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Paula Gama

REPORTAGEM

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Empresa descumpre lei ao aceitar Elize Matsunaga como motorista de app

Divulgação/Netflix
Imagem: Divulgação/Netflix

Colunista do UOL

03/03/2023 04h00

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Elize Matsunaga voltou a ser notícia na última semana após vazar a informação de que tem trabalhado como motorista de aplicativo na cidade de Franca (SP). O novo emprego após cumprir pena pelo assassinato de seu marido, o empresário Marcos Matsunaga, porém, esbarra na legislação brasileira que proíbe as empresas de contratarem pessoas com antecedentes criminais para cumprirem tal função ao volante.

A Lei Nº 13.640, de 26 de março de 2018, que regulamenta o transporte remunerado privado individual de passageiros, determina que somente será autorizada a contratação, por parte das plataformas, de motoristas que cumprirem algumas condições, entre elas, apresentação certidão negativa de antecedentes criminais - sendo responsabilidade de municípios e Distrito Federal regulamentar e fiscalizar o serviço.

Ao UOL, a Maxim, plataforma de transporte a qual Elize presta serviço, confirmou que não exige antecedentes criminais para o cadastro, como fazem outros apps. São checados apenas a CNH (Carteira Nacional de Habilitação), o documento do veículo e o estado do carro.

Além disso, a Maxim afirma que o fato de Elize estar em livramento condicional ou eventual cumprimento de pena em regime aberto "não deve ser um impeditivo de que a mesma possa trabalhar", porque o direito ao trabalho está previsto na Constituição Federal e a empresa "acredita na ressocialização do indivíduo".

Ao G1, a empresa afirmou em nota que "não há lei municipal regulamentando o serviço de transporte por aplicativo, de modo a exigir que os motoristas apresentem periodicamente certidão de antecedentes criminais". Além disso, citou a Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que afirma que "compete exclusivamente aos Municípios e ao Distrito Federal regulamentar e fiscalizar o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros".

A coluna entrou em contato com a empresa para falar sobre o assunto, mas não teve retorno até o fechamento desta reportagem.

Exigência de antecedentes criminais depende da profissão

O Ministério Público de São Paulo afirmou que o "sistema de execuções penais tem como uma de suas principais características a progressividade dos regimes de cumprimento da pena" e que, por isso, "incentiva o trabalho dos sentenciados". Para o órgão, desde que respeitadas as condições impostas a cada caso, e atuando em atividades lícitas, o trabalho "pode evitar a reincidência criminal e proporcionar a sua harmônica reintegração social".

Caio Augusto Silva dos Santos, advogado, mestre em direito constitucional e presidente da OAB-SP entre os anos de 2019 a 2021, explica que entre a legislação municipal e a federal, a federal prevalece, principalmente porque, constitucionalmente, são as Leis federais que regulamentam profissões. Além disso, esclarece que a exigência de certidão negativa de antecedentes criminais é algo que varia de acordo com a ocupação.

"Quando se fala sobre a exigência de certidão negativa de antecedentes criminais na contratação de um trabalhador, há sempre uma discussão sobre a possibilidade de atrapalhar a ressocialização. É um assunto subjetivo, pois é preciso entender se há razoabilidade nesse pedido. Em atividades ligadas à limpeza, por exemplo, não há pertinência. Mas em funções ligadas à segurança, faz sentido pedir", exemplifica.

O que dizem as plataformas

A Uber se posicionou por meio da Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que esclareceu que a segurança é uma prioridade das empresas associadas, que adotam medidas para assegurá-la tanto aos usuários quanto aos motoristas parceiros, por meio do desenvolvimento de ferramentas tecnológicas.

"Os motoristas que se cadastram nas plataformas das empresas associadas passam pelos processos de verificação previstos na legislação brasileira, como checagem de antecedentes criminais e verificação para a análise de CPF, CNH e licenciamento do veículo (CRLV)", afirmou.

A 99 explicou que, para se tornar um motorista parceiro, é preciso ter mais de 19 anos de idade e ser portador de carteira de habilitação (CNH) definitiva.

"A 99 analisa o histórico público dos motoristas a partir de documentos como CPF, CNH e CRLV. A empresa consulta antecedentes criminais em mais de 40 fontes públicas, como o Banco Nacional de Mandado de Prisão, a Receita Federal e os Tribunais de Justiça. A 99 também possui uma parceria com o Denatran, que permite acessar informações sobre o veículo e o condutor - por exemplo, se há ocorrências ou sinistros relacionados ao carro".

Os requisitos para ser um motorista inDrive são CNH com EAR (Exerce atividade Remunerada), CRLV e certidão negativa de antecedentes criminais. O carro precisa ter quatro portas (5p no CRLV, que considera o porta-malas), ar condicionado e estar em perfeitas condições.

Opinião da coluna

A profissão de motorista de aplicativo se tornou uma saída para muitos brasileiros desempregados. Sem processo de seleção, muitas vagas e pré-requisitos relativamente fáceis de cumprir, é uma das primeiras opções para quem quer se recolocar no mercado de trabalho e, certamente, foi esse o pensamento de Elize.

Infelizmente, apesar de ter boa pontuação no aplicativo e nenhuma reclamação de cliente, a Lei deve valer para todos, e entrar em um veículo cujo motorista já cometeu um crime é realmente temeroso. Basta pensar em um mulher sozinha com um motorista que cumpriu pena por estupro para entender a gravidade da situação.

Ex-detentos devem se ressocializar e, para isso, é importante que exista um plano robusto e inclusivo do governo, para incentivar empresas a disponibilizarem cargos adequados para esse grupo. Com bons resultados, as possibilidades também podem se expandir.

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