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Ricardo Feltrin

OPINIÃO

JP News chega a 2023 em pedaços; dá para reconstruir?

Futuro sombrio para o Grupo JP de Tutinha - Reprodução
Futuro sombrio para o Grupo JP de Tutinha Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

01/01/2023 04h05

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Há pouco mais de um ano nascia a JP News, emissora de TV derivada de uma das rádios mais importantes, tradicionais e influentes do Brasil por quase 70 anos.

Seu dono, Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, mais conhecido como Tutinha, estreou a JP News com uma nova linha editorial, pendurada no discurso extremista de Jair Bolsonaro (e seus filhos), a quem apoiou com afinco desde a campanha de 2018.

O notável é que o Grupo Jovem Pan sempre foi voltado para as "hard news", o entretenimento ("Pânico") e uma base eclética de comentaristas políticos. A FM desfiava também sucessos do pop comuns às rádios comerciais.

A rádio FM foi copiada, "chupinhada" e seguida por muitas outras rádios país afora. Até as suas vinhetas eram imitadas.

Também sempre chamou atenção a capilaridade do grupo. Em qualquer grande cidade em que o brasileiro chegava, lá estava a famosa "JP FM 100,9 MHz" para lhe fazer companhia.

Ou a JP AM, uma grande prestadora de serviços para o cidadão, especialmente o paulistano, que sempre se dedicou à cobertura de acidentes, tragédias, trânsito, chuvas e um pensamento crítico contra qualquer governante.

A guinada

Curiosamente, o empresário Tutinha ou seus veículos jamais demonstraram qualquer paixão ou mesmo simpatia pelo fascismo. Tampouco pareciam ter tanto ódio pelo petismo ou pela esquerda em geral.

A impressão é que o empresário foi até o quadro de energia, em 2018, e virou a "chave": de uma certa neutralidade e equilíbrio para uma militância abjeta.

Pessoalmente, como jornalista, acho que seu quadro de comentaristas foi a maior excrescência que a mídia brasileira de grande porte já teve.

O discurso de perversidade, desprezo pela liberdade e democracia; a falta de civilidade, ignorância e distribuição em massa de fake news se tornaram, pouco a pouco, a linha editorial da casa.

Creio que nem na ditadura militar jornalistas de um conglomerado de mídia foram tão serviçais, bajuladores e sabujos de um governo.

Tutinha assinou embaixo. E, em cinco anos, implodiu o edifício midiático de seu pai, seu Tuta, 91 anos, e de si próprio.

Almoço grátis? Não temos

É óbvio que tudo isso não foi causado por nenhuma epifania do empresário, mas de um puro e cristalino interesse econômico. Talvez também por uma ideologia enrustida que ele escondeu de seu ouvinte telespectador.

A ascensão de Bolsonaro fez Tutinha alimentar o sonho (ou pesadelo) de tornar seu grupo maior ainda. Por pouco não conseguiu.

Quase ninguém lembra que, se a JP News tivesse levado a frequência da ex-MTV, que é uma TV aberta (perdeu), e não na TV por assinatura, ela não estaria hoje rondando o traço de audiência (0,1).

Já teria esmagado a RedeTV. Quem sabe se não teria até fungado no cangote da Band?

Aposta perdida

O resumo é que Tutinha apostou todas as fichas em Jair Bolsonaro e seu governo maledicente, perverso e desprezível.

Assim como o "mito", ele perdeu a aposta. Tutinha perdeu o que tinha de mais valioso: um jornalismo equilibrado, preocupado com o cidadão, diversificado, e que atingia todas as classes sociais.

A derrocada e a derrota de Bolsonaro levaram o Grupo JP para o mesmo lugar: o fundo do poço e da irrelevância.

Os patrocinadores da TV agora estão fugindo um após outro. Afinal, em pleno governo de esquerda que ora se instala, quem será louco de querer anunciar num veículo com as digitais fascistas que estiveram lá nos últimos cinco anos?

E o dinheiro que o governo Bolsonaro vinha depositando lá nos últimos meses também já era.

Agora é tarde para a emissora fazer discursos e editoriais contra o golpe e a favor da democracia. Ninguém acredita mais em nada do que sair daquele lugar.

No final da história, a JP News acabou como o vilão dos filmes, que fica sem nada. Ela ganhou a ira e o desprezo tanto da direita que bajulou tão ardentemente, como manteve o da esquerda, que atacou de forma irracional e doentia.

O futuro não só da JP News, mas do Grupo JP, é incerto e não sabido. A única certeza é que sete décadas de um império midiático foram atiradas na lama. Sair daí vai precisar de muita, MUITA corda.

No Grupo Jovem Pan, hoje, só podemos sentir muito e prestar nossa solidariedade aos milhares de empregados decentes e democratas, que o grupo mantém direta ou indiretamente.

Eles não mereciam isso.

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