leclerc decidido a mostrar que é ele a única esperança de Maranello voltar a fazer um campeão mundial, título que a equipe alcançou pela última vez em 2007, com Kimi Räikkönen.

Para Vettel, a única possibilidade de voltar a vencer e sonhar com o quinto título seria uma vaga na Mercedes. Não se pode dizer que seja impossível. Toto Wolff, o chefe da equipe, não se furtou às especulações. Afirmou que seria um ótimo golpe de marketing ter um piloto alemão em uma equipe alemã.

Recriada em 2010 com Michael Schumacher e Nico Rosberg, a Mercedes não tem um piloto desta nacionalidade desde 2016, com a inesperada aposentadoria de Rosberg. Este seria um argumento forte para evitar a temida saída da montadora alemã da Fórmula 1, vista como inevitável diante dos gastos elevadíssimos que a mudança para os carros elétricos impõe a todo o setor automotivo.

Apesar do comentário de Toto Wolff, a contratação de Vettel é encarada com ceticismo. Por mais que isso seja possível, dado o término dos contratos do hexacampeão Lewis Hamilton e de seu fiel escudeiro Valtteri Bottas, no fim deste ano, os dois pilotos mantêm ótimo convívio - qualidade sempre valorizada por Wolff. E a disposição de Vettel de provar que seus quatro títulos não foram frutos do acaso poderia minar o ambiente interno da Mercedes.

Talvez por isso o alemão não tenha sido considerado pela McLaren, que o deixou de lado e preferiu contratar Daniel Ricciardo para substituir Carlos Sainz. O bem humorado australiano e o jovem e promissor Lando Norris devem formar a dupla mais simpática da Fórmula 1 em 2021 - mas, até lá, o que Ricciardo tem pela frente é um resto de ano de chuvas e trovoadas na Renaut.

Sua contratação, em 2019, foi anunciada como a manobra que levaria a equipe francesa de volta às vitórias e títulos do tempo em que contava com Fernando Alonso. Mas o carro nunca deu permitiu ao australiano lutar sequer por um pódio. O melhor resultado nas 21 etapas do ano passado foi o quarto lugar em Monza.

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Abiteboul, o colecionador de erros

Sua saída não foi bem digerida pelo chefe da escuderia, Cyril Abiteboul. O comunicado em que a Renault divulgou o fim do relacionamento não teve uma única palavra positiva em relação a Ricciardo, como dita a praxe. Limitou-se a dizer que as negociações para renovar o contrato não
tiveram sucesso. E acrescentou que confiança mútua e união são valores muito apreciados pela Renault nesse momento.

A resposta do meio da Fórmula 1 foi fulminante. Lembrou-se que, em quatro anos, a escuderia francesa demitiu Kevin Magnussen, Jolyon Palmer, Carlos Sainz e Nico Hulkenberg sem o menor constrangimento. E que a cultura de procurar culpados, imposta por Abiteboul, vai na contramão de outras equipes, em que erros são vistos como lições na direção do sucesso.

Por isso, a permanência de Ricciardo na Renault pode não durar até o fim do ano, como prevê o contrato. Começam a surgir apostas em sua substituição imediata por Fernando Alonso, um dos nomes a quem Abiteboul precisará recorrer para salvar sua imagem - o outro seria Sebastian Vettel, mas ele não parece inclinado a aceitar nenhuma oferta que não seja a da Mercedes.

A chegada de Alonso está longe de qualquer confirmação oficial, mas se onde há fumaça há fogo, nesse caso se pode dizer que há um incêndio. O que era apenas especulação começou a ganhar contornos de realidade quando o bicampeão espanhol postou nas redes sociais uma foto de seu tempo na Renault, por onde foi campeão em 2005 e 2006.

Em resposta, a equipe postou uma foto da mesma época em que se vê Alonso no pódio. Complementando a troca de afagos, o eterno empresário do espanhol, o italiano Flavio Briatore, declarou em entrevista ao jornal italiano La Gazzetta dello Sport que seu piloto está pronto para voltar à Fórmula 1.

Seria a chegada de mais um campeão mundial ao grid, uma dádiva dos céus para a F1. A contratação de Sainz pela Ferrari já causou um aumento dos direitos de transmissão das corridas na TV espanhola de 65 milhões de euros (cerca de R$ 405 milhões) para 100 milhões (quase R$ 625 milhões). Com a presença de Alonso, independente da competitividade do carro que teria em mãos, esse fenômeno se repetiria mundo afora. Mais ainda se Vettel permanecesse - eles se uniriam a Hamilton e Räikkönen, elevando para quatro o número de campeões mundiais.

Por isso, não falta quem diga que a Liberty Media, a promotora da Fórmula 1 e, também, detentora dos direitos comerciais, esteja por trás da volta de Alonso. E ainda estaria trabalhando na permanência de Vettel. Onde? Bem, a única chance parece ser na Mercedes.

Seria a transformação desse 2020 negativo em uma temporada de ouro em 2021. Sem dúvida, um golpe de mestre.

Nesta segunda-feira, eu e Cassio Politi vamos entrevistar Roberto Pupo Moreno em uma live no YouTube. Para acompanhar, acesse este link.