Acordos da COP28 devem impulsionar produção de energia renovável no Brasil
A COP28 fortaleceu em seus acordos a transição do uso de combustíveis fósseis (gasolina, diesel e outros derivados do petróleo) para as matrizes renováveis, o que pode impulsionar a economia brasileira. Especialistas apontam que os estados do Nordeste, Sudeste e do Sul são os que mais podem ganhar com isso.
Assinado pelos 198 países, o documento final da conferência, o Global Stocktake (GST), ou balanço geral, prevê triplicar as energias renováveis e aumentar a eficiência energética, ainda que não exista uma obrigação ou detalhamento. Além disso, durante a conferência, 130 governos, entre países e a União Européia, assinaram o Global Renewables and Efficiency Pledge, um compromisso para energias renováveis e eficiência energética. China e Índia ficaram de fora desse acordo.
Os governos signatários se comprometeram a trabalhar em conjunto para triplicar a capacidade mundial instalada de geração de energia renovável para pelo menos 11.000 GW até 2030. Além disso, o documento prevê duplicar a taxa média anual global de melhorias na eficiência energética de cerca de 2% para mais de 4% todos os anos até 2030.
O investimento necessário para implementar o acordo é de quase 30 trilhões de dólares, segundo a International Renewable Energy Agency (Irena). O objetivo é evitar que temperatura média do planeta aumente mais que 2°C, ainda buscando a meta de essa elevação não ultrapassar 1,5°C. Antes e durante a COP 28, o governo brasileiro, por meio do embaixador e negociador chefe, André Corrêa do Lago, afirmou que seria o "paladino do 1,5°C". Para triplicar suas matrizes renováveis, o país não deve ter muitos desafios.
"Se o Brasil continuar mantendo o ritmo, não mudando as condições de contratação de energia eólica e solar, eu acredito que dá para alcançar esse número, ou seja, não tem que fazer nenhuma transformação radical", explicou Ricardo Baitelo, doutor em planejamento energético e gerente de projetos do Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente). Ele complementa que o desafio maior está em aumentar a eficiência energética, algo que recebe menor atenção e investimentos do governo.
O acordo de triplicar energias renováveis reconhece, entre outros pontos, que no período pós-2030 irá existir um portfólio cada vez mais diversificado de tecnologias disponíveis em escala para descarbonizar o setor energético. Com isso, há uma grande oportunidade de investimentos para o Brasil.
O documento aponta que, para este processo acontecer, existem processos fundamentais como:
Acelerar o licenciamento de projetos e infraestruturas relacionadas à produção de energias renováveis;
Desenvolver e expandir as ligações à rede e melhorar a integração do sistema energético;
Incentivar investimentos privados e públicos;
Melhorar e dimensionar novas soluções tecnológicas, por meio do apoio à pesquisa e desenvolvimento.
Em setembro, o Governo Federal revisou a sua NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) e se comprometeu a reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 48% até 2025 e em 53% até 2030, retomando a ambição apresentada em 2015, no Acordo de Paris.
Para o Brasil chegar à meta de zero emissões, serão necessários cerca de R$ 40 bilhões até 2050. Os dados são de um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgado durante a COP28, o levantamento "Oportunidades e riscos da descarbonização da indústria brasileira - roteiro para uma estratégia nacional".
Com as condições adequadas, a indústria brasileira pode se tornar um ator significativo na economia global de baixo carbono. Para tanto, são necessárias condições econômicas e políticas claras e estáveis para que possamos atrair investimentos e impulsionar inovação em tecnologias Ricardo Alban, presidente da CNI
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Quero receberMeta deveria ser maior
Apesar de o acordo de triplicar fontes de energia renovável parecer um grande avanço, Juliano Bueno de Araújo, diretor técnico do Instituto Arayara, pondera que essa meta global, na verdade, precisaria ser ainda maior.
"O número adequado teria que ser de oito vezes, não de três vezes. Obviamente, esse número impressiona, mas não tem muitos compromissos novos, basicamente é um somatório daquilo que já estava sendo feito, por uma série de países, com algumas condicionantes novas", avaliou o especialista, que indica caminhos para alguns estados:
Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro: podem investir com menor impacto na produção de energia eólica.
Paraná tem uma grande oportunidade com o biometano
Minas Gerais tem grande potencial para investir em fazendas de energia solar.
Estados do Nordeste têm muita vantagem na produção de energia eólica, desde que conciliem com baixo impacto socioambiental, o que não vem acontecendo nos últimos 20 anos, segundo Araújo.
A CNI aponta que uma possibilidade para a produção de energia eólica é a chamada offshore —em alto mar. A previsão é que aconteça um crescimento mundial de instalações de 13,9% até 2030. No Brasil, os estados com mais potencial são Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Rio Grande do Sul.
A modalidade integra a estratégia da CNI para uma economia de baixo carbono e é uma das prioridades do Plano de Retomada da Indústria, apresentado ao governo federal neste ano. Na área do hidrogênio verde, outra matriz renovável em ascensão, Rio de Janeiro e Ceará são pioneiros. Mas o avanço real de multiplicar por três ou por oito as matrizes de energias renováveis só vai ocorrer com o fim dos combustíveis fósseis, segundo Araújo.
Incoerência brasileira com 'Leilão do fim do mundo'
Apesar de fazer parte do acordo de triplicar renováveis e do seu grande potencial, o Brasil insiste em ir na contramão da descarbonização. No mesmo dia em que a COP28 se encerrou, 13 de dezembro, aconteceu, segundo organizações do terceiro setor, o pior leilão já realizado na área, apelidado de "Leilão do fim do mundo".
Foi realizada a Oferta Permanente de Concessão, um grande leilão de 602 blocos para exploração de petróleo e gás, realizado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Um total de 193 blocos foram arrematados, sendo 32% do total. Com este leilão, o governo arrecadou R$ 421,7 milhões. Em seguida, aconteceu a Oferta Permanente de Partilha, o leilão do pré-sal, onde foram arrematadas cinco áreas, com arrecadação de R$ 7 milhões.
Com os blocos arrematados, segundo o Instituto Arayara, quatro terras indígenas estão ameaçadas, sendo três no Amazonas e uma em Santa Catarina. Além disso, há blocos com sobreposições a raios de restrição às Terra Indígena, assentamentos, sítios arqueológicos, Unidades de Conservação, Zonas de Amortecimento e Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade.
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