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Paulo Chaccur

Fique atento: disfunção erétil pode ser 1º sinal de problema cardiovascular

SasinParaksa/iStock
Imagem: SasinParaksa/iStock

Colunista do UOL

22/11/2020 04h00

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Sim, ainda é um tabu falar sobre o assunto. Seja entre amigos ou até dentro de um consultório médico, a disfunção sexual erétil (DSE) ou impotência sexual, como popularmente é conhecida, é motivo de constrangimento para muitos homens. Porém, os números revelam que a questão é mais comum do que se imagina ou comenta.

De acordo com dados da SBU (Sociedade Brasileira de Urologia), estima-se que no mundo 100 milhões de homens apresentem disfunção erétil. No Brasil, a prevalência se aproxima de 50% da população masculina, com maior incidência naqueles que passaram dos 40 anos.

A dificuldade de abordar o tema é um obstáculo tanto para o homem, que passa anos desde a primeira ocorrência e a procura de orientação profissional, quanto por parte dos especialistas de saúde. O silêncio que ronda o assunto acaba escondendo uma relação importante: muito além do desempenho sexual, a DSE tem relação com a saúde mental e física e pode ser até um sinal de alerta para doenças cardiovasculares.

As dúvidas, tão comuns entre pacientes e médicos, acabam negligenciadas nas consultas de rotina, retardando o tratamento e piorando a qualidade de vida de milhões de pessoas. Por isso, deixar o estigma de lado e esclarecer as questões que cercam o tema é fundamental.

Para começar: o que é e quais são as principais causas

Resumidamente, a disfunção erétil se caracteriza como uma incapacidade de o homem obter e manter uma ereção do pênis que possibilite uma atividade sexual satisfatória. Trata-se de uma perda na qualidade na ereção, maior flacidez peniana e dificuldade de penetração. Em alguns casos, a ereção é mantida, mas por um período menor, sem ejaculação e orgasmo.

A DSE pode ser causada por fatores físicos e emocionais, como questões psicológicas (ansiedade, depressão e estresse); distúrbios hormonais, especialmente a falta de testosterona, disfunções da glândula tireoide (hipertireoidismo ou hipotireoidismo) e da glândula hipófise; consumo de drogas, álcool em excesso e tabagismo; uso de certos medicamentos (anti-hipertensivos, remédios para depressão e antipsicóticos, por exemplo) ou pelo tratamento do câncer de próstata (cirurgia ou radioterapia).

Há ainda casos em que o problema surge em função de eventos neurológicos, no caso de algumas doenças degenerativas (esclerose múltipla e doença de Parkinson), acidente vascular cerebral, tumores no sistema nervoso central e traumatismos. Outro fator importante e que vamos destacar aqui é a relação da disfunção sexual erétil com o sistema cardiovascular.

A disfunção erétil pode ser um primeiro sinal de doença no coração?

Primeiro, é importante esclarecer: a ereção depende do fluxo de sangue no pênis, portanto alterações que dificultem a circulação sanguínea na região podem causar disfunção erétil. E a circulação do sangue é a principal função do coração, ou seja, a ereção é um processo vascular e depende do bom funcionamento do órgão. Para que ela ocorra, é preciso que haja o enchimento de pequenos vasos sanguíneos que formam os corpos cavernosos do pênis.

Por isso, a principal relação entre a impotência sexual e as doenças cardiovasculares está no fato de ambas compartilharem os mesmos fatores de risco. Entre eles, diabetes, obesidade, hipertensão, taxas elevadas de colesterol e triglicérides no sangue, tabagismo, sedentarismo, estresse e aterosclerose (enrijecimento das artérias devido ao acúmulo de placas de gordura).

Diante desses fatores, a circulação do sangue pode ser comprometida, elevando a chance de disfunção erétil e de doenças do coração, com consequências que vão desde o surgimento da doença arterial coronariana até a ocorrência de um infarto.

Quem vem antes, a disfunção ou os eventos cardíacos?

A disfunção erétil costuma dar seus sinais antes dos problemas cardíacos. E a principal razão se deve ao fato de que as artérias do pênis são mais finas que as do coração, a exemplo da artéria aorta, sendo assim afetadas primeiro. Porém, se aorta é obstruída, o sangue terá dificuldade em passar e chegará no pênis em menor quantidade, causando a DSE.

