Como motoristas de app que expulsam passageiros têm virado casos de Justiça

Ultimamente, têm sido registrados diversos casos de expulsão de passageiros ou cancelamento de viagens por motoristas de aplicativo.Tanto passageiros, quanto motoristas, chegam a buscar a Justiça. Ainda que, em geral, o fato final seja sempre o cancelamento da corrida, os motivos e os desdobramentos disso costumam variar.

Na terça-feira passada (19), o juiz Felippe Rosa Pereira, da 6ª Vara Cível de Piracicaba, condenou uma mulher a indenizar em R$ 10 mil um motorista da Uber e apagar publicações caluniosas em sua rede social, onde ela alegou que ele teria abandonado uma outra mulher e seu filho. No caso, foram obrigadas a irem ao hospital à própria sorte, depois de a criança ter vomitado no carro.

Diante da situação, o motorista interrompeu a viagem e recomendou que a família pedisse outro veículo - o magistrado entendeu que não houve prova de que os passageiros foram abandonados no caminho e que, na época dos fatos, vivíamos fase aguda da pandemia, com risco sanitário inerente que deveria ser resolvido com urgência. Assim, a condenação se deu pela incompatibilidade das postagens com a realidade dos fatos.

Em outro caso, desta vez julgado no dia 8 de março pela juíza Renata Longo Vilalba Serrano Nunes, do Juizado Especial Cível de Santo Amaro (SP), a Uber foi condenada a pagar R$ 2 mil de indenização por danos morais a um passageiro que, segundo alegou, teve a corrida cancelada pelo motorista quando o viu na rua com sua cadeira de rodas.

No caso, a empresa não apresentou no processo qualquer justificativa para o cancelamento da corrida, deixando de juntar, aos autos, cópias do procedimento de apuração junto ao motorista acerca da conduta discriminatória relatada pelo consumidor.

Além disso, a Uber não alegou e tampouco comprovou qualquer justificativa do motorista quanto à impossibilidade de realizar a corrida - que poderia ser, por exemplo, ausência de espaço interno para transportar a cadeira de rodas em caso de carro adaptado (gás).

Motoristas criticam as plataformas

Acontecem essas expulsões pois o próprio passageiro cria a situação. São eles que colocam a corrida à mercê dessa situação. O sentimento que as plataformas passam para os motoristas é o de que só importa que ele acabe a corrida e dê cinco estrelas para o passageiro, independentemente de como a pessoa a ser transportada está se portando. Nenhum motorista sai para trabalhar querendo expulsar as pessoas do seu carro. Não vou dizer que todos os motoristas são santos, mas a maior parte deles toma essa medida por estado de necessidade quando a situação fugiu totalmente do controle" Eduardo Lima, presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo de São Paulo (Amasp).

Eduardo usa a Uber de exemplo para ilustrar a diferença de comunicação entre a sua relação com o motorista, ante com o passageiro. "A Uber, por exemplo, lança campanhas para respeitar LGBTQIA+. Todos os meses recebemos esse tipo de informativo. Mas em nenhum momento o passageiro recebe um informativo para respeitar o motorista, o veículo ou o ambiente interno do carro. O passageiro acaba ficando livre para fazer o que bem entender", afirma.

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Banimento é imediato, sem justificativas claras e objetivas

"As empresas excluem o motorista automaticamente, que fica sem saber do motivo para a sua exclusão. Em cidades como São Paulo, Campinas e Atibaia, existem leis municipais que dão direito de defesa para o motorista. Em caso de exclusão, a empresa tem que abrir um link para esse motorista e informar o motivo. Assim, o motorista pode montar a sua defesa e a análise durará sete dias ao todo", explica o especialista.

"O problema é que a situação que levou à exclusão nunca é tão explícita e específica. Então o motorista fica tendo que quebrar a cabeça para lembrar do ocorrido. Teve um caso no qual o motorista, já próximo do limite de expediente regulamentado pela plataforma, estava indo fazer a sua última corrida. Ele estava com a ferramenta de encaminhamento para a sua residência ativa. Ou seja, não poderiam cair corridas com trajeto divergente do endereço de sua casa", afirma.

"Mas chegando no local, o GPS indicou que os passageiros iriam para um local do outro lado da cidade. O motorista explicou que estava destinado para a sua casa e que por isso não iria fazer a corrida. Os passageiros saíram sem prejuízos e, pela plataforma, o acusaram de discriminação. Essa foi a reclamação que havia chegado para o motorista", conta.

"Ele foi expulso e teve que ficar tentando decifrar o ocorrido, que não estava claro. Ele tinha mais de 7 anos de profissão e sem nenhuma outra reclamação desse tipo. Pelo seu histórico, conseguimos reverter esse desligamento", diz.

