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SPFW N51: celebração afro-indígena e LGBT foram destaques do 4º dia

Confira o resumo do 4º dia do São Paulo Fashion Week N51 - Ítalo Gaspar e Allan Hiagon
Confira o resumo do 4º dia do São Paulo Fashion Week N51 Imagem: Ítalo Gaspar e Allan Hiagon

De Nossa

26/06/2021 23h03

O quarto dia do São Paulo Fashion Week foi de celebrações. A LED abriu a sua casa para uma festinha cheia de afetividade LGBT na exibição do vídeo musical neste sábado (26).

Por sua vez, Isaac Silva exaltou a herança histórica afro-indígena em uma espécie de manifesto contra a PL 490, que está em votação na Câmara dos Deputados e que altera a demarcação de terras indígenas. Já Carol Bassi, estreante na semana de moda, fez uma homenagem ao Rio de Janeiro com clipe estrelado e cantado pela modelo Barbara Fialho.

Rocio Canvas

A marca, conhecida pelo seu minimalismo arquitetônico, estreia na SPFW com uma coleção que procura, mais do que apenas ser bela, trazer soluções práticas para o dia a dia. Muito semelhante ao papel da arquitetura. "A gente trabalhou com peças mais adaptáveis. As faixas que usamos, mais alongadas, tem um uso prático, por exemplo", comentou o estilista Diego Malicheski em entrevista após a exibição do vídeo da marca.

"Não tinha como a gente se inspirar se não fosse para falar sobre deslocamento e respiro", complementou o artista. Este espaço para dar vazão está presente nas blusas assimétricas, vestidos com recortes geométricos no colo"Tudo para dar espaço para o respiro. Óculos máscara e mules, com ponta diferenciada, complementam a coleção.

LED

A LED abriu a sua casa e promoveu uma aglomeração — seguindo todos os protocolos de segurança — para mostrar o que mais sentimos falta: uma boa festa na sala de casa, cercada por seus amigos. Assim, em vez de um fashion film, a marca apresentou um vídeo musical com a participação dos artistas Alice Caymmi, Davi Sabbag, Bibi Caetano e Dani Vieira.

Esse vídeo é o meu desejo para esse momento, porque estamos há muito tempo nessa situação".
Célio Dias

Nas roupas, a LED traduziu o que é casa se inspirando em objetos domésticos para criar alfaiatarias que podem ser pijamas e vice-versa, vestidos de crochê vazados e com franjas, que balançam como um abajur dos anos 1980. As estampas criadas em parceria com João Vitor combinam, também, com o papel de parede de uma típica casa brasileira. São roupas para ficar em casa, porém dançando e curtindo com os amigos.

Sankofa: TA Studios

A estilista Gi Caldas usou os signos Adinkras, símbolos que representam conceitos e aforismos da cultura Afro Acã, do Gana, para criar uma coleção colorida, cheias de simbolismos e agênero. "Queria mostrar que a roupa pode ser um amuleto, que vai muito além de arquetipar qual seu status social ou identidade de gênero", comentou a artista.

Para fugir dos arquétipos, Gi Caldas mostra uma dança de caboclos, Erês, Pomba-Gira e Zé Pernambucano, que se vestem de cores do nascer do Sol, com looks laranjas, com branco, com modelagem que dá a noção de armaduras.

A camisaria é uma constante dos visuais e dois adinkras se tornaram estampa: o Akoma Ntoaso (a cruz do coração), que significa tolerância, paciência, união; e o Bese Saka (a flor), que inspira poder, riqueza e abundância. Além de franjas, o couro ecológico é o material usado nas aplicações dos adinkras em conjuntos de linho.

Sankofa: Silverio

O estilista Rafael Silvério decidiu fazer um estudo sobre a escuridão em sua estreia no SPFW. "Muito se fala sobre como estamos imersos na escuridão nesse momento, essa ideia opaca que permite que nós projetamos muitas coisas nela", contou o artista em entrevista.

Não tem a ver com algo maligno, a ideia que relaciona o escuro à negatividade é o que leva ao racismo".

A marca, que se propõe a reinventar a ideia sobre o que é belo, usa essas concepções como ponto de partida para criar camadas em looks total black. São bombers combinadas com shorts e calças amplas, que podem ser vestidos por homens ou mulheres. A ausência da modelagem se perde na profusão do preto, mas acaba trazendo boas surpresas como espécies de caudas que nada mais eram do que capas de ternos.

Freiheit

A marca invadiu a Vila Itororó, palacete dos anos 1920 localizado no centro de São Paulo (SP) e que está em processo de restauração, para mostrar uma coleção repleta de formas orgânicas e geométricas, num contraponto entre o minimalismo, inspirado no movimento de arte suprematismo russo, e a profusão de elementos, cuja referência é o punk rock.

