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Fotógrafa nos Jogos fala de união de atletas e comemora medalhas femininas

Maddie Meyer é fotógrafa em Boston e cobriu as Olimpíadas de Tóquio; cliques mostram esforço e empatia entre atletas homens e mulheres - Divulgação
Maddie Meyer é fotógrafa em Boston e cobriu as Olimpíadas de Tóquio; cliques mostram esforço e empatia entre atletas homens e mulheres Imagem: Divulgação

Nathália Geraldo

De Universa

19/08/2021 04h00

As Olimpíadas são um grande momento não só para atletas, mas para outros profissionais ligados ao esporte, em especial, os jornalistas. Em Tóquio, a ausência de torcida nas arquibancadas foi um elemento que chamou a atenção da fotógrafa norte-americana Maddie Meyer, que há seis anos trabalha para a Getty Images, banco de imagens responsável por distribuir conteúdo para veículos de comunicação mundo afora.

"Havia mais proximidade entre os atletas, porque não tinha mais ninguém ali para o suporte deles", destaca.

Uma das imagens favoritas de Maddie envolveu justamente uma emocionante comemoração entre nadadoras norte-americanas e sul-africanas. A africana Tatjana Schoenmaker venceu os 200 metros peito e bateu o recorde mundial da prova, porém ela demorou para se dar conta do feito. Ao perceber, as americanas Annie Lazor e Lilly King, que ficaram em terceiro e segundo lugar, respectivamente, além da compatriota Kaylene Corbett, foram abraçar a campeã.

"Essa imagem é um dos meus momentos olímpicos preferidos, porque sempre imagino que aquelas mulheres trabalharam naquilo a vida inteira. E para nadadoras, é um tempo muito pequeno entre o primeiro e o segundo lugar."

Fotojornalista com base em Boston, Maddie contou para Universa, neste Dia Mundial da Fotografia (19), sobre a experiência de ter fotografado as Olimpíadas e a Copa do Mundo de futebol feminino de 2019, além de falar sobre o machismo de que foi vítima no início da carreira e da "pequena comunidade" de mulheres fotógrafas se formando na cobertura esportiva. Para ela, ainda faltam mais mulheres do lado de trás das lentes.

olimpiadas - Maddie Meyer/Getty Images - Maddie Meyer/Getty Images
Uma das fotos preferidas de Maddie, feita nas Olimpíadas de Tóquio: Tatjana Schoenmaker, da África do Sul, comemora medalha de ouro com Lilly King e Annie Lazor, dos EUA, e Kaylene Corbett, também sul-africana. Modalidade era 200m peito de natação
Imagem: Maddie Meyer/Getty Images

UNIVERSA: Há quanto tempo você fotografa esportes e por que decidiu pelo tema?

Maddie Meyer: Comecei a trabalhar no banco de imagens Getty Images com esse tema há seis anos. Mas, cresci jogando futebol, e amava esse ambiente, me manter ativa, trabalhar em equipe. Além disso, sempre amei fotografia. Minha família foi sempre muito por dentro das artes, e honestamente adorava desenhar, fazer esculturas, todas essas coisas.

Me formei na faculdade de Ohio em fotojornalismo. Sempre achei divertido cobrir os jogos de futebol, de beisebol. Era como se não estivesse trabalhando. Comecei a tirar fotos de eventos esportivos ainda no ensino médio. E tentei correr nisso o quanto pude. Em Nova York, entrei em um estágio na Getty Images já cobrindo esportes. Então, me formei e mudei para Boston, e estou aqui desde então.

Em alguns esportes, como o futebol, o basquete, as mulheres não têm a mesma visibilidade que os homens têm. Como você vê a diferença da atenção dada às jogadoras?

Quando eu cubro eventos de mulheres e homens, cubro do mesmo jeito. São todos atletas, trabalhando juntos em um time, para vencer e são muito apaixonados pelo esporte. Trabalhei em Copas do Mundo masculina e feminina. Levei o mesmo equipamento, me preparei da mesma forma, e só me mantenho focada, não importando o gênero dentro da competição.

Entretanto, a realidade é que há mais dinheiro em esportes feitos por homens, atualmente. Por isso, levo muito a sério meu papel de jogar luz sobre as modalidades femininas, sempre tenho esse compromisso

Aumentando inclusive o volume da cobertura. Em vez de 24 fotos, eu digo: "Tome aqui 150 fotos". São boas imagens de banco, retratos dessas atletas, para tentar promover... Para ter certeza de que há fotos delas, porque nós não cobrimos tanto.

Você aponta algum avanço neste tipo de visibilidade?

Sou muito otimista e creio que isso também está mudando, certamente se você olhar para as mulheres do futebol da Europa e nos Estados Unidos. Posso falar pelo time feminino daqui, que tem muito mais publicidade do que o dos homens. E isso é um caminho de alguns anos. Elas acabaram de voltar campeãs da Copa do Mundo.

Infelizmente, não está próximo de metade ainda, mas, me sinto estimulada pelo que vejo. Espero que isso continue.

Que percepção teve sobre diversidade nos Jogos Olímpicos de Tóquio?

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Em destaque, nadadora Katie Ledecky, dos EUA, durante prova de estilo livre 1500m, nas Olimpíadas de Tóquio
Imagem: Maddie Meyer/Getty Images

Foi um evento interessante porque não havia público, familiares. E também foi curioso porque pelo menos para os Estados Unidos mais medalhas foram conquistadas pelas mulheres do que pelos homens [elas levaram 66 medalhas e eles, 41], pela primeira vez. Isso foi muito encorajador, por causa do investimento que envolve os atletas.

