Pandemia de coronavírus transformou a insegurança em norma
Não é preciso dizer que o momento que o mundo se encontra gera em todos a percepção de fragilidade e insegurança.
O sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman dizia que a escuridão não constitui a causa do perigo, mas é o habitat natural da incerteza e, portanto, do medo e da insegurança. Ela está fortemente representada nestes tempos.
Sabemos que vai passar, mas estaremos vivos? E que mundo nos espera já que sabemos que ele não vai acabar, mas vai mudar. O fim do mundo é diferente de o fim de um mundo.
Insegurança sobre nossas vidas e de quem amamos, medo do contato, máscaras, insegurança financeira e medo da superlotação de hospitais que inviabilizaria o atendimento a todos que necessitassem, viraram nossa rotina. Aí temos o isolamento como forma de sobrevivência e como o brasileiro tem que sofrer um pouco mais que todo mundo, temos como adicional a instabilidade politica.
Estamos diante de uma realidade, até pouco tempo, absolutamente inimaginável.
Nas catástrofes a vida é lançada ao fortuito, a contingência sob a qual não se tem controle. Mas que controle?
A falsa sensação de que temos o domínio de nossas vidas é fundamental para vivermos.
A exposição da fragilidade da vida pode levar a uma outra epidemia, talvez pior que a do coronavírus, que é a de transtornos como depressão e ansiedade fora de controle.
O isolamento, como se não bastasse, pode ainda ter repercussão sobre nossa saúde física. E não me refiro apenas a falta de exercício físico e o fato de a alimentação tornar-se inadequada na maioria das vezes, já que as pesquisas mostram que quatro em cada dez pessoas passaram a ingerir menos frutas e verduras, comem em maior quantidade, consomem mais produtos industrializados e não têm horário para fazer as refeições.
Refiro-me, sim, ao estudo divulgado em 2015 pela Universidade da Califórnia, em que fica demonstrado que o estresse causado pelos sentimentos de solidão e isolamento pode afetar a produção de células brancas, chamadas leucócitos que são responsáveis por nossas defesas.
Como consequência, existe o aumento de inflamações no corpo e diminuição da resposta antiviral. Ou seja, a solidão baixa nossa imunidade.
Além disso, já está demonstrado que essa solidão tem efeito semelhante ao tabagismo na saúde do coração. Cada dia de solidão corresponderia a fumar seis cigarros.
Outro estudo da Universidade de York, na Inglaterra, publicado em 2016, demonstrou que quem se sente solitário com frequência ou está isolado, têm risco 29% maior de ataque cardíaco e 32% maior de derrame cerebral. Portanto, isole-se em casa, de preferência acompanhado. Mas mantenha distância, até porque, segundo pesquisa, 73% das pessoas moram com alguém do grupo de risco (idosos, hipertensos, cardiopatas ou diabéticos).
Meu Deus, que maluquice.
Imaginem médicos e enfermeiros que, na linha de frente, saem de casa diariamente para encontrar-se com pacientes contaminados já que, por missão, juramento e senso ético, tem que fazê-lo. Mas obviamente, humanos que são, confessam medo, insegurança e apreensão, não somente pelo próprio contágio, mas também a transmissão para a família o que os faz mudar a rotina até dentro de casa.
Ainda, muitos convivem com o desrespeito de alguns administradores e gestores públicos que os expõem pela falta de equipamentos de proteção. Reforçam o respeito e a admiração da sociedade, mas, por vezes, muitas vezes, convivem com a discriminação de vizinhos e até familiares.
Agredidos e sensibilizados que estamos neste momento da humanidade, ainda corremos o risco da insensibilidade e do triste costume com o número de mortos anunciados diariamente como se fosse normal.
Ideias persecutórias, uma sensação de que algo ruim está por vir, acompanhados da sensação de impotência tem alimentado e aumentado nossa angústia.
Nesse mundo novo, mas seguramente transitório, quem não está confuso é porque está mal informado.
Como então administrar tudo isso?
Óbvio que cada pessoa reage de um modo diferente. Cada um com uma realidade financeira, dinâmica familiar, status psíquico prévio e predisposições de ordem física e emocional. Portanto, não há uma fórmula universal para o enfrentamento, mas algumas ideias podem nos fortalecer (e obviamente devem ser adaptadas as realidades individuais) tais como:
- Nos momentos de angústia extrema, tentemos nos lembrar de quem está doente e internado. Estes, sim, estão verdadeiramente isolados, cuidados por mascarados anônimos e ainda convivem com a incerteza da evolução da doença.
- Estamos todos juntos neste momento, visto que é um problema mundial.
- Está não é a primeira e nem a pior pandemia que atingiu a humanidade, e não exterminará nossa espécie, ao contrário do que se apregoa. Conhecemos o inimigo e, embora invisível, todos os cientistas do mundo estão contra ele. Não estamos sós.
- Não escute notícias demais sobre a pandemia e o número de mortos. Lembre-se do que disse o nosso ex-ministro da saúde: A televisão por vezes é tóxica.
- Exerça ações de solidariedade, pois além de fundamentais para humanidade, nos transformam em pessoas úteis e confortam nossos corações.
- Use, se possível, a tecnologia para manter contato com amigos e familiares, sobretudo idosos. Eles e nós precisamos disso.
- Exercite o convívio com os familiares que moram com você. Lembre-se que sempre quis mais tempo com eles.
- Exercite atividades prazerosas tais como: ler, ouvir mísicas, assistir a filmes e séries, fazer cursos online, cozinhar e meditar.
- Não abra mão de rotinas como hora para acordar, refeições, banho e barba. Elas são importantes para demonstrar que você continua com o controle da sua vida.
- Mantenha o cuidado pessoal. Alimente-se bem, mantenha exercícios em casa e controle o peso.
- Faça contato com seu médico e não interrompa seu tratamento prévio.
Em um mundo líquido que dilui valores, é fundamental que resgatemos a paciência e a resiliência para fortalecer o enfrentamento neste momento.
Lembre-se da música "Under Pressure", de David Bowie e cia., que diz: "A insanidade sorri e sob pressão estamos pirando, mas o amor te desafia a se importar com as pessoas no limite da noite."
Portanto, solidariedade é mais um valor fundamental. Neste momento, minha bola de cristal está embaçada, mas como gosto de olhar construtivamente para a vida e tenho certeza que logo tudo passa e teremos um mundo melhor.
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