O que acontece no seu corpo quando você consome muito açúcar

No corredor do supermercado, duas mulheres escolhem produtos nas prateleiras. Uma delas identifica rapidamente o novo modelo de rotulagem frontal que apresenta uma lupa com a inscrição "ALTO EM AÇÚCAR ADICIONADO".

Ao ler em voz alta a advertência, ela é surpreendida pela fala da senhora ao lado: "Só assim para eu deixar de ignorar a quantidade de alimentos doces que eu consumo!".

A informação nutricional cumpriu seu objetivo: tirar as pessoas do automático e ajudá-las a fazer melhores escolhas. Afinal, o açúcar é um tipo de carboidrato e, portanto, trata-se de uma importante fonte de energia.

Apesar disso, por não possuir outros benefícios nutricionais como fibras, vitaminas e minerais (calorias vazias), ele não é essencial.

Quanto menos, melhor

Alinhado às recomendações da OMS, o Ministério da Saúde tem orientado que a ingestão de açúcar deve corresponder a 10% do total das calorias (kcal) consumidas a cada dia.

No Brasil, 85,4% das pessoas adicionam açúcar a alimentos e bebidas. Os dados são da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) 2017-2018.

O consumo desse item pelos brasileiros é 50% maior do que o recomendado pela OMS. Isso equivale a 18 colheres (chá), por dia. Desse total, 64% é adicionado. O restante vem de alimentos processados ou ultraprocessados.

Nos Estados Unidos, cerca de 50% do açúcar adicionado provêm de bebidas como refrigerantes, sucos ou outras bebidas adocicadas; são ingeridas 270 kcal a partir desse tipo de carboidrato ao dia. Isso equivale a 17 colheres (chá) de açúcar.

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O açúcar tem 5 a 10 vezes mais calorias por grama do que a maioria das frutas.

O que você ganha quando exagera

A sugestão dos especialistas é que indivíduos saudáveis não precisam cortar esse tipo de carboidratado da dieta. A ressalva é dar preferência aos naturalmente disponíveis nas frutas e vegetais (frutose), itens lácteos (lactose), além de cereais como cevada e trigo (maltose).

Caso seu cardápio diário inclua produtos ultraprocessados, bebidas adocicadas como refrigerantes e sucos, chocolate, bolos industrializados, biscoitos, etc., e você ainda não dispensa aquela colher extra de açúcar no cafezinho, consequências negativas para a saúde poderão ser observadas. Confira as mais estudadas pelos cientistas:

  • Ganho de peso
  • Piora da saúde bucal
  • Aumento do risco para doenças cardiovasculares
  • Aparecimento de enfermidades metabólicas

Você já não controla os ponteiros da balança

Os carboidratos são fontes de energia que devem compor uma dieta balanceada, fator que ajuda a manter o peso sob controle.

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Contudo, o excesso de açúcar (100 g/dia), especialmente o derivado de bebidas açucaradas, aumenta a adiposidade (gordura), enquanto sua remoção da dieta a reduz. Dados publicados pelo periódico American Journal of Clinical Nutrition.

Dar preferência a esse tipo de nutriente reduz as oportunidades de ingestão de outros itens mais nutritivos e menos calóricos, ou seja, quanto maior for o consumo de açúcar, maior é o risco de sobrepeso e obesidade.

Você percebe que a saúde bucal só piora

Os especialistas em saúde bucal afirmam que a doença cárie é multifatorial. Isso significa que o seu aparecimento não está relacionado exclusivamente ao consumo de açúcar.

No entanto, entre pessoas predispostas, o excesso de itens açucarados na dieta pode agravar o quadro ou potencializar o seu aparecimento.

Mais açúcar pode ter como consequência a perda dentária, que se relaciona a mais dor, ansiedade, limitações funcionais, econômicas e sociais.

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Esse risco é ainda maior entre crianças. Os dados são da OMS.

