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Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


É normal criança ter inveja e ataque de raiva, como irmãs que viraram meme?

Maria Eduarda, 3, e Maria Antônia, 6, brigaram durante festinha de aniversário - Reprodução
Maria Eduarda, 3, e Maria Antônia, 6, brigaram durante festinha de aniversário Imagem: Reprodução

Bruna Alves

Do VivaBem, em São Paulo

21/10/2020 18h18

Crianças são imprevisíveis e, dependendo da idade, não medem as consequências de seus atos. Nesta semana, o vídeo de duas irmãs brigando em uma festinha de aniversário viralizou e transformou Maria Eduarda, 3, e Maria Antônia, 6, em celebridades na internet.

Na filmagem, a menina mais nova aparece superempolgada na hora de cantar parabéns, mas, ao apagar a velinha, a irmã, que estava ao seu lado e com cara de poucos amigos, assoprou primeiro. Visivelmente nervosa, a aniversariante não pensou duas vezes e começou a puxar o cabelo e a bater na irmã mais velha.

A briga logo foi apartada, a família acendeu novamente a velinha e a caçula pôde assoprar, dessa vez, sem ninguém para atrapalhar o seu momento. Mas até que ponto esses ataques de fúria e sentimentos de inveja são normais entre as crianças?

Confusão de sentimentos

No caso das irmãs, tudo foi absolutamente natural, segundo Victor Bigelli de Carvalho, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo). "Tudo que aconteceu ali é normal, inclusive o fato de a menina ter apagado a velinha primeiro, um comportamento que acontece na vida: vem alguém e tira algo de você por 'n' motivos, às vezes só porque tirou uma nota menor que você".

Quando as crianças veem alguém possuir algo que elas ainda não têm, é comum quererem aquilo também. Por exemplo, um menino foi visitar um amigo e percebeu que ele tem um carrinho de controle remoto. Ele ainda não tem esse brinquedo, então, é normal que ele tenha um sentimento de inveja. Segundo os especialistas, esse tipo de sentimento é perfeitamente aceitável, sobretudo nas crianças.

O mesmo acontece com o ciúme. Quando a criança está em uma zona de conforto, é normal que ela queira permanecer assim. Porém, toda vez que ela se sente "ameaçada", as reações podem ser as mais diversas, como birra, manha, estresse, choro e por aí vai.

Criança brava - iStock - iStock
Até os três anos, sentimentos exagerados são normais
Imagem: iStock

"Pense no cérebro como uma casa de dois andares: o andar de cima, o córtex cerebral, é basicamente onde controlam-se as ações que a gente faz de maneira racional. O andar de baixo, o tronco encefálico, controla coisas automáticas e grande parte das nossas emoções. O que acontece com as crianças é que a comunicação entre esses dois andares ainda é muito fraca e não está bem desenvolvida", explica o neurocientista André Souza, formado pela Universidade do Texas (EUA).

A raiva é outro sentimento comum que todos têm, inclusive as crianças. De acordo com os especialistas, os pais não devem trabalhar para bloquear esses sentimentos, pelo contrário, as crianças devem saber que eles existem e que farão parte de suas vidas. Assim, elas aprendem a lidar com as suas emoções.

Quando merece atenção

Os pais devem ficar atentos a sentimentos em excesso. É normal que uma criança de três anos não consiga segurar seus impulsos e queira partir para a briga quando irritada ou contrariada. Mas reações do tipo em quem tem mais de sete anos já merecem atenção.

"Há um consenso dentro da literatura de desenvolvimento de que as crianças conseguem começar a regular as emoções por volta de sete ou oito anos de idade. Elas começam a entender: eu estou com raiva, mas eu não preciso gritar; estou com raiva, mas não preciso brigar", diz Souza.

A partir dessa idade, se a criança não demonstrar o mínimo de maturidade, é preciso buscar ajuda psicológica, para ajudá-la a compreender e a lidar melhor com suas emoções. "Não pode deixar passar. Especialmente os pais e os professores que ficam mais tempo com a criança têm que apontar, traduzir, ir nomeando os sentimentos e ajustando-os. Isso deve ser feito não pelas normas moralistas, mas para que, aos crescerem, essas crianças possam viver melhor com elas mesmas e com os outros", diz Carvalho.

Souza enfatiza a importância de todos os sentimentos para a vida. "O objetivo não é acabar com eles, mas aprender a lidar. Todos os sentimentos são bons, o que faz eles ficarem ruins é geralmente como a gente lida com eles".

Quando se é adulto, um dos principais problemas em relação aos sentimentos é o fato de que as pessoas não assumem que têm medo, ciúme, raiva ou até mesmo inveja. "Isso as prejudica em diversas esferas, desde a vida afetiva até a profissional. Por isso que é um tabu falar de inveja", diz Carvalho.

Entretanto, no caso dos adultos, o sentimento pode ser ruim quando for muito forte e levar as pessoas a agirem de uma forma que não condiz com o padrão social. Diferentemente das crianças, espera-se que os adultos tenham um autocontrole e saibam lidar com suas emoções. Quando isso não ocorre, fica o alerta: o ideal é buscar ajuda especializada.