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Ana Canosa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Atos de amor exagerados podem esconder relação com narcisista. Entenda

Colunista de Universa

05/03/2022 04h00

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Love-bombing, que em português quer dizer algo como "bombardeio de amor" - diz respeito as manifestações de amor exageradas, que avançam limites, por vezes constrangem o destinatário e as pessoas ao redor, e podem ser sinal de compensações emocionais. Blogueiros anedóticos inventaram o termo como um meio de descrever a tendência do indivíduo de "bombardear" seus crushs com e-mails, mensagens, telefonemas ou experiências pirotécnicas.

Um bom exemplo foi dado pelo rapper Kanye West no último Valentines Day. Ele, que quer a todo custo reatar o casamento com a ex-mulher, Kim Kardashian, enviou uma caminhonete de flores à casa dela, e ainda pediu para todos os seguidores dele irem nas redes sociais da ex a incentivar a aceitá-lo de volta. Eles estiveram juntos por 7 anos, tem quatro filhos, estão separados há 1 ano e já se envolveram com outras pessoas. Vale lembrar que Kim está em um relacionamento com o ator e comediante Pete Davidson — a quem o rapper já ameaçou pelas redes sociais.

Essa e outras alardeadas manifestações de "amor" (será?) nos provocam uma inquietação: o quanto a pessoa está mais interessada no efeito que o seu comportamento provocará só para de fato alimentar o próprio ego? Um estudo conduzido pela Universidade de Arkansas com uma amostra de 484 estudantes universitários com idade entre 18 e 30 anos de idade, confirmou a tendência narcísica envolvida no love-bombing.

O narcisista quer garantir seu lugar como a pessoa mais importante na vida de sua parceria. Esperam que a admiração que expressam seja retribuída, porque o que realmente desejam é a afirmação de que são amados, bonitos e desejados, mais ainda do que eles honestamente querem reconhecer essas qualidades em seu parceiro.

Narciso era um jovem de 16 anos que se apaixonou pelo próprio reflexo. Na história mitológica, Echo, uma jovem garota da montanha, era fascinada pela beleza de Narciso, mas incapaz de se comunicar e declarar seu amor por ele, já que fora amaldiçoada pela Deusa Hera e só podia falar as palavras que ela ouvia pela última vez.

Certo dia ela o seguiu até o momento em que ele viu o próprio rosto refletido na água e, finalmente, o ouviu falar. Narciso, apaixonado por seu reflexo, disse: "Você é a imagem de perfeição." Ouvindo suas palavras, Echo repetiu: "Você é a imagem da perfeição". Narciso, ficou ainda mais fascinado pela afirmação que recebeu do que presumia ser seu reflexo, continuou: "Eu nunca disse isso a ninguém, mas acredito que amo você." Echo repetiu novamente: "Eu te amo".

A admiração retribuída só alimentou cada vez mais a afeição de Narciso por si mesmo. Como ele continuou a elogiar seu reflexo, e "seu reflexo" (Eco) continuou a retribuir o elogio, Narciso foi completamente dominado pelo viciante sentindo que este pseudo-amor é fornecido. No final, Narciso estava tão apaixonado por si mesmo que se afogou na lagoa tentando beijar seu próprio reflexo, deixando Echo, com o coração partido e sozinha a vagar pelas colinas e cavernas do vale, condenada a nunca mais amar ninguém.

Como na história de Narciso, os narcisistas, em última análise, elogiam a si mesmos agradando sua parceria em espera que eles, como Echo, retribuam o favor. Acabam enfrentando o mesmo destino como o da lenda grega, já que a bajulação excessiva e a necessidade de afirmação resultam no fim de um relacionamento quando se torna evidente que a afeição deslocada não vai além do amor que sentem por si mesmos.

Alguns pesquisadores sobre comportamento da juventude, chamam a atenção para o fato de que a geração millennial tem tido um aumento significativo de tendência narcisista de personalidade.

Vivendo e alimentando a "sociedade do espetáculo", tão fortalecida pelas redes sociais, muitos comportamentos não são mais do que o reforço de um ego fragilizado pelo desejo de manter-se sempre em destaque.

E isso, definitivamente, está longe de ser amor pelo outro. Porque o amor é menos observado na manifestação grandiosa da declaração e muito mais na capacidade de alguém ainda estar ao seu lado, gostando de você, mesmo quando nem você está gostando muito de si mesmo.