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Comportamento do Ângelo mudou após ouro, diz jovem que o acusa de homofobia

Ex-ginasta Vinicius Augusto fez novas acusações contra Ângelo Assumpção - Reprodução
Ex-ginasta Vinicius Augusto fez novas acusações contra Ângelo Assumpção Imagem: Reprodução

Ana Flávia Oliveira

Do UOL, em São Paulo

29/07/2021 04h00

O artista circense Vinícius Augusto Reis, de 21 anos, diz que Ângelo Assumpção, ex-integrante da seleção brasileira, mudou depois de ganhar o ouro na Copa do Mundo de Ginástica Artística em 2015. Os dois treinaram juntos no Esporte Clube Pinheiros entre 2015 e 2018 e dividiram apartamento por mais de dois anos. Nos últimos dias, vieram à tona acusações de que Ângelo humilhava um ginasta de apenas nove anos.

"As atitudes dele mudaram totalmente a partir do momento que ele ganhou aquela Copa em 2015. Todo mundo falava que subiu à cabeça e que ele virou outra pessoa. Começou a se achar um pouco, não respeitava mais ninguém, os técnicos... Não chegava no horário no treino. Eu presenciei isso porque eu treinava no mesmo horário que ele. Eu via ele não indo no treino na segunda-feira porque domingo ele estava em uma festa, estava cansado e falava que não ia", contou Vinícius ao UOL.

"Ele humilhava muito as pessoas, falava 'você é ruim, você é isso, você é aquilo'. Sempre apontando o dedo na cara dos outros."

Foi também em 2015 que Ângelo se viu envolvido em um caso de racismo que tem repercussão até hoje. Em vídeo divulgado na época, Arthur Nory, da seleção brasileira, compara a cor da pele do ex-colega, que é negro, a um saco de lixo. Nestas Olimpíadas, Nory relacionou o mau desempenho em Tóquio às críticas que ainda recebe em relação ao caso. Em entrevista ao UOL