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José de Abreu sobre volta à Globo: 'Não me vejo parando de fazer novelas'

José de Abreu está de volta à Globo após um período morando na Nova Zelândia - Reprodução / Internet
José de Abreu está de volta à Globo após um período morando na Nova Zelândia Imagem: Reprodução / Internet

Colunista do UOL

07/03/2021 12h07

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Após um ano morando na Nova Zelândia, José de Abreu está de volta ao Brasil. O ator desembarcou no país, no auge da pandemia, para assumir o personagem que era destinado a Reginaldo Faria em "Um Lugar ao Sol", próxima novela das nove da Globo. "A porrada foi forte. Já começou quando cheguei em São Paulo, no aeroporto de Guarulhos, com a falta de respeito ao distanciamento, pessoas sentando nas cadeiras com sinalização para não sentar, máscara abaixada", conta o ator, de 74 anos, que passará os próximos tempos isolado em um hotel.

Na novela escrita por Licia Manzo, Abreu interpretará Santiago, um milionário apaixonado por literatura, pai das personagens de Alinne Moraes e Andréa Beltrão. Dono de uma rede de supermercados, ele se envolverá com uma personal trainer vivida por Fernanda de Freitas. Depois de não ter renovado contrato no ano passado, o ator agora volta à Globo em novas bases de trabalho e já iniciou suas gravações dias antes de a emissora decidir adiar a estreia por causa do aumento de casos do coronavírus.

Ao mesmo tempo em que trabalha em sua volta às novelas, o artista prepara também o lançamento de sua autobiografia, escrita enquanto esteve fora. Dividido em dois volumes, o projeto de chamará "Abreugrafia" e será lançado em maio, mês em que completa 75 anos. José conversou com a coluna. Leia a seguir a primeira entrevista do ator após o retorno ao Brasil e à Globo.

O que te fez querer voltar para o Brasil?
Eu estava me sentindo muito inútil nos últimos tempos. Comecei a trabalhar aos 14 anos, arrumei emprego de office boy vindo de Santa Rita do Passa Quatro, então estou acostumado a trabalhar desde muito cedo. Depois de "A Dona do Pedaço", demos uma viajada pela Europa e fomos à Nova Zelândia estudar inglês, mas a pandemia nos pegou enquanto estávamos lá. O governo renovou nosso visto automaticamente e fomos ficando, mas eu estava sentindo falta da minha rotina aqui.

O que você fez durante esse período na Nova Zelândia?
Depois de uns seis, sete meses, começou a dar um tédio absoluto. Levei um susto quando a primeira-ministra de lá disse que eu era grupo de risco. Apesar de eu ter 74 anos, tenho uma saúde boa, faço check-up todo ano, apronto, vou em festa. Fiquei pra baixo, bateu uma deprêzinha. Comecei a cozinhar, peguei gosto pela cozinha. Aluguei um estúdio lá para gravar minha autobiografia, que sairá em dois volumes. Passei um mês gravando meu audiobook e depois fiquei um mês sem fazer nada. Morava numa casa de frente para uma baía. Via a maré subir e a descer.

Não conseguiu se acostumar à vida do primeiro mundo?
Não, eu não estava acostumado com a vida de vagabundo. (risos) Já morei em outros países. Morei em Paris, na Grécia, passei temporadas longas por lá. Mas a Nova Zelândia é um país novo mundo, com menos de 200 anos, e vida cultural muito diferente. O lazer lá é muito para esporte ao ar livre, muito veleiro. De cada quatro casas tem um veleiro. E eu sou avesso a esse tipo de coisa. Mas me ocupava, fazia de tudo em casa: lavava roupa, privada. Além disso, minha família inteira está no Brasil, meus quatro filhos e quatro netos. Nunca, em 74 anos, eu tinha passado um ano e meio fora do Brasil, longe de todos. Nem em Paris, onde morei, eu fiquei tanto tempo, foram dez meses. Fez falta.

Foi difícil sair da Globo?
Meu último contrato havia durado 22 anos e costumava ser renovado automaticamente. Mas entendi que era uma nova realidade, ele têm encerrado compromissos com pessoas de salários muito altos, por exemplo.

Seu salário era alto?
Sempre achei que meu salário era baixo. Nas renovações eu sempre pedia 20% de aumento, me davam 10%. Mas eu vivia bem. Não dá para dizer se meu salário era alto comparado ao de outros atores porque a gente não sabe quanto os outros ganham. Mas a Globo foi muito legal comigo. No fim do contrato me deram uma rescisão muito boa, foram extremamente corretos. Com o dinheiro que ganhei dava para viver de maneira confortável por um ano no exterior.

Considera que as portas ficaram abertas na época?
Me garantiram que eu seria escalado da mesma maneira que antes. Eu era muito escalado. Antes de sair da emissora eu fiz duas novelas das nove, com três meses parado entre elas ("Segundo Sol" e "A Dona do Pedaço").

"Nunca me ofereceram personagens ruins".

