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Tales Torraga

REPORTAGEM

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Sem time, sem goleiro e sem reservas: as razões da façanha do River Plate

Técnico do River Plate, Marcelo Gallardo abraça o "goleiro" Enzo Pérez - Reprodução River Plate
Técnico do River Plate, Marcelo Gallardo abraça o "goleiro" Enzo Pérez Imagem: Reprodução River Plate

Colunista do UOL

20/05/2021 08h26Atualizada em 21/05/2021 10h21

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Uma façanha. É este o tom da cobertura das TVs, rádios, jornais e portais da Argentina na vitória de ontem (19) do River Plate sobre o Independiente Santa Fe no Monumental de Núñez. A partida terminou 2 a 1 mesmo com a inusitada situação de o clube portenho improvisar o volante Enzo Pérez no gol - e ainda sem contar com reservas, pois o River sofreu 20 contágios de covid e não teve ok da Conmebol para mexer nos inscritos (incluindo goleiros de ofício).

A coluna repassa as explicações da vitória de ontem no Monumental:

Fraqueza do adversário

Por algo o Independiente Santa Fe era o lanterninha da chave - aos 6 minutos do primeiro tempo já estava 2 a 0 para o River, que teve chance até de ampliar logo neste comecinho. Mesmo no encontro anterior entre os clubes, em Assunção (Colômbia vetada por distúrbios), a partida terminou 1 a 1 com o River atuando com um time reserva. E um número chamava atenção antes da partida: o time colombiano havia chutado apenas três vezes ao gol durante os 90 minutos da partida realizada na condição de mandante. "Não é o Santos de Pelé nem o Barcelona de Messi", se animava antes do jogo o folclórico locutor Atilio Costa Febre, otimista com uma vitória do clube argentino.

O técnico do Independiente Santa Fe pediu demissão na manhã desta quinta.

Bom físico

Embora dizimado pela covid e contando com uma formação que jamais havia treinado junta, o River é o time de maior deslocamento por minuto na Copa da Liga Argentina. Ou seja: o físico estava devidamente apto para levar a partida até o fim mesmo sem suplentes. E o River de fato jogou com a habitual raça dos times do país em competições internacionais.

"É uma partida de muita perna e ainda mais coração", analisava Sebá Domínguez na ESPN, fazendo alusão à frase que ficou famosa no Brasil com Hernán Crespo no São Paulo.

O River vinha ainda A) desgastado do superclássico de domingo com o Boca Juniors (1 a 1) e B) da caótica viagem da semana passada à Colômbia, onde penou com gás lacrimogêneo, bombas e tiros no também 1 a 1 com o Junior Barranquilla.

Time concentrado e bem treinado

Desde o improvisado Enzo Pérez, no gol, a Fontana, o último atacante, o River deu uma prova de seriedade e serenidade. Não catimbou, não deu pontapés, tentou fazer o melhor possível com o que tinha. E era, de fato, uma formação suficiente para "segurar as pontas" com veteranos de tamanha personalidade como o zagueiro Maidana e o lateral Casco. E sem falar no convencimento de Marcelo Gallardo, um técnico que hoje praticamente finaliza qualquer discussão sobre quem é o melhor treinador da história do clube.

O time foi a campo em um 3-5-2 que buscou o gol logo no começo, o que surpreendeu o time colombiano. A escalação da noite histórica: Pérez; Lecanda, Maidana e Martínez; Casco, Carrascal, Biafore, Paradela e Angileri; Álvarez e Fontana.

"Um time que ataca com 11 e 'ataja' [defende, em espanhol] com 11", definiu o narrador Mariano Closs, o "Galvão Bueno" da Argentina.

Boa resposta dos juvenis

O River precisou levar a campo dois estreantes que jamais haviam sequer concentrado com os profissionais: o zagueiro Lecanda (19 anos) e o volante Peña Biafore (18). Nenhum dos dois destoou. O River se gaba de ter uma das melhores categorias de base de todo o mundo. Partidas inusitadas como a de ontem dão bom respaldo.

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Capa do jornal argentino "Olé" nesta quinta (20)
Imagem: Reprodução

Um tango em Núñez

Nada comove mais os combativos argentinos do que uma história de superação - vide os tangos, "uma forma de viver e morrer". O nível de comoção foi tocante. Para a torcida do River, era algo comparável à repercussão da morte de Maradona, tamanha a estridência com as novidades da covid, da Conmebol e do clube. Esse caldeirão de emoções gerou uma catarse coletiva. Era o prato cheio para fazer da partida de ontem algo para a história - é este o sabor portenho do momento no meio de tanto mate e tanta empanada.

"Imenso" Pérez

Se alguém poderia vestir tranquilo a improvisada camisa de goleiro seria mesmo o volante de 35 anos e 1,78 metro. Experiente, discreto e extremamente esforçado, jogou da maneira concentrada e simples de sempre. Seu uniforme e suas luvas de ontem já foram para o museu do clube, bem ao lado do Monumental. Imenso. Ou "Inmenzo", trocadilho repetido em duas de cada três postagens dos torcedores.