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A moda vai priorizar o conforto ou a beleza no futuro pós-pandemia?

Desfile de alta-costura de Viktor & Rolf para a coleção outono/inverno 2018/2019 - Getty Images
Desfile de alta-costura de Viktor & Rolf para a coleção outono/inverno 2018/2019 Imagem: Getty Images

Gustavo Frank

De Nossa

20/05/2020 04h00

O coronavírus está transformando a forma com que a moda é tratada ao redor do mundo. Enquanto arrumar-se para ficar em casa é uma das soluções, para que muitos lidem melhor com o tempo confinado, desfiles foram adiados ou até mesmo cancelados.

Com isso, uma pergunta paira no ar: o que as grifes farão com todo o luxo e exclusividade que prometem aos seus clientes?

Enquanto as lojas de departamento hoje apostam na venda de roupas para "moldar seu estilo mesmo dentro de casa", as grifes se curvam a uma tendência parecida, colocando suas personalidades e modelos vestindo roupas que, pelo menos aparentam, servem conforto.

Um exemplo disso é a mais recente campanha feita pela Jacquemus. Os ensaios da grife, que se define como criadora de peças sobre "rolar na grama e não clubbing", foram feitos via FaceTime e trazem nomes como a top model Bella Hadid e a atriz Barbie Ferreira ("Euphoria") com as famosas bolsas e chapéus da marca dentro de casa.

Sem sombra de dúvidas, esses acessórios serviriam muito bem para uma tarde ensolarada na praia ou no campo, como a Jacquemus propõe. Ainda além, se distanciam cada vez mais dos jeans rígidos que limitam as pernas ou dos sapatos de salto alto que, por mais elegante que sejam, não são as peças mais cômodas.

Por meio das redes sociais, as grifes agora apelam para o que parece confortável — e não só o bonito. Felizmente, temos Donatella Versace de pantufas no sofá da sua casa para comprovar isso.

E Anna Wintour, icônica editora-chefe da Vogue norte-americana, de suéter de lã e calça esportiva no home office: "Não há nada como estar em casa para um verdadeiro conforto", como ela mesma legendou.

E o que seriam das grifes sem os modelos? Kendall Jenner e Gigi Hadid, consideradas as profissionais mais influentes do setor em 2019, compartilham seus registros fashion no Instagram, para seus milhões de seguidores, na mesma proposta. Em suas mais recentes publicações, temos lingeries e moletons.

O que a história diz?

"Moda é business", reforça João Braga, professor de História da Moda, de faculdades como a FAAP e a Santa Marcelina. A mudança, segundo ele, é inevitável. Assim aconteceu após as guerras mundiais e, ainda mais recentemente, no atentado do 11 de setembro, que resgatou o romantismo na moda com a renda, por exemplo.

"Existe um outro fundamento da própria história: épocas de excesso são prenúncios de decadência", diz ele a Nossa, reforçando o retorno do slow fashion e do artesanal. "A história da moda sempre trouxe essa referência. A pandemia está dando uma chacoalhada para uma nova aceitação. Em um primeiro momento, as marcas devem buscar conforto e praticidade, mesmo que depois disso voltem ao normal".

É agressivo agora mostrar o luxo, riqueza e sofisticação, uma vez que o mundo está passando por uma pandemia"

A partir disso, o professor diz acreditar "não no novo, mas, sim, de maneira nova". "As coisas na moda inevitavelmente irão mudar, tais como o comportamento, o consumo e o padrão estético", acrescenta. "Isso é preciso para captar o novo tempo que vivemos e colocá-lo nas roupas".

Nas palavras de Alessandro Michele, diretor criativo da Gucci, a esperança é "de que nunca mais voltemos ao 'normal', pois a vida que vivemos antes era terrivelmente insustentável".

Além da sustentabilidade, a moda grifada deve encarar um novo desafio pós-pandemia a respeito do conforto.