Como se deu o retorno à Globo?
Já fiz muitas novelas com o Ricardo Waddington. Foi ele quem me deu a oportunidade de dirigir "O Outro". Ele que me indicou para codirigir "O Primo Basílio". Fiz "Transas e Caretas" no começo da carreira dele. Foi ele quem me deu o papel em "Avenida Brasil", dirigida pelo José Villamarim, que também é outro amigo. Um dia eu acordei meio deprê e passei um torpedo para os dois. A mensagem dizia o seguinte: "Estou com síndrome de abstinência de estúdio, nunca passei um ano sem representar". Eles me responderam dizendo: "Fica tranquilo, que a síndrome já vai passar". Na mesmo hora pensei em "Pantanal", porque há 20 anos tento trabalhar com o Rogério Gomes e sempre que ele me escala me colocam em alguma novela que vem antes. Pensei que podia fazer o Velho do Rio, mas achei parecido com o Nilo, de "Avenida Brasil". Mas imaginei que haveria outros coronéis. Esperei e um dia o Mauricio Farias me ligou e me contou toda a história dessa novela "Um Lugar ao Sol".

E o que achou da novela?
É curioso que antes de viajar a gente se encontrou no Projac e ele me falou que o personagem tinha sido dado pro Reginaldo Faria. Se eu fosse fazer a novela naquela época eu só teria um mês de férias. Daí preferi viajar e descansar um pouco. Quando rolou esse convite, eu li a sinopse, começamos a negociar e vi que não haveria problema nenhum. O que eu pretendia estava dentro do que podiam pagar. Me mandaram 30 capítulos e eu me encantei de cara. E que texto incrível.

O que acha do personagem?
Eu fiquei apaixonado. Ele é melhor amigo do Cauã Reymond, um milionário que adora literatura e música erudita e faz parte do núcleo central da novela. Um intelectual que só não virou escritor porque transformou o armazém do pai em uma das maiores redes de supermercado do Brasil. Ele tem uma puta biblioteca, adora Machado de Assis.

"Mesmo nas novelas, é muito difícil achar um milionário justo, íntegro".

Como foi esse retorno?
A Globo me contratou como morador de Paris, onde eu tenho apartamento. Me dá hotel, estadia e conseguiu a passagem da Nova Zelândia para o Brasil. Foi uma viagem de 40 horas com jet leg de 16 horas ao contrário. Cheguei numa quarta-feira, 11 da noite. Na quinta, às 10 da manhã, eu tinha teste de figurino e às 14 horas um teste de maquiagem. Na sexta eu já estava gravando. Tiveram de jogar as cenas do Reginaldo Faria fora e começar de novo.

Achou muito diferente gravar em tempos de pandemia?
É muito esquisito. Você não vê a cara de ninguém da técnica. Reconhecia as pessoas pelo cocoruto, pelo olho. É muito estranho não ver ninguém sorrir ou ficar com cara de bravo.

Agora que você começou a gravar a novela foi novamente adiada por causa da pandemia. O que achou disso?
Já era algo que vinha sendo falado nos bastidores como provável. A pior coisa que poderia acontecer seria estrear a novela e parar um mês depois por causa da situação do país, como aconteceu antes. Então dava para contar com essa possibilidade. Em breve saberemos como tudo ficará, se seguiremos gravando.

E o que achou do Brasil ao desembarcar aqui?
A porrada foi forte. Já começou em São Paulo com a falta de respeito ao distanciamento. Eu cheguei em Guarulhos usando duas máscaras e já vi pessoas sentando sem máscara nas cadeiras vermelhas, onde não podiam sentar. Ninguém respeitava as marcas no chão. Depois de vir da Nova Zelândia, onde respeitam normas, é difícil entender.

"A situação no Brasil está muito pior do que imaginei. O Brasil não sai de mim. Uma coisa é saber através de amigos e TV, outra coisa é ver com os próprios olhos".

Está pronto para o isolamento?
Na Globo eles me falaram que eu tenho que ficar trancado no quarto de hotel. Por ser de esquerda, eu já saía muito pouco aqui no Brasil, porque volta e meia vinha alguém tentando me agredir na minha mesa. Estamos de quarentena, minha esposa e eu. Tenho muito texto para decorar que não vi minha família ainda. A gente sabe que está perto, mas ainda se vê só virtualmente. Sou grupo de risco, ainda não é a hora de se encontrar. Me vacino no sábado que vem. Já melhora bastante, mas meu médico me falou que tem que ter muito cuidado, mesmo com vacina. Não adianta eu me isolar no exterior se a minha família está aqui, o sofrimento é praticamente o mesmo. Tenho medo de meus filhos e netos pegarem. Se acontecer comigo, menos mal. Sempre gastei tudo o que ganhei. Viajo, tomo vinho bom, bebo minha cerveja. Não quero ter eu quero ser.

E fez trabalhos paralelos nesse tempo fora da Globo?
Escrevi minha biografia. São 900 páginas divididas em dois volumes. Vai se chamar "Abreugrafia", sugestão de um seguidor no Twitter. O nome era utilizado para tirar pequenas chapas radiográficas dos pulmões e faz sentido com meu sobrenome. Lanço em maio, quando faço 75 anos. Também fui dirigido pelo Roberto Nascimento no cinema em três curtas quando estava na Nova Zelândia, em um deles faço o primeiro personagem gay da minha vida. Também haverá um documentário chamado "Persona Non Grata" sobre minha vida. E fui homenageado em uma universidade em Auckland.

Está feliz por voltar a atuar?
Não me vejo parando de fazer novela. Eu preciso atuar. Atuar é como respirar. Não adianta estar lá sem covid, se não consigo respirar. Ficar sem atuar é como se eu estivesse com covid.