Algumas pesquisas evidenciam que a disfunção sexual erétil pode se manifestar até cinco anos antes de uma complicação no coração. Por isso, quando há a ocorrência de impotência sexual com certa frequência, a recomendação é investigar e avaliar a saúde cardiológica, uma vez que este pode ser também um indicador de obstrução de outras artérias do corpo. Assim, consideramos a incidência de DSE como um possível sinal precoce de eventos cardíacos.

Evidências científicas apontam que o risco de angina, insuficiência cardíaca ou infarto do miocárdio, por exemplo, é maior se compararmos com indivíduos que não apresentam problemas de ereção. Um estudo recente da American Heart Association, feito com 1.519 pacientes em 13 países, revelou que homens com disfunção erétil têm, em média, duas vezes mais chances de sofrer de infarto do que aqueles que não apresentam esse tipo de problema.

O impacto das doenças cardiovasculares na vida sexual

Outra relação que devemos considerar é a interferência que as doenças cardiovasculares podem exercer na atividade sexual, observado principalmente por algumas razões. A primeira se dá logo após o diagnóstico de um problema no coração. Alguns pacientes passam a apresentar um quadro de ansiedade, medo da morte ou de complicações, e até enfrentar certa restrição no que diz respeito ao esforço e atividade física. Isso porque durante o ato sexual, a frequência cardíaca e a pressão arterial podem aumentar da mesma forma que em outra atividade aeróbica.

A segunda está relacionada com a incidência de sintomas cardíacos em decorrência da doença, como angina (dor no peito), fadiga, exaustão e falta de ar. Há ainda uma terceira razão que podemos listar aqui: o uso de certos medicamentos capazes de produzir efeitos adversos que prejudicam a performance sexual, especialmente a disfunção erétil e a perda da libido.

O uso de fármacos para o tratamento das doenças cardiovasculares pode efetivamente produzir mudanças no que diz respeito ao desempenho sexual. Estatísticas apontam que até 20% dos pacientes apresentam falta de desejo ou impotência ao iniciar a terapia. Isso geralmente acontece quando o homem toma remédios da classe betabloqueadores, um dos mais eficazes na prevenção de um segundo infarto e no tratamento da hipertensão. Esses medicamentos atuam no sistema nervoso central e na área do cérebro responsável pela libido, podendo assim alterar o desejo sexual.

Porém, vale uma ressalva: remédios nunca devem ser suspensos por conta própria. Eles são fundamentais para manter o coração e o organismo em pleno funcionamento. Qualquer questão deve ser tratada com o médico responsável para que, juntos, busquem a melhor saída.

Infarto x atividade sexual

Creio que todo mundo já ouvi uma notícia, assistiu a um filme ou novela uma situação semelhante: de um homem sofrer um mal súbito durante a relação sexual, em alguns casos de maneira fatal. E, sim, isso pode mesmo ocorrer. O risco de sofrer um infarto do miocárdio durante atividade sexual chega a ser três vezes maior que o risco em outras situações com gasto energético similar.

Porém, sintomas cardiovasculares durante o sexo raramente ocorrem em pacientes que não têm sintomas similares durante o teste de esforço e demais exames. Os números apontam que a chance um infarto, tendo como gatilho a atividade sexual, é baixo. Mesmo assim, ele existe. Por esta razão, reforço a importância de manter seu check-up sempre em dia.

E se o paciente já teve um infarto, ele pode ter uma vida sexual normal? O retorno das atividades após o evento cardíaco será orientado pelo médico. Cada paciente tem um quadro clínico.

Além do infarto, em casos de arritmias de alto risco, cardiomiopatias e doença valvar graves, por exemplo, a atividade sexual pode representar um risco significativo. Por isso, a avaliação é estritamente individual. É importante acompanhamento cardiológico criterioso antes da retomada da vida sexual.

A disfunção erétil é uma doença como qualquer outra

Os tratamentos para a impotência variam de acordo com a causa. De modo geral, o que podemos afirmar é que garantir hábitos de vida saudáveis é o melhor caminho a seguir para prevenir a DSE. Na maioria das vezes, as causas e doenças associadas à disfunção erétil são passíveis de controle e tratamento.

A recomendação é a prática de atividades físicas regulares, alimentação equilibrada, atenção ao estresse, evitar consumo de álcool, tabaco e demais drogas, além de manter sob controle colesterol, diabetes e hipertensão.

Reforço que uma falha ocasional na performance sexual não se caracteriza como doença. O quadro vira um alerta quando o problema de ereção se torna recorrente. Nesses casos, é preciso consultar um especialista para avaliação. Precisamos deixar o tabu e estigma de lado. A impotência sexual é uma doença como qualquer outra e precisa de atenção e cuidados.