Você compromete sua longevidade

Como a maioria das pessoas ingere mais açúcar do que o recomendado, já está estabelecido entre os cientistas que esse excesso se relaciona ao aparecimento de doenças cardiovasculares, principal causa de morte no mundo. São exemplos o AVC (acidente vascular cerebral), doenças coronarianas e renais.

Exagerar no consumo, especialmente de bebidas açucaradas, aumenta o risco para a obesidade. Daí se observa um efeito cascata: aumento das taxas de colesterol, triglicérides (dislipidemia), assim como da pressão arterial e o diabetes.

Todo açúcar em excesso provoca uma inflamação vascular, o que leva a alterações nos vasos, facilitando o aparecimento de placas de gordura (aterosclerose) que podem romper levando a quadros como trombose, prejudicando todo sistema vascular.

O conjunto desses fatores pode ter como resultado complicações como doenças cardiovasculares, assim como óbitos a elas relacionados. As informações foram publicadas pelo The Journal of the American Medical Association.

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Você facilita a chegada do diabetes e suas complicações

Embora não se possa atribuir a um único nutriente a responsabilidade total pelas doenças metabólicas, é certo que o açúcar se relaciona a alterações no metabolismo.

Diabetes tipo 2, hipertensão e dislipidemia (colesterol e/ou triglicerídeos altos) são as principais doenças metabólicas.

Ao se exceder no consumo desse nutriente, você colabora para processos inflamatórios causados pela concentração de gordura no corpo e em órgãos como o fígado e músculos.

Sem o controle do peso, das taxas de colesterol e triglicerídeos, o organismo fica mais suscetível a enfermidades como o infarto e o AVC.

Como o corpo estoca açúcar

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Imagem: Getty Images/iStockphoto

O nosso corpo utiliza a energia que vem dos alimentos por meio da glicose que é usada para manter o equilíbrio orgânico. A glicose ingerida é utilizada como combustível e uma parte é estocada como glicogênio - um tipo de açúcar modificado que fica no fígado e é gasto rapidamente.

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Quando o volume consumido é alto e não é gasto, ele se acumula na forma de gordura. Para dar conta do volume extra, novas células de gorduras são criadas e o peso na balança sobe.

Apesar disso, pode acontecer de o tecido de gordura não dar conta do excesso e ela avança para outros órgãos que não têm gordura na sua composição (fígado, músculo pâncreas, etc.).

É aí que a inflamação se instala, levando à resistência à insulina, depois ao diabetes e doenças do fígado, por exemplo, o que pode ser acelerado pela falta de atividade física.

Os vários tipos de açúcar

Esses carboidratos são classificados como simples: monossacarídeos (glicose, frutose, galactose), dissacarídeos (sacarose, lactose, maltose); e complexos: oligossacarídeos (rafinose e estaquiose), polissacarídeos (amido, glicogênio, pectinas, celuloses e gomas), incluídas as fibras.

Açúcar total - é a soma de todos os açúcares da dieta: os das frutas, vegetais e do leite e seus derivados, bem como o adicionado a bebidas e alimentos.

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Açúcar livre - são os monossacarídeos e dissacarídeos.

Adicionado - é o agregado durante o processamento de alimentos e não inclui os naturais contidos nas frutas ou no leite. O objetivo é melhorar o sabor, textura, volume, cor, fermentação e até conservação.

Simples e complexo

Importante saber que carboidratos simples e complexos, ao serem digeridos e absorvidos, são aproveitados pelas células principalmente na forma de glicose, essencial para as funções cerebrais. Isso significa que não é uma boa ideia retirar completamente esse nutriente da dieta.

As calorias diárias devem ser compostas predominantemente por carboidratos complexos —45% a 60% (fibras). Por isso, os carboidratos simples devem corresponder apenas ao máximo de 10% das calorias totais de cada dia.

Mas açúcar não é tudo a mesma coisa?

Não. O açúcar contido no alimento in natura vem combinado com outros nutrientes, e essa combinação faz que nosso corpo absorva e otimize o açúcar de uma maneira adequada —o nosso corpo é preparado para utilizá-lo.

