Governo e montadoras estudam incentivo menor e prazo maior para "Rota 2030"
"O céu está ficando azul", disse o presidente Michel Temer, mas discussão persiste; Montadoras lutam por anúncio até maio
Há grandes chances de que o anúncio do programa "Rota 2030", que condensa novas regras para o setor automotivo brasileiro, seja feito de fato no começo do mês de maio. Para isso, as fabricantes terão de abrir mão de algumas premissas no "braço de ferro" com o governo. Segundo Antonio Megale, presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) e diretor de assuntos governamentais da Volkswagen, afirmou nesta terça-feira, "a expectativa é que avanços sejam feitos ainda esta semana", mas o incentivo do governo pode ficar abaixo do R$ 1,5 bilhão.
"O valor de incentivo é difícil precisar, pode ser reavaliado para baixo", afirmou Megale.
Essas declarações foram feitas pelo executivo após reunião nesta tarde envolvendo o presidente da República, Michel Temer, os ministros da Fazenda, Eduardo Guardia, do MDIC (Indústria, Comércio Exterior e Serviços), Marcos Jorge, da Casa Civil, Eliseu Padilha, do Secretário da Receita, Jorge Rachid, da Anfavea, da Abeifa (associação das marcas importadoras sem fábrica no país), Fenabrave (associação dos lojistas) e do Sindipeças (que reúne os fornecedores nacionais).
Ponto que ainda precisa ser discutido a fundo nos próximos dias e que pode reduzir os valores de incentivos de R$ 1,5 bilhão -- valor já revelado pelo governo em encontros anteriores: a contrapartida em investimento das fabricantes para pesquisa e desenvolvimento locais, que alegam prejuízos como justificativa para colocar menos dinheiro do próprio bolso no avanço em segurança dos carros, redução do consumo e uso de motorizações mais avançadas, ainda que baseadas em soluções locais, como etanol e biodiesel.
Fonte ligada ao assunto afirmou a UOL Carros que novas conversas entre governo e representantes da indústria serão realizadas até quinta-feira. Por enquanto, o clima entre as montadoras está mais otimista do que antes. Todas as partes envolvidas esperam fechar os detalhes finais até o final desta semana, preparando, assim, o anúncio do Rota 2030 para a semana que vem.
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"Lei do Bem" ajuda ou atrapalha?
Segundo Megale, a chamada "Lei do Bem" deve ser usada para definir o incentivo do governo às fabricantes locais, mas há alguns pontos a serem discutidos para que haja "convergência" entre montadoras, Fazenda e MDIC. "Precisamos estudar a aplicabilidade dentro do setor automotivo, para verificar se está tudo de acordo".
Para o setor, o prazo precisa ficar próximo aos cinco anos, tido como ideal por fabricantes e que faz parte dos ciclos de investimentos propostos em reuniões prévias.
"A ideia é que o programa, que é muito importante para o país, traz a previsibilidade para o setor automotivo, que tem ciclos de investimento a longo prazo, então o programa traz essa visão de 15 anos, dividido em ciclos de cinco anos. Ele traz obrigações para a indústria avançar nas questões de eficiência energética, de equipamentos de segurança e etiquetagem e, ponto central da discussão, de investimento em P&D", resumiu Megale.
Outro ponto é o uso fatores como Imposto de Renda e lucro presumido como forma de viabilizar o incentivo, vistos como temerários pelas empresas. "A aplicação de mecanismos como a 'Lei do Bem' para os próximos ciclos será estudada, uma vez que a lei presume que as empresas estejam fazendo lucro e pagando Imposto de Renda. Como boa parte das empresas ainda está com prejuízo acumulado dos últimos anos, o mecanismo fica prejudicado", afirmou Megale.
Usar a "Lei do Bem" neste cenário pode significar, na prática, ter menos do que o R$ 1,5 bilhão apontado pelo governo, uma vez que empresas descapitalizadas podem ter menos dinheiro para investir em P&D, inviabilizando o gatilho. De acordo com o secretário de Desenvolvimento e Competitividade Industrial do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), Igor Calvet, "para um incentivo de R$ 1,5 bilhão, o programa exige um investimento de R$ 5 bilhões em pesquisa e investimento. É uma conta superavitária".
De um lado, os técnicos da Fazenda ponderaram que essa parte do programa era similar à do "Inovar-Auto", condenado anteriormente pela OMC (Organização Mundial de Comércio). Do outro, os executivos afirmam que as empresas já se comprometem com o investimento em pesquisa e tecnologia ao ingressarem no "Rota 2030", reduzindo o caixa em momento de crise. Além disso, os créditos só virão ao longo do tempo à medida que tiverem lucro.
Essa teoria de investimento menor é confirmada por Megale. "O valor de incentivo é difícil precisar, porque precisamos ter o formato final definido. Pode ser reavaliado, sim, já que há uma expectativa de dispêndio que as empresas façam em P&D, mas dependendo da ordem esse dispêndio pode ser reavaliado para baixo".
"O céu está ficando azul"
Apesar desses pontos de impasse, que deverão ser amplamente discutidos ao longo da semana, Megale preferiu se portar de modo otimista.
"Como o próprio presidente da República disse, 'O céu está ficando azul', então nos temos considerações de que a curto prazo o programa seja implementado, ainda no mês de maio".
"Estamos na fase final de ajustes, a serem feitos ainda durante semana e expectativa de que programa seja anunciado muito em breve. Os Ministérios estão conversando e o setor privado naturalmente vai fazer suas considerações sobre isso", concluiu.
Fato é que o "Rota 2030" vem causando divergências entre Fazenda, Indústria e Comércio e fabricantes desde o ano passado. O programa estava previsto para entrar em vigor no segundo semestre de 2017 para substituir o "Inovar Auto", mas tem sido adiado por sucessivas vezes. Só neste mês de abril, é a segunda vez que o governo segura o anúncio: uma outra reunião já havia sido marcada (e cancelada) no dia 12 de abril. E na última segunda-feira (23) havia assegurado o anúncio do Rota 2030 em tempo hábil ainda este mês.
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