Perrengues da profissão

"Uma vez, uma mulher chamou uma corrida para um amigo embriagado, que estava vomitando na rua. Apenas ele iria embarcar, daí cancelei a corrida e fui embora. Houve mais uma comigo, após receber um grupo de três amigos. Um deles, totalmente embriagado, vomitou. Isso desencadeou um vômito coletivo de todas as pessoas dentro do carro. Eu também tive que expulsar eles do meu carro, pois tudo ali havia ficado realmente podre. Tive que levar o carro para um posto de gasolina e tentar amenizar a situação", exemplifica.

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"Soube de um caso onde o motorista teve de expulsar um casal de passageiros que começaram a fazer sexo dentro do carro em movimento. Na ocasião, expulsou e cancelou. Olha só até que ponto a situação pode chegar. Em outro, o motorista não deixou o passageiro embarcar com um bezerro dentro do carro. Em quaisquer ocasiões desse tipo, acabamos mesmo sendo obrigados a impedir a entrada do passageiro", afirma.

Dificuldades de ressarcimento

"No carnaval peguei passageiros cobertos de uma pasta dourada. Eles entraram dentro do carro, não falei nada e fiz a minha corrida. Quando olhei para trás, vi que o estofamento estava impregnado por aquela substância. Isso impossibilitou as minhas próximas corridas, pois se entrasse outro passageiro, iria sair dourado do meu carro. Isso iria acabar sobrando para mim depois", pensou.

"Eu tive que pegar um pano para esfregar, e com ou sem água, não saiu. Parei no supermercado, comprei produto próprio, também não saiu. Fiquei quatro dias tentando sem sucesso. Até acetona, cândida, álcool, diabo verde tentei usar, mas não funcionou".

"Eu não mandei para a Uber pagar na tentativa de agir rápido e não perder tempo de trabalho, mas no fim não deu certo. Por conta de detalhes (de validação de notas fiscais é um exemplo recorrente), muitas vezes a Uber acaba se recusando a pagar a limpeza para o carro do motorista", reclama Eduardo.

O que diz a Uber sobre o assunto

Sobre um ocorrido registrado pelo passageiro onde foi expulso por suas opiniões políticas, a Uber afirmou, em nota, que espera que motoristas e usuários não se envolvam em discussões e orientou que eles contatem imediatamente às autoridades policiais em casos de ameaça. A empresa informou, ainda, que está às ordens das autoridades

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Os motoristas parceiros da Uber são independentes. No entanto, negar-se a atender uma pessoa em razão de seu credo, raça, nacionalidade, religião, necessidade especial, orientação sexual, identidade de gênero, estado civil, idade ou inclinação política configura violação dos termos de uso e ao código da comunidade, o que não é tolerado na parceria" Uber, em nota.

A Uber costuma comentar apenas sobre casos específicos, sempre com fornecimento de dados para comprovar que, de fato, o incidente ocorreu em corridas pela plataforma. Por isso, quando há falta de informações sobre os veículos ou os indivíduos envolvidos, comunica em linhas gerais.

Em casos de danos e sujeira no veículo, a plataforma disponibiliza informações em seu site para orientar o motorista. No caso, tudo gira em torno da chamada 'taxa de limpeza', aplicável a situações onde se torna impossível prosseguir com o atendimento das viagens seguintes. O valor é cobrado do usuário nos seguintes níveis:

Pequenos danos no interior ou exterior do veículo (derramamento de bebida ou comida, sujeira, etc.): a taxa é de até R$ 50

Danos moderados à parte interna ou externa do veículo (derramamentos de bebidas ou alimentos no veículo, etc.): a taxa é de até R$ 80

Danos de moderados a graves no veículo (derramamentos maiores de bebidas ou alimentos sobre tecido ou outras superfícies de difícil limpeza): a taxa é de até R$ 200

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Danos graves envolvendo fluidos corporais no interior do veículo: a taxa é de até R$ 350

Como solicitar a limpeza

Vá no menu do aplicativo (Três tracinhos horizontais no canto superior esquerdo)

Selecione "Ajuda"

Escolha "Dúvidas sobre usuário e o estabelecimento"

Vá em "Problemas com um usuário"

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Selecione "Um usuário sujou meu veículo"

Então escolha a viagem onde a sujeira foi causada e clique em "AVANÇAR"

Deve-se enviar fotos da sujeira em si e uma foto da nota fiscal do serviço de limpeza, contendo seu nome, placa e modelo do carro, CNPJ da empresa que fez a limpeza, data e descrição do serviço

A limpeza deve ser feita em até 5 dias após o incidente e é preciso descrever exatamente em qual viagem ele ocorreu para poder cobrar o reembolso do usuário certo

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