Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
O ESG vai acelerar a equidade racial nas empresas brasileiras?
É óbvio e ululante. Apostar na diversidade e inclusão traz benefícios tangíveis para qualquer mercado. Porém, estamos vivendo tempos em que o óbvio nunca precisou tanto ser dito e redito, às vezes, por muitas vozes. E, agora, a luta antirracista no mundo corporativo parece ter ganhado um aliado estratégico: a pauta ESG.
A sigla vem do inglês Environmental, Social and Governance (Ambiental, Social e Governança) como um guarda-chuva de ações combinadas que tem como princípio reduzir ou eliminar o risco que um negócio tem perante toda a sua cadeia de valor. Pautas como a redução da emissão de carbono, gestão de resíduos, eficiência energética, práticas de gestão corporativa, ética e transparência e rotinas de auditoria fiscal são observadas através de indicadores claros. Questões como o respeito das empresas por seus clientes, colaboradores e fornecedores também são considerados, bem como as políticas das relações de trabalho, relacionamento com comunidades e treinamento da força de trabalho.
Sendo assim, uma pauta ESG no contexto Brasil que ignora as desigualdades sociais que atingem majoritariamente a população negra e indígena também não é capaz de compreender que os impactos socioambientais que uma empresa eventualmente pode gerar afetam mais as comunidades vulnerabilizadas do país. Além disso, a baixa representatividade preta em cargos de liderança torna a inovação e a conquista de novos nichos de mercado mais desafiadoras. É por isso que o ESG se abre como um possível catalisador da equidade racial no mundo corporativo.
Contudo, é importante observar que o local de fala da pauta ESG é essencialmente o mercado financeiro. Este mesmo mercado é dominado por homens brancos e poderosos do hemisfério norte do globo terrestre. É possível personificar este aceno em Larry Fink, CEO da BlackRock — a maior gestão de ativos financeiros do mundo.
Em carta aberta aos CEOs do mundo todo, Fink alerta que, para garantir a longevidade e redução de riscos para os negócios e para o planeta, as empresas devem aprimorar a gestão de temas fundamentais para a criação de valor de forma duradoura. A gestão de capital, as estratégias de longo prazo, o propósito e mudanças climáticas são os tópicos evidenciados dentro desta publicação. Fink não disse nada novo, apenas trouxe o óbvio sob uma nova perspectiva e não devemos ignorar isto.
Há décadas, profissionais do campo do investimento social privado, da diversidade, equidade, inclusão e da sustentabilidade das empresas têm buscado cada vez mais caminhos para avançar no impacto que se propõem a gerar aos seus empregadores. Por vezes, estes caminhos são traçados de baixo para cima, ou seja, sem um direcional claro da alta liderança nesta agenda, estes executivos a duras penas tentam recursos para emplacar projetos de impacto socioambiental positivo. O ESG é importante pois a pressão não está mais unidirecional: os investidores têm começado a cobrar CEOs das empresas e os mais sagazes começaram desde o último ano a "correr atrás deste prejuízo".
Como um profissional que lidera um dos mais longevos investidores sociais privados do Brasil, uma das primeiras ações que tive foi buscar diversificar o perfil de organizações parceiras até a composição do nosso Conselho de Administração também sob a ótica da equidade racial. Contei com a experiência de mais de 20 anos de empreendedorismo social da Adriana Barbosa nesta jornada e com o apoio e inspiração da Fernanda Ribeiro da Afrobusiness, mulheres negras com notável trabalho na agenda antirracista no mercado. Sem muitas referências no campo, vi em Mafoane Odara, que a época fazia parte do Instituto Avon e hoje é Líder de Recursos Humanos na Meta Facebook, a figura de uma profissional negra para se espelhar e deixar legado dentro da estrutura que eu estava fazendo parte.
Essas figuras que antecedem a pauta ESG no mercado compõem a base de referências do que será possível fazer no futuro a partir desta perspectiva. E o melhor caminho para se aproveitar essa possibilidade é abrir escuta e se aliar a quem já tem construído este impacto positivo, e buscar letramento sobre sustentabilidade e equidade racial para que não se escorregue em equívocos.
O ESG é um argumento para equidade racial, mas a equidade racial não pode ser um argumento para o ESG. Cumprir essa agenda de forma deslegitimada é um risco que nenhum negócio pode mais correr num Brasil de maioria negra, que tem cada vez mais reivindicado seu espaço.
O Festival Feira Preta, aliás, convidou uma série de especialistas e de organizações negras, do terceiro setor a grandes empresas, para mesas que olham para a equidade racial. Eu também estarei por lá, vale conferir.
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