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'Caso Celso Daniel' tem tudo para se tornar mais um true crime de sucesso

O ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel - Diário do Grande ABC
O ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel Imagem: Diário do Grande ABC

Fernanda Talarico

De Splash, em São Paulo

29/01/2022 04h00

A produção de títulos baseados em crimes reais cresce cada dia mais, seja em filmes, séries ou podcasts. Entre os grandes sucessos que foram lançados recentemente, podemos citar "A Menina que Matou os Pais" e "O Menino que Matou Meus Pais", filmes ficcionais que abordam o rumoroso crime da família Von Richthofen, e o podcast e documentário "O Caso Evandro", sobre a morte de uma criança em Guaratuba (PR), nos anos 1990. Agora, em janeiro deste ano, uma nova série documental surge para aumentar o peso do gênero true crime: "O Caso Celso Daniel", com os dois primeiros episódios já disponíveis no Globoplay.

Ao longo dos oito episódios, a produção se propõe a mostrar as diversas contradições, teorias e acontecimentos que foram surgindo no decorrer das investigações de um dos crimes que mais chocou o país. De maneira didática e eficiente, o início da série explica o básico do que aconteceu, para situar o espectador que não sabe nada sobre o caso, e dá as informações necessárias para aqueles que não se lembram bem refrescarem a memória.

A narrativa inicial é isenta de conspirações e hipóteses, apenas explica o que é preciso para prender a atenção do público: no dia 18 de janeiro de 2002, o então prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), foi sequestrado ao deixar o restarurante Rubaiyat, na zona sul de São Paulo. Ele estava acompanhado do empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, e foi perseguido por um carro e levado pelos criminosos. Dois dias depois, o político petista de 50 anos foi encontrado morto com marcas de tortura e tiros, em uma estrada em Juquitiba (SP).

Celso Daniel - Acervo Celso Daniel - Acervo Celso Daniel
Celso Daniel foi prefeito de Santo André até 2002
Imagem: Acervo Celso Daniel

Em abril do mesmo ano, a polícia concluiu que se tratava de um crime comum — sem motivações políticas — executado por uma quadrilha da favela Pantanal, zona sul de São Paulo.

O título vai além de explorar apenas a morte de uma figura pública e mostra a dor e o sofrimento daqueles que conviviam com Celso Daniel. Por meio de entrevistas, depoimentos e imagens de arquivos, vamos conhecendo uma pessoa que, ao que tudo indica, era querida não apenas pelos amigos, mas também pelos seus eleitores.

Sutilmente, a série documental começa a dar algumas pistas ao espectador de que, talvez, as coisas não tenham acontecido da maneira oficial. Algumas desconfianças começam a surgir, como hipóteses de que a morte de Celso Daniel tenha acontecido como queima de arquivo para acobertar um esquema de corrupção do qual o político era contra. As questões são levantadas quando certos fatos são comentados — como ele ter sido encontrado com uma roupa que pertencia a ele, mas com a qual não saiu de casa naquele dia — ou quando as desavenças entre a namorada e a família do político são citadas.

Com os fatos apresentados, "O Caso Celso Daniel" começa a destrinchar os detalhes da investigação e, assim como aconteceu em "O Caso Evandro", a narrativa induz o espectador a certas conclusões, para logo depois mostrar que elas estão erradas e há mais fatos e informações a serem considerados.

A todo momento, ao longo dos cinco primeiros episódios dos quais Splash já assistiu, somos levados a mudar de ideia e a criar novas teorias. Um exemplo disso é o possível envolvimento de Sombra no sequestro e assassinato: no começo, acreditamos que ele também é uma vítima, mas, com alguns pormenores envolvendo o carro que ele dirigia, começam a apontá-lo como um suspeito. Logo depois, um perito diz que a situação relatada pelo empresário é, sim, cabível.

O empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, em foto de arquivo - Luiz Carlos Murauskas/Folhapress - Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
O empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, em foto de arquivo.
Imagem: Luiz Carlos Murauskas/Folhapress

A dinamicidade da obra é um dos pontos altos do título e é uma boa opção até mesmo para aqueles que não entendem ou não se importam tanto com política. Aqui, não se trata apenas de um caso político, é um caso de polícia, com diversas reviravoltas e envolvidos.

Outro mérito da produção é a quantidade de nomes importantes que aceitaram aparecer, como José Dirceu, Fernando Henrique Cardoso, Gilberto Carvalho, Mara Gabrilli, Eduardo Suplicy e Miriam Belchior. Além disso, os produtores tiveram acesso a importantes registros do político, com imagens de arquivo tanto pessoal quanto da imprensa.

No entanto, como não há um narrador, animações e reconstituições com atores são usadas para preencher algumas lacunas na história, e acabam fugindo do tom da série. Os recursos destoam do que é apresentado até então e parecem uma escolha questionável para tentar ilustrar o que já está sendo contado na série por meio dos depoimentos dos entrevistados.

"O Caso Celso Daniel" chega ao Globoplay no ano em que o assassinato completa 20 anos — e também em um ano eleitoral. Com isso, é possível imaginar que será um dos títulos de true crime que causará bastante barulho, mesmo que não se proponha a trazer respostas, e sim reviver importantes questões.