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Jordan acumulou críticas por fuga de discurso politizado e foco no mercado

Jeff Reinking/NBAE via Getty Images
Imagem: Jeff Reinking/NBAE via Getty Images

Do UOL, em São Paulo

07/05/2020 04h00

Quando chegou ao topo da NBA, Michael Jordan passou a enfrentar outro tipo de adversidade, fora de quadra: a pressão por seu posicionamento, seja político ou social. Ou pela falta dele, na verdade. O quinto episódio da série "Arremesso Final", da Netflix, mostra como uma disputa eleitoral na Carolina do Norte, onde o astro do Chicago Bulls cresceu, o colocou em xeque diante da opinião pública.

Jordan foi cobrado por uma manifestação favorável a Harvey Gantt, que tentava ser o primeiro senador negro da Carolina do Norte. O adversário dele na ocasião era Jesse Helms, um político conservador do Partido Republicano, que se colocava favorável à segregação nas escolas e contrário à criação do feriado em homenagem a Martin Luther King Jr, pastor e ativista pelos direitos humanos que foi assassinado em 1968. O lendário camisa 23 se manteve isento na oportunidade.

Não apenas Jordan se calou diante do clamor como criou polêmica com uma declaração que mostrava sua preocupação com sua emergente imagem no mundo dos negócios norte-americanos — e, em breve, globais: "Republicanos também compram tênis". Era uma alusão ao modelo Air Jordan, da Nike, um sucesso de vendas naquela época. No documentário, Jordan diz que a frase teria sido uma piada em conversa com Horace Grant e Scottie Pippen, companheiros dele nos Bulls.

"Minha mãe pediu que eu apoiasse Harvey Gantt. E eu disse: 'Mãe, não vou defender alguém que eu não conheço, mas contribuirei com a campanha dele'. Coisa que eu fiz", se defendeu o ex-jogador e hoje proprietário do Charlotte Hornets, no documentário.

Na época, Jordan também estrelava a campanha "Be Like Mike" (seja como Mike), da Gatorade. O comercial, também bastante popular, trabalhava em cima da reputação do astro, como um modelo a ser seguido pela juventude. Foi questão de tempo para que Jordan encarasse outros tipos de demanda.

"Nunca vai ser o bastante para todos — sei disso, percebo isso, pois todos têm uma ideia preconcebida em termos do que acham que devo ou não fazer. Vivo minha vida dando exemplos. Se isso te inspira, ótimo. Continuarei assim. Se não te inspirar, talvez eu não seja o ídolo que você deveria estar seguindo", prosseguiu Jordan.

Durante a carreira, Jordan sempre preferiu uma postura mais discreta e sem envolvimento direto com qualquer tipo de ativismo. "Não era político, mas jogava meu esporte. Estava focado no meu ofício. Foi egoísta? Provavelmente. Mas essa era a minha energia, era daí que ela vinha", explica.

Jordan começou a falar mais abertamente sobre problemas sociais somente depois que se aposentou do basquete. Em 2016, quando as tensões entre policiais e a população negra dos Estados Unidos aumentava e o movimento "Black Lives Matter" (Vidas Negras Importam) ganhava força, Jordan disse que não poderia mais ficar em silêncio.

"Sei que esse país é melhor do que isso, não posso mais ficar em silêncio. Temos que achar soluções para que as pessoas de cor recebam tratamento justo. Decidi falar na esperança de que, como americanos, possamos mudar por meio do diálogo pacífico e da educação", escreveu em carta publicada pelo site "The Undefeated", em julho daquele ano.

LeBron James segue caminho contrário ao do ídolo

LeBron James, durante comício de Hillary Clinton, em 2016 - Justin Sullivan/Getty Images - Justin Sullivan/Getty Images
LeBron James, durante comício de Hillary Clinton, em 2016
Imagem: Justin Sullivan/Getty Images

LeBron James é declaradamente um fã de Michael Jordan. O número 23 que carrega em sua camisa é uma referência ao astro do Chicago Bulls. Mas o ala dos Los Angeles Lakers optou por seguir uma postura diferente à do ídolo quando o assunto é ativismo e questões sociais.

James expõe constantemente suas opiniões e chegou até a entrar em atrito com Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, quando afirmou que não visitaria a Casa Branca caso vencesse as finais da NBA. Em resposta, Trump decidiu não convidar nem o Cleveland Cavaliers, de LeBron, nem o Golden State Warriors, que disputavam o título da NBA em 2018.

Naquele momento, Donald Trump se mostrava incomodado com as sucessivas manifestações de jogadores da NBA e da NFL, a liga de futebol americano, contra a violência policial à população negra no país. O movimento ficou marcado na imagem de Colin Kaepernick, quarterback do San Francisco 49ers, que desde 2016 não atuou por mais nenhum time da NFL.

Dois anos antes, LeBron usou o microfone da ESPYS, premiação esportiva promovida pela ESPN, para incentivar os atletas a protestarem contra a violência aos negros. "Hoje homenageamos Muhammad Ali. Mas para fazer justiça ao seu legado, temos que usar esse momento como um chamado para a ação, para que os atletas profissionais se eduquem, explorem os problemas, falem, usem a influência para renunciar à violência e, mais importante ainda, voltar às comunidades, investir tempo, recursos, ajudar a construí-las, fortalecê-las. Todos nós temos que agir melhor".

Os problemas com Donald Trump já eram claros na época da corrida presidencial de 2016. LeBron James não só manifestou seu apoio a Hillary Clinton, candidata do Partido Democrata, como esteve presente em um comício dela no estado de Ohio.

"Quando olho para a corrida presidencial este ano, está claro qual o candidato que acredita nas mesmas coisas. Apenas uma pessoa entende os problemas de uma criança pobre nascida em Akron. E quando penso nas ideias para as crianças da minha fundação, o que elas precisam do governo, a escolha é clara. Essa candidata é Hillary Clinton", disse LeBron em cima do palanque.

Ao mesmo tempo em que se posiciona sempre que acha necessário, LeBron causou polêmica no final do ano passado por criticar a opinião de Daryl Morey, gerente geral do Houston Rockets. Na época, o dirigente se posicionou no Twitter favorável a manifestantes de Hong Kong que buscam independência da China. "Acho que ele não se educou sobre a situação antes de falar", disse LeBron.

A postura de LeBron foi vista como incoerente. Ao mesmo tempo em que lutava pelo direito dos atletas de se posicionarem em temas fora do esporte, o ala se mostrava contrário ao fato de Morey se manifestar. O caso gerou uma explicação no Twitter.

"Deixe-me esclarecer a confusão. Eu não acredito que houve qualquer consideração pelas consequências e ramificações do tuíte. Eu não estou discutindo a substância [dele]. Outras pessoas podem fazer isso", escreveu.

"Meu time, e a liga como um todo, acabaram de passar por uma semana difícil. Eu acho que as pessoas precisam entender o que um tuíte, ou uma declaração, pode fazer com outras pessoas. E eu acredito que ninguém parou e pensou sobre o que podia acontecer. [Ele] poderia ter esperado uma semana para tuitar", completou.