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Ucrânia teria reunido 300 mil hackers em guerra virtual contra a Rússia

15.mar.22 - Equipes de resgate removem destroços de um prédio residencial danificado por um ataque aéreo em Kharkiv, Ucrânia - STRINGER/REUTERS
15.mar.22 - Equipes de resgate removem destroços de um prédio residencial danificado por um ataque aéreo em Kharkiv, Ucrânia Imagem: STRINGER/REUTERS

Aurélio Araújo

Colaboração com Tilt, de São Paulo

16/03/2022 16h31Atualizada em 16/03/2022 19h45

Um exército informal com cerca de 300 mil hackers se voluntariou para ajudar a Ucrânia na guerra cibernética contra a Rússia, derrubando sites do governo de Vladimir Putin e de veículos de imprensa russo associados ao país, de acordo com informações do jornal britânico The Guardian.

O "exército de TI", recrutado pelo governo ucraniano, há algumas semanas, se reúne principalmente em um grupo do aplicativo de troca de mensagens Telegram. Na plataforma, eles recebem tarefas para realizar "missões" virtuais de ataque.

A iniciativa foi organizada por Mykhailo Fedorov, vice-premiê da Ucrânia e ministro da Transformação Digital do país. Com apenas 31 anos, Fedorov é o membro mais jovem do gabinete do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e tem usado suas redes sociais para convocar um combate à Rússia em um campo em que Putin é bastante forte: a arena digital.

"Estamos criando um exército de TI. Precisamos de talentos digitais", afirmou Fedorov no Twitter, no início da guerra, colocando o link do grupo no Telegram à disposição. "Continuamos a lutar no fronte cibernético."

Resultados imediatos

Segundo a reportagem do The Guardian, os ataques têm obtido sucesso em perturbar o governo russo e sites de mídia apoiados pelo Estado. A análise é de Alp Toker, diretor da NetBlocks, empresa que monitora a conectividade da internet global.

Como exemplo, ele diz que os sites oficiais do Kremlin, residência oficial da presidência da Rússia, e da Duma, uma das casas do Parlamento local, têm estado com conectividade "intermitente" desde o início da invasão.

Além disso, sites de empresas estatais, bancos e até mesmo da Gazprom, empresa de gás natural pertencente ao governo, também foram alvos.

Toker diz ainda que a Rússia tentou mitigar os ataques ao filtrar o acesso a alguns desses sites, mas isso só tornou a situação deles ainda mais delicada.

O método de ataque mais comum tem sido o DDoS, sigla em inglês para "negação de serviço distribuída", no qual os sites são sobrecarregados com um grande número de acessos, o que os torna instáveis.

Luta contra a desinformação

De acordo com o jornal britânico, entre os ucranianos, há cerca de 290 mil profissionais de TI, o que faz do país um dos lugares do mundo que mais recebem serviços terceirizados na área. No entanto, muitos deles tiveram de largar seus computadores e pegar em armas para defender o país.

Portanto, sobrou a Mykhailo Fedorov organizar uma espécie de resistência digital, convocando voluntários de todo o planeta que se identifiquem com a causa.

Um dos especialistas em TI da própria Ucrânia, cuja identidade foi preservada pelo Guardian, diz que o país está em guerra híbrida — quando une conflito terrestre e virtual— com a Rússia desde 2014, ano em que houve a anexação russa da Crimeia, região então sob domínio ucraniano.

Então, por exemplo, o uso de fake news e desinformação para confundir os cidadãos de um país ou de uma região faz parte das táticas em uso, e a Rússia é acusada por países ocidentais de estimular essas práticas.

"Nós entendemos como a Rússia age: eles fazem propaganda aqui, e também no país deles, e então tentam compartilhar a visão deles com a comunidade global", diz o profissional de TI não identificado.

Por isso, parte dessa guerra é tentar fazer propaganda no sentido contrário: divulgar ao máximo, por exemplo, vídeos de soldados russos capturados falando com suas famílias à distância, tentando contar a elas o que está acontecendo na Ucrânia. A ideia é fazer com que mais russos se incomodem com a situação e conheçam a versão ucraniana sobre o que está ocorrendo na guerra.

Riscos

Nem todos, no entanto, são favoráveis às técnicas ucranianas em curso. Alan Woodward, professor de cibersegurança ouvido pelo jornal britânico, se diz preocupado com a formação de um exército virtual voluntário. O professor diz que deve haver "laranjas podres" no meio dos 300 mil hackers.

"Esses voluntários podem começar a atacar alvos que não são os que o governo ucraniano deseja. Isso pode ser acidental. Com que frequência o ransomware [sequestro de dados] já transbordou e afetou, por exemplo, um hospital? Eu acho que ninguém quer que isso ocorra", disse ele.

Além disso, Woodward afirma que não houve ainda grandes feitos realizados por esse exército informal, que tenham realmente ajudado a Ucrânia.

"Pode ser um incômodo para os russos, mas os ataques que vimos até agora não afetaram a capacidade de combate russa de forma decisiva."