Lúcia Helena

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Reportagem

Vacina de dengue: Ministério da Saúde faz alerta sobre reações

Nesta quinta-feira (7), o Ministério da Saúde reuniu médicos e outros especialistas em vacinação que integram o CTAI (Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização) com o pessoal CIFAVI (Comitê Interinstitucional de Farmacovigilância de Vacinas e Imunobiológicos), encarregado de ficar de olho em todo tipo de efeito adverso ou estranho registrado após alguém ser vacinado contra uma infecção qualquer.

O motivo do encontro urgente: notificações feitas em várias regiões do país de reações de hipersensibilidade, anafilaxia e até mesmo choques anafiláticos "supostamente atribuídos à vacina da dengue", como está escrito na nota técnica que os especialistas elaboraram a muitas mãos e que foi enviada ontem mesmo, bem tarde da noite, para orientar profissionais e instituições de saúde sobre como identificar, lidar e, não menos importante, investigar por que aconteceu cada caso desses.

É justo que escrevam "supostamente": um menino ou uma menina pode apresentar reações depois de tomar a vacina da dengue e elas não terem nada a ver com o imunizante em si, sendo uma alergia ao látex que está na composição das seringas ou até mesmo na tampinha do frasco do medicamento, para dar um exemplo. Até pode ser. Mas o fato é que desta vez esse tipo de registro, embora continue relativamente raro, foi acima da média do que é observado após alguém tomar outras vacinas.

Por enquanto, os episódios não são razão para parar tudo, mas são motivo de sobra para deixar todo mundo bem preparado sobre o que fazer. Afinal, se até o momento foram 16 casos de reações alérgicas consideradas graves — sendo três choques anafiláticos —, todos os jovens foram atendidos no ato, se recuperaram e passam bem, sem qualquer sequela. Bom que continue assim.

Por que as reações apareceram "só agora"?

É o que talvez você se pergunte. Entenda: a vigilância sobre qualquer imunizante é e sempre foi constante. "Mas, claro, qualquer vacina nova faz a gente aumentar ainda mais a atenção a possíveis reações inesperadas", diz o infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) e membro do CTAI.

Não apareceu, como ele lembra, nenhum caso de anafilaxia — de fato, zero — nos estudos com cerca de 30 mil crianças e adolescentes que receberam a vacina tetravalente produzida pelo laboratório Takeda, feita com o vírus da dengue atenuado. Popularmente, um vírus enfraquecido, incapaz de causar a doença, mas que consegue preparar o organismo para enfrentar a versão turbinada transmitida pelo mosquito Aedes aegypti.

"Acontece que as reações raras só vêm à tona quando uma vacina é aplicada em larga escala, ou seja, na vida real", explica Kfouri. Em uma comparação grosseira, é como na loteria: se você marca mais números em um bolão, cresce a probabilidade de acertar. Tudo bem que, aqui, a má surpresa não tem sabor de prêmio.

Se por um lado, repito, foram quase 30 mil garotos vacinados contra a dengue nos ensaios clínicos — um baita número, com excelentes resultados de segurança que levaram à sua recomendação pela OMS (Organização Mundial da Saúde )—, no Brasil em guerra contra a dengue e com o SUS (Sistema Único de Saúde) se esforçando para proteger a população, o número de imunizados salta para outro patamar, bem mais elevado. Daí, aumenta a probabilidade de uma encrenca aparecer.

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Aqui, até a última segunda-feira, dia 4, já tinham sido aplicadas exatas 365.610 doses da vacina contra a dengue. Isso significa uma quantidade de gente mais que doze vezes maior que a dos estudos.

Os primeiros 15 minutos

Foram 529 notificações de problemas relacionados à vacina no total. Delas, a maioria, ou 431 casos (79,8%), dizia respeito a reações nem um pouco graves, feito vermelhidão ou dor no local da injeção. Dez jovens tiveram apenas urticária. Muitas vezes, diga-se, a reação grave começa por uma manifestação na pele, que não deve ser menosprezada. Mas eles ficaram só nisso, ainda bem.

Apenas 33 crianças e adolescentes apresentaram uma hipersensibilidade mais grave e, aí, o grande receio é o do choque anafilático, quando, entre outras coisas, o corpo inteiro incha por causa da reação alérgica. Pode chegar ao ponto de esse edema fechar a glote, bem na passagem do ar. A pressão sanguínea também despenca. A consequência disso tudo é uma tremenda dificuldade para respirar e, eventualmente, até parada cardíaca, com um óbvio risco de morte.

Nada de mal acontece — e não ocorreu nenhum caso fatal entre as meninas e os meninos vacinados —, se forem tomadas medidas como uma injeção de epinefrina, um outro nome para a adrenalina. Isso resolve o caso grave em um zás-trás.

"Bom avisar maioria dos registros foi do que chamamos de reações rápidas", esclarece Kfouri. "Ou seja, elas aconteceram nos primeiros 15 minutos após a aplicação da vacina da dengue."

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Por esse motivo, a orientação da nota técnica é bem clara: se o jovem nunca teve um episódio de alergia mais grave na vida, ainda assim, por segurança, ele deve ficar pelo posto de vacinação por 15 minutos após receber a picadinha.

No caso daqueles que já têm histórico de reações alérgicas mais graves, a precaução aumenta. Isto é, o tempo de observação no posto de vacinação sobe para meia hora.

Aliás, a nota técnica do Ministério da Saúde — além de repassar aos profissionais na linha de frente da vacinação tudo o que precisa ser feito quando identificam um caso de hipersensibilidade — reforça a importância de capricharem na triagem logo na chegada no posto, perguntando se a criança ou o adolescente já teve alergias fortes antes. O texto deixa claro que, mesmo entre aqueles que nunca manifestaram nada do gênero, o certo é aguardar um pouco para garantir que está tudo bem.

O que deve acontecer

Agora, deve ser feita uma boa análise de caso por caso, incluindo exames laboratoriais para que todos entendam o que, de fato, está acontecendo. Por trás das reações adversas pode estar alguma proteína da fórmula ou, para dar outro exemplo, agentes antimicrobianos usados para o líquido, que é um prato cheio para manter o vírus da dengue atenuado, não acabar contaminado por outro micro-organismo qualquer. E assim por diante.

A ameaça de reações adversas graves, alerta o Ministério da Saúde, não chega nem perto da severidade que a dengue vem demonstrando ter na faixa etária dos 10 aos 14 anos, aquela que é alvo da vacinação no momento. Os benefícios da imunização continuam superando seus riscos. Só é preciso aumentar a cautela, aguardando um tempinho no posto e, quem sabe, conversando com o pediatria da família para orientações prévias

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"A pena que é isso tudo abala a confiança que as pessoas têm nas vacinas em geral", lamenta Renato Kfouri. "Mas transparência, nessas horas, é mais que fundamental." Aliás, a vigilância e essa transparência toda só revelam que é feito de tudo para que a gente confie na vacinação contra a dengue ou contra qualquer outra doença.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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