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Ele deixou a sucata para virar "tech influencer" e top do LinkedIn

João Gabriel Oliveira Silva é uma das Top Voices do LinkedIn - Arquivo pessoal
João Gabriel Oliveira Silva é uma das Top Voices do LinkedIn Imagem: Arquivo pessoal

Fernando Barros

Colaboração para Tilt

09/03/2021 04h00

Foi compartilhando a sua paixão por tecnologia, dicas de cursos na área de programação e os desafios do dia a dia profissional que João Gabriel Oliveira Silva, 36, garantiu seu lugar na lista de nomes mais influentes do LinkedIn. Desde 2015, a rede social elege anualmente 25 perfis como LinkedIn Top Voices, e o de João foi um dos escolhidos em 2020.

O reconhecimento foi uma grande surpresa para o desenvolvedor de software. Isso porque, inicialmente, João usava o LinkedIn somente para buscar vagas e acompanhar novidades sobre o mercado de trabalho. Sua estreia na rede como produtor de conteúdo aconteceu com uma publicação na plataforma que bateu a marca de 1,5 milhão de visualizações.

Tudo começou quando João se sentiu incomodado ao ler um post no LinkedIn que dizia que os programadores eram pessoas com privilégios. Em resposta, o profissional fez um texto contando a sua história e dando argumentos contrários à afirmação. Era o ponto de partida para uma presença mais ativa na rede.

"No LinkedIn, às vezes parece que tudo é lindo e fácil. Eu tento dar um contraponto, mostrar a realidade e como as coisas funcionam na prática", diz.

Daí em diante, o "matuto programador", como ele mesmo se apresenta por lá, começou a postar e interagir todos os dias, driblando seu jeito tímido e introspectivo. Resultado: hoje soma mais de 23,2 mil seguidores, a maioria deles profissionais de tecnologia da informação.

Com o título de uma das vozes mais relevantes da rede agora, João espera abrir caminho para que outros profissionais de tecnologia sejam reconhecidos também. "Seria bacana se numa próxima edição do LinkedIn Top Voices tivéssemos, por exemplo, uma mulher desenvolvedora", ressalta.

Um conselho que mudou sua vida

Natural de Uibaí, no sertão da Bahia, João se mudou para São Paulo com a família quando ainda era adolescente. Na capital paulista, trabalhou primeiramente num lava-rápido, ganhando R$ 70 quinzenalmente, e depois foi ajudar o pai a vender churrasco na rua. Após o falecimento do pai, começou a trabalhar como prensador de sucata em uma empresa, onde chegava a passar 14 horas por dia, para garantir o sustento da família.

Aos 23 anos, numa conversa informal, recebeu um conselho que selaria o seu destino, lembra. "Um amigo trabalhava na época com tecnologia e me incentivou a entrar nessa área. Fui pesquisar sobre, entender melhor e decidi cursar Sistemas da Informação."

Com a grana curta, pagou a matrícula e ficou o restante do ano com as mensalidades pendentes. Conciliando o trabalho na prensa de sucata durante o dia com os estudos à noite, no ano seguinte, fez um acordo para pagar o valor da rematrícula e continuar estudando.

As dificuldades, no entanto, não paravam por aí. Como sua faculdade ficava em Santo André, cidade vizinha a São Paulo, ele não tinha dinheiro para pagar todas as passagens necessárias para o deslocamento, ia de ônibus até uma parte do caminho e a outra fazia a pé. Na volta, a mesma coisa.

"Tinha vezes que chegava em casa encharcado de chuva, com o tênis furado, quase de madrugada. Chorava muito e pensava em desistir", recorda João.

Mas, como escreveu o escritor Euclides da Cunha, o sertanejo é antes de tudo um forte, e a resiliência de João Gabriel ajudou a honrar essa premissa.

Um Chevette por um notebook

No segundo ano do curso, João conseguiu um estágio numa multinacional de tecnologia com uma bolsa de R$ 400. Com ela, pode sair do trabalho como prensador de sucata. Três meses depois, foi efetivado e passou a receber R$ 1.000. Com o novo salário, conseguiu juntar dinheiro e comprar um carro para poder ir para a faculdade. Mas a animação com o novo veículo não durou muito.

Sem computador em casa, João fazia todas as atividades e trabalhos do curso na própria faculdade. Chegava a ir aos finais de semana para o campus para poder usar os laboratórios. Um dia, um colega comentou que tinha um notebook ainda na caixa para vender e ele não pensou duas vezes: ofereceu o Chevette em troca. "Ainda ganhei um dinheiro a mais da diferença de valor e usei para quitar algumas mensalidades da faculdade", lembra.

Desenvolvedor papa-cursos

Hoje, com mais de 10 anos de carreira como desenvolvedor de software, João olha para sua trajetória com orgulho. Na bagagem, passagens pelo setor bancário, órgãos do governo, multinacionais como a Stefanini, Accenture, Altran e a unicórnio brasileira Loggi.

Pavimentando esse percurso, João aponta a importância dos estudos. Ele afirma não cansar de ler livros, artigos científicos e fazer cursos, os seus queridinhos quando o assunto é ganhar conhecimento. Do big data à computação em nuvem. Da linguagem java até o blockchain, João é um papa-cursos assumido.

"Só nos últimos dois anos, desembolsei 15 mil em cursos. Faço uma média de dois a três por mês e é um excelente investimento. Todos eles me ajudaram a resolver um problema, encontrar uma solução e evoluir minha carreira", afirma.

Tecnologia como transformação

Tendo o seu destino transformado pela carreira na área tecnológica, João quer ver sua história repetida por aí. "A tecnologia mudou a minha vida e me deu condições de dar a meus filhos o que eu não tive. Quero que outras pessoas tenham essa oportunidade também".

Entre os planos para o futuro, está a abertura de uma empresa própria para atender projetos de TI mais simples e que demandam menos tempo de execução. Dessa forma, ele espera poder empregar profissionais em início de carreira.

Outro sonho é a criação de uma escola de programação, em parceria com alguma organização ou empresa, para preparar pessoas para o mercado de TI. "Há um gap muito grande entre as oportunidades e os profissionais disponíveis. A ideia seria buscar preencher essa lacuna", diz.