Opinião

IA proporciona independência a pessoas cegas ou com baixa visão

Em um mundo cada vez mais dinâmico, a IA (inteligência artificial) é uma grande aliada na inclusão das pessoas com deficiência visual, pois de fato nos permite ocupar diferentes espaços na sociedade. A deficiência visual acomete mais de 6,5 milhões de pessoas no Brasil, segundo o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e abrange tanto a perda total como a redução da capacidade de visão em ambos os olhos. No mundo, este número sobe para mais de 1 bilhão, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).

Para alguém cego, como eu, configurar o ar-condicionado em uma temperatura exata ou programar seu desligamento não é uma tarefa simples, pois falta acessibilidade na maioria dos controles remotos desses equipamentos.

Com o auxílio da IA, em tecnologias como Alexa ou Google Home, basta um comando de voz, tal como, "desligar o ar-condicionado em 30 minutos" e a mágica está feita. Ou melhor, a ciência e a inovação passam a trabalhar para nossa inclusão.

Perguntar quais são as principais notícias do dia, saber como está o tempo, como se soletra uma palavra, programar a agenda de compromissos, enviar uma mensagem de áudio ou de texto, também passam ao alcance das mãos, ou melhor, da voz.

Imagine o quanto é importante destrancar uma fechadura, abrir ou fechar uma cortina e fazer uma chamada com um simples comando e sem ter que sair do lugar para as pessoas idosas com deficiência física ou com mobilidade reduzida?

Neste cenário, destaco os avanços da inteligência artificial com soluções inovadoras - e gratuitas - que melhoram a nossa qualidade de vida e nos dão autonomia e independência para executar atividades do cotidiano. No mercado, há alternativas que reconhecem texto, cores, pessoas, objetos, produtos, fazem leituras do código de barras, descrevem ambientes e fotos, detectam presença de luz e muito mais.

Com um aplicativo nativo do aparelho celular, que é capaz de ler com sonoridade o que digitamos, conseguimos enviar mensagens, fazer chamadas e acessar informações online.

O uso de apps de navegação baseados em IA, que oferecem uma orientação detalhada dos espaços urbanos, auxilia para uma jornada mais segura.

Entre os leitores de telas para computadores destaco o NVDA (Non Visual Desktop Access) e, para os celulares, o TalkBack, do Android, e o VoiceOver, do iPhone (iOS), todos gratuitos.

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Outro app muito utilizado é o Be My Eyes (Seja Meus Olhos), desenvolvido pelo dinamarquês Hans Jorgen Wiberg, que funciona como um sistema de câmera direta e conecta pessoas com deficiência visual com voluntários cadastrados de todo o mundo, que, por sua vez, descrevem ambientes, objetos e outros. Mais recentemente, esse aplicativo também passou a oferecer a possibilidade de utilização de inteligência artificial para tais funções.

A inteligência artificial também pode ser uma grande aliada da música. Em comemoração ao Dia Internacional do Braille, comemorado em 4 de janeiro, compus uma canção. Com a ferramenta, a letra ganhou ritmo e melodia.

Cada vez mais presente em nosso cotidiano, a utilização ou não da IA na educação tem sido alvo de calorosos debates. É importante compreender que embora esses recursos podem ser utilizados como aliados em alguns momentos, jamais devem substituir os materiais em braille e ampliados, ou retirar a responsabilidade das escolas e educadores em proporcionar inclusão e acessibilidade, sobretudo, no desenvolvimento infantil.

Outra revolução é o robô desenvolvido por pesquisadoras da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, que lê o braille duas vezes mais rápido do que o ser humano e com uma precisão de 90%. Por meio de câmeras e sensores instalados na ponta dos dedos é possível ler até 315 palavras por minuto.

A integração crescente da inteligência artificial na vida das pessoas com deficiência visual representa um marco significativo na busca pela inclusão e autonomia. À medida que a tecnologia evolui, as expectativas para os próximos anos são otimistas, vislumbrando avanços ainda mais notáveis, como novas aplicações da IA que proporcionarão experiências mais personalizadas e adaptáveis, atendendo de maneira ainda mais precisa às necessidades de cada indivíduo.

Por isso, entendo que a inteligência artificial vai continuar sendo uma grande aliada quando falamos em inclusão e acessibilidade. Por outro lado, não basta uma sociedade contar com a melhor tecnologia se as pessoas não estiverem envolvidas nesse processo de construção de um mundo mais acessível, inclusivo e equitativo.

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*Beto Pereira, especialista e assessor de Acessibilidade e Inclusão da LARAMARA (São Paulo - SP) e presidente da Organização Nacional de Cegos do Brasil

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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