Parte de mim era de: "O que importa, todos são atletas, todos trabalham para ganhar e fazer o seu melhor'. Mas essa marca também mostra: "Olhe para isso, veja quem está trazendo mais medalhas e como é importante garantir que mulheres estejam jogando.

Espero que as Olimpíadas tenham inspirado não só garotas, mas suas famílias e pessoas que estão em volta delas, mostrando atletas bem-sucedidas.

Qual é a história da foto das nadadoras que se abraçam depois de uma delas ganhar o ouro? Vê homens celebrando assim também?

Primeiro, eu as notei. Sendo uma mulher, acho que captei rapidamente o que elas estavam fazendo, comemorando juntas. Depois revi meu pensamento e pensei: "Ok, isso acontece entre homens também". Mas amo grupos de mulheres se unindo.

E acontece mesmo, entre atletas de diferentes países, inclusive, mas particularmente nestes Jogos quando eles não tinham familiares, fãs... Então, havia mais proximidade entre os atletas, porque não tinha mais ninguém ali para o suporte deles.

Essa imagem é um dos meus momentos olímpicos preferidos, porque sempre imagino que aquelas mulheres trabalharam naquilo a vida inteira. E para nadadoras, é um tempo muito pequeno entre o primeiro e o segundo lugar.

O que a Copa do Mundo feminina de 2019, que você cobriu, te ensinou sobre a valorização das mulheres no esporte?

marta silva - Maddie Meyer/Getty Images - Maddie Meyer/Getty Images
Maddie Meyer cobriu Copa do Mundo feminina de 2019, na França. Na foto da profissional, a jogadora da Seleção brasileira Marta Silva
Imagem: Maddie Meyer/Getty Images

Foi um evento tão positivo. E cobri-lo foi um dos meus momentos favoritos de trabalho; como norte-americana, amei ainda mais, porque a seleção feminina de futebol dos Estados Unidos estavam tão bem...

Lá, tive a experiência que muitos homens têm quando veem esportes e se relacionam com aqueles atletas. Como disse, cresci jogando futebol, e foi um momento incrível estar no vestiário com elas, e pensar: "Isso é maravilhoso. Sei o trabalho que essas mulheres tiveram, elas conseguiram reconhecimento por isso. Estão celebrando todas juntas, e o mundo inteiro está vendo."

O número de espectadores foi muito alto, e os patrocinadores viram que aquilo realmente estava começando a virar realidade. Eu mesma pensava: "Vou assegurar que terei as melhores fotos para elas, para as famílias delas, mas também porque se grandes marcas quiserem aquelas imagens para usá-las, também têm algumas ótimas".

Você sofreu preconceito por ser mulher no começo da sua carreira?

Com certeza. Honestamente, não tive uma experiência diferente do que muitas outras mulheres que trabalham em indústrias ou que são garçonetes em um restaurante, ou mulheres políticas têm. Lidei com pessoas que já fizeram comentários rudes, dizendo que eu não sabia o que estava fazendo. Mas, tento manter meu patamar alto, trabalhando com as minhas melhores habilidades.

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Registro das Olimpíadas: Joseph Emilienne Essombe Tiako, da equipe de Camarões, compete contra Mayu Mukaida, da equipe do Japão. A modalidade é luta estilo-livre 53kg
Imagem: Maddie Meyer/Getty Images

Até porque já ouvi de outras mulheres novas que não sabiam que podiam fazer até me verem fazendo. Ouvir isso muitas vezes me faz pensar: "Não vou me abalar com quem faz um comentário maldoso". Só me preocupo em fazer meu melhor, e aí acho que as pessoas começam a notar.

De alguma forma, a desigualdade de gênero reflete na sua vida profissional?

Me sinto extremamente sortuda, porque o homem que me introduziu na fotografia, que ainda é meu mentor muito próximo e, atualmente, trabalha no jornal "The New York Times", sempre me falou: "Não se importe com o que você vê aqui, você pertence a esse lugar."

Sempre houve esse cara e uma voz na minha cabeça dizendo isso. E também aprendo muito na Getty Images com a fotógrafa Elsa Garrison, de Nova York, e com o Al Bello, um dos fotógrafos experientes mais talentosos de lá. Tive mentores, desde muito cedo, dizendo que eu sou boa o suficiente.

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Registro na Copa do Mundo na França, em 2019, feito por Maddie: o beijo entre as jogadoras suecas Lina Hurting e Lisa Lantz após vitória da Seleção do país
Imagem: Maddie Meyer/Getty Images

Mas, converso com mulheres que disseram que não ter conseguido trabalhar com esportes porque não foram tratadas bem. Ao ouvir isso, tento encorajá-las, converso, faço workshops. Sei que fui abençoada por minha experiência ter sido boa.

O que diz para as mulheres que querem começar a fotografar, principalmente eventos esportivos?

Sempre as encorajo, esse campo, sendo homem ou mulher, é extremamente competitivo, mas há espaço para nós. Adoraria ter mais mulheres, respondo qualquer e-mail, mensagem no Instagram que me mandam sobre isso!

E digo para que tenham sua própria visão, pratiquem e tirem muitas fotos. Se você for boa, terá seu espaço. Às vezes, como mulher, precisará provar a si mesma de forma extra, mas é possível. Aquelas mulheres na natação são uma prova disso.