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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Para aqueles e aquelas que não têm pai

Campo do Santa Marina AC, clube tradicional da várzea paulistana que luta contra o despejo - Arthur Sandes/UOL
Campo do Santa Marina AC, clube tradicional da várzea paulistana que luta contra o despejo Imagem: Arthur Sandes/UOL

Colunista do UOL

14/08/2022 17h32

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Datas comemorativas são sempre tinhosas. Se por um lado elas convidam a gente a festejar encontros e amores, por outro escancaram a dor daqueles que não têm o que celebrar.

Dia dos pais é uma das datas mais sensíveis porque há milhões de famílias sem pais presentes nesse Brasil.

Pais que morreram, pais que foram assassinados por balas da polícia ou da milícia, pais pretos que estão presos sem julgamento, pais que nunca assumiram, pais que se mandaram, pais que não fazem nada a não ser se comportar como filhos, pais violentos, pais intolerantes.

Mas há aquelas pessoas, como eu, que tiveram a sorte de ter um pai presente, carinhoso, delicado e amigo. Meu pai me deu os olhos, o amor pelo futebol, pelos livros, pela escrita e pelo jornalismo.

Foi um homem do seu tempo, que não participava do cuidado com a casa, no máximo lavava uma louça, mas que me fazia companhia, me levava ao estádio, me falava de filmes e de livros, me ensinava a sofrer e a viver.

Meu pai foi embora aos 72 anos me deixando as melhores lembranças.

Ele morreu há duas décadas e, desde então, o dia dos pais virou uma data vazia para mim.

Mas talvez não devesse ser assim.

Talvez esse dia pudesse nos ajudar a reavaliar o que é a paternidade.

Renomear a data para "Dia dos Pais Presentes e Participativos", falar a respeito da importância de ter em nossas vidas tutores que nos ofereçam amor, dedicação, respeito, participação, carinho, colo, ombro, acolhimento, entendimento a despeito do gênero.

Por isso, para todos aqueles e aquelas que perderam o pai por causa da violência, um abraço solidário.

Para quem perdeu o pai por covid no país em que o presidente fez de tudo para propagar o vírus, um cafuné.

Para os pais trans, um dengo.

Para as famílias de dupla-maternidade, meu mais sincero orgulho.

Para mães solo, minha admiração.

Para mães que precisam cuidar dos filhos sozinhas mesmo com um parceiro vivo, saudável e que atua como pai apenas no Instagram, de quinze em quinze dias ou nem isso, toda a minha solidariedade.

Para pais que perderam seus filhos, uma inversão de ordem que não faz sentido e jamais deveria acontecer, meu carinho e acolhimento.

Para quem, como eu, já não tem mais pai, o desejo de que as memórias sejam as mais ternas possíveis e de que um dia possamos revê-los.