As formas como o quadrado e o círculo vieram no shape das peças, que têm um corte muito limpo, rigoroso. E para dar uma sujada, me inspirei no punk para criar as estampas".
Márcio Mota

Assim, foram desfilados casacos quadrados, blusas com caimento reto, tricôs, corta-ventos e capas de chuva. A modelagem ampla surge para abrigar corpos diversos. A paleta começa no preto e branco, mas logo abre-se para o dourado, rosas e cinzas. Os materiais usados pelo Mota foram, além da sarja e náilon, já presentes em outros trabalhos da Freiheit, o couro sintético, o algodão e a flanela.

Neriage

No fashion film "Sonar", a Neriage preferiu mostrar sentimentos em vez de roupas. "A gente quis falar muito sobre intimidade e sobre como como vivemos a liberdade, mesmo dentro da gente", contou a estilista Rafaella Caniello. Para isso, se inspirou na obra "Sentimental Journey", do fotógrafo Nobuyoshi Araki.

"Tem uma foto da mulher dele deitada em um velho barco que me tocou muito. Quando vi aquela foto, pensei que era aquilo que eu sentia e queria mostrar. É uma sensação de liberdade e pertencimento", continuou a artista.

A gente quis mostrar que a moda vai muito além da roupa."

No lookbook, por sua vez, fica claro que Neriage não quis virar as costas para a sua história, mas reimaginar peças clássicas em formas e cores que harmonizam as ideias de quebra e fluidez. Os plissados continuam fortes e se abrem, como leques. As estampas, por sua vez, são imagens estouradas de obras de Gabriella Garcia. Costuras cruzadas, botões e aviamentos antigos também foram usados para resgatar a essência da marca, que, no fashion film, aparece em cortes fechados, no detalhe.

Misci

O estilista Airon Martin voltou para a beira da BR 63, no Mato Grosso, onde foi criado, para matar saudades no fashion film de sua nova coleção, "Boleia". "Havia um fluxo muito grande de caminhões e minha família tinha um bar na beira da estrada", contou o artista em entrevista.

"Com o tempo, isso se materializou como uma saudade da minha casa, da minha família que não vejo há um ano e meio. Precisava um pouco desse aconchego da minha casa. E fala também muito sobre o sonho de brasileiros que não são de São Paulo e que vieram para cá atrás disso. O sonho vem de caminhão mesmo."

A roupa do caminhoneiro que vive no imaginário popular se transformou em moda. Conjuntos de linho com um corte anos 1970, camisas com golas amplas e volumosas, listras em tingimento natural surgem em roupas masculinas e femininas. Os camisões com bolsos frontais são, ainda, uma referência à relação de mãe de Airon com o vestuário e resgata o costume de muitas mulheres de guardar o dinheiro dentro do sutiã.

Carol Bassi

A marca estreante no São Paulo Fashion Week faz uma celebração ao Rio de Janeiro no video musical "Um Beijo". "Todo brasileiro é um pouco carioca, porque o Rio é um amor. A luz é linda, é uma cidade que inspira em qualquer área. Ela nos fez fazer uma coleção colorida, para uma mulher moderna que quer buscar um pouco de alegria", comentou Carol Bassi, que fez a coleção em parceria com o stylist Marco Gurgel.

Para contar essa história, Gurgel disse que era importante que o vídeo fosse um musical. "A música nos envolve, nos emociona", falou o stylist. Assim, eles convidaram a modelo Barbara Fialho para cantar a trilha e estrelar o fashion film que apresentou vestidos cheios de babados, com mangas bufantes e ombros de fora, em comprimento minis e longos, e em uma paleta de cores sólidas, passando pelo azul, amarelo, verde, laranja e branco.

Isaac Silva

O estilista cujo foco é o corpo da mulher negra decidiu celebrar as heranças históricas afro-indígenas na coleção "Axé, Boca da Mata!", como uma espécie de manifesto contra a PL 490, que propõe mudança na demarcação de terras indígenas. "É um momento muito delicado, então peço que todo mundo siga as lideranças indígenas, saibam o que está acontecendo. Espero que isso sensibilize as pessoas e que elas estejam do lado dos nossos parentes indígenas", falou Isaac Silva em entrevista. "Precisamos sempre exaltar a nossa cultura afro, a nossa cultura indígena, porque queremos viver nesse momento"

Com a linha de sandálias feita em colaboração com a Havaianas, a natureza é o ponto de partida da coleção que contrapõem dois elementos: a capulana africana, tecido tradicionalmente usado em Moçambique, e folhas e outros elementos da floresta foram as referências para o grafismos das peças. Miçangas surgem tanto nas estampas de conjuntos de linho, como em brincos que simulam penas de acrílico.

O vermelho e o amarelo aparece em roupas de street wear, enquanto o preto e branco, paleta emblemática de Isaac Silva, surge no Samakaka, o tecido africano conhecido por sua geometria contínua, infinita.