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As lições de Brumadinho: como a tecnologia pode ajudar em Petrópolis

Pesquisadores da USP usando um radar de penetração no solo para localizar vítimas soterradas pelo rompimento da barragem de Brumadinho - Divulgação/USP/Jorge Porsani
Pesquisadores da USP usando um radar de penetração no solo para localizar vítimas soterradas pelo rompimento da barragem de Brumadinho Imagem: Divulgação/USP/Jorge Porsani

Abinoan Santiago

Colaboração para Tilt*, em Florianópolis

24/02/2022 11h50

Uma semana depois da tempestade que matou 198 pessoas, Petrópolis (RJ) ainda busca por desaparecidos. Segundo o Corpo de Bombeiros, existem vítimas que podem estar até cinco metros abaixo da superfície coberta de barro.

A situação é semelhante à ocorrida em Brumadinho (MG), quando uma barragem de rejeitos se rompeu, criando uma "tsunami de lama", deixando 264 pessoas mortas soterradas. Três anos após a tragédia, a cidade ainda tem seis desaparecidos, mas a tecnologia se tornou fundamental para encontrar as centenas de outras vítimas.

Percorrendo o caminho da lama

Quando houve a tragédia de Brumadinho, iniciativas de vários setores da sociedade surgiram para ajudar. O grupo "Ciência por Brumadinho", por exemplo, usou o conhecimento de cientistas de dados, engenheiros, matemáticos e físicos para calcular onde estariam as vítimas.

Cientistas da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo usaram um algoritmo para encontrar a força de arrasto no rejeito, chegar à aceleração da lama e, a partir daí, estimar a distância percorrida pelas vítimas.

Bombeiros em Brumadinho tiveram ajuda da tecnologia - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
Bombeiros em Brumadinho tiveram ajuda da tecnologia
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Com isso, conseguiram definir 30 possíveis localizações para aqueles que estavam no refeitório no momento do rompimento da barragem.

O grupo Ciência por Brumadinho ainda conseguiu alimentar um programa com a localização das vítimas antes e depois do acidente e treinaram esse sistema para estimar a área onde os desaparecidos poderiam ser encontrados.

O abastecimento de informações desse programa era com base em dados fornecidos pelo Ministério Público de Minas Gerais e englobavam arquivos como mapas com a topografia anterior e posterior ao rompimento, informações sobre onde estavam os corpos já encontrados, a localização precisa dos prédios e as dimensões da mancha de inundação.

O cruzamento dessas informações foi aplicado e apresentou resultados que auxiliaram nas buscas.

Radar voador

Para encontrar os corpos em Brumadinho, voo com drones equipados com câmeras high-tech também foram usados na área.

Criado por Jorge Luis Porsani, professor do IAG-USP (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo), o drone mapeava o subsolo para encontrar composições corpóreas e era composto por um GPR (Radar de Penetração no Solo, em português), com emissão de ondas eletromagnéticas para obter imagens de alta resolução que mostravam o perfil do subsolo.

O GPR cortava o terreno como se fosse um bolo para captar uma imagem da lateral da fatia, que permitia analisar as camadas de recheio a fim de encontrar os corpos, algo usado para estudos arqueológicos.

O problema, nesse caso, é que o GPR não conseguiu diferenciar os corpos em relação à composição do solo em Brumadinho. A ideia, então, foi usar o drone para buscar por grandes estruturas metálicas, como carros e vans, que podiam abrigar vítimas.

Uso de IA

Outro grupo formado por cientistas, o SOS Brumadinho, criou um algoritmo de IA (Inteligência Artificial) que calculava com que força o fluído dos sedimentos arrastava as pessoas e a aceleração desse deslocamento para indicar o local aproximado onde elas poderiam estar.

Pesquisadores do Laboratório de Análise Massiva de Dados do ICMC-USP - Reinaldo Mizutani/ICMC-USP. - Reinaldo Mizutani/ICMC-USP.
Pesquisadores criaram algoritmo para ajudar nas buscas em Brumadinho
Imagem: Reinaldo Mizutani/ICMC-USP.

Sistemas que simulam deslocamento de fluído já existiam, mas caros e demorados, porque envolviam supercomputadores. Os cientistas conseguiram fazer a tecnologia a baixo custo.

O sistema indicou diversas posições onde os bombeiros não imaginavam que poderia haver corpos. O coronel Eduardo Ângelo chegou a dizer, à época, que o "modelo nos ajudou no planejamento das ações".

Sinal de celular

A última localização do sinal de celular também virou uma das estratégias para localizar os corpos. Foi o caso da família Taliberti, que assinou uma petição ingressada na Justiça junto com familiares de outras vítimas a fim de quebrar o sinal telemático dos aparelhos para auxiliar na localização dos corpos.

No caso dos Talibertis, o fornecimento dos dados aconteceu tarde demais e não ajudou muito. Os corpos foram encontrados um mês depois.

A Justiça chegou a conceder o pedido dos familiares e obrigou as empresas a fornecerem os dados, porém, na ocasião, a Defesa Civil não soube precisar se as informações ajudariam nos resgates em razão da amplitude dos dados fornecidos e por causa da durabilidade dos aparelhos em meio à lama.