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Leite (lactose), frutas e vegetais (frutose), além de cevada e trigo (maltose) são exemplos de fontes naturais.

Açúcar puro adicionado não oferece a perfeita combinação de substâncias que o corpo precisa. Muitas vezes, ele ainda é combinado a substâncias químicas como as encontradas em bebidas gaseificadas.

Quanto mais se consome açúcar, maior é a vontade de consumi-lo. A razão para isso é que nosso cérebro entende isso como algo prazeroso, daí a necessidade de constância do consumo.

Outros nomes do açúcar adicionado

Tire proveito da nova rotulagem dos produtos industrialziados que você compra. Agora ela deve dar destaque aos ingredientes que poderiam prejudicar a sua dieta. No caso do açúcar, ele pode ser apresentado com outros nomes. Saiba reconhecê-los:

  • Açúcar invertido
  • Frutose
  • Xarope de milho ou malte
  • Dextrose
  • Glucose
  • Lactose
  • Maltose
  • Maltodextrina
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Aprenda a fazer as contas

Quando a OMS sugere limitar em um máximo diário de 10% de calorias provenientes do açúcar adicionado, pode ser difícil calcular o quanto isso representa. Para você ter uma ideia, em uma dieta de 2.000 kcal diárias, isso equivale a 200 kcal. Observe:

  • 1 colher (sopa) de catchup possui 12 kcal de açúcar adicionado
  • 1 copo de cereal saborizado, 48 kcal
  • 1 pote de iogurte saborizado, 78 kcal
  • 1 barra de chocolate 74 kcal
  • 1 garrafa de bebidas esportivas, 122 kcal
  • 1 lata de refrigerante, 126 kcal
  • 1 fatia de bolo de chocolate, 196 kcal

Dicas para consumir açúcar na medida certa

É preciso muita maturidade para não exagerar no consumo desse nutriente. Mas conte com a ajuda das seguinte dicas:

Escolha alimentos naturais, evite os ultraprocessados e não os ofereça a criança com idade inferior a 2 anos

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Reduza a adição de açúcar em bebidas como café, sucos, chás

Coma mais frutas como sobremesa, e menos doces e bolos

Prefira cereais como aveia para comer com sua fruta preferida, em vez dos cereais adocicados

Beba mais água. Para dar um up nela, saborize com frutas. E, claro, reduza o quanto possível o refrigerante e as bebidas adocicadas

Habitue-se a ler as informações contidas nas embalagens dos produtos industrializados. Elas ajudam a fazer escolhas mais conscientes

Dê preferênca para iogurtes naturais, sem açúcar, e adicione a fruta de sua preferência para saborizar

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Tempere saladas e alimentos com ervas, sal, vinagre , pimenta, cebolas, etc., e restrinja o uso de temperos artificiais

Consulte o Guia Alimentar Para a População Brasileira para tirar dúvidas e fazer melhores escolhas alimentares no dia a dia

Fontes: Marly Augusto Cardoso, professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP; Newton Nunes de Lima Filho, cardiologista e chefe do Setor de Cuidados Especializados do HU-UFPI (Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Sylka Rodovalho, endocrinologista com doutorado e pós-doutorado pela Unicamp, membro da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - regional São Paulo) e integrante do Departamento de Cirurgia Bariátrica da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica). É presidente da regional São Paulo da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes). Revisão médica: Sylka Rodovalho.

Referências:

  • Ministério da Saúde (Guia alimentar para a população brasileira)
  • OMS (Organização Mundial da Saúde)
  • Dietery Guidelines for Americans (2015-2020)
  • Huang Y, Chen Z, Chen B, Li J, Yuan X, Li J, Wang W, Dai T, Chen H, Wang Y, Wang R, Wang P, Guo J, Dong Q, Liu C, Wei Q, Cao D, Liu L. Dietary sugar consumption and health: umbrella review. BMJ. 2023 Apr 5;381:e071609. doi: 10.1136/bmj-2022-071609. PMID: 37019448; PMCID: PMC10074550. Disponível em https://www.bmj.com/content/381/bmj-2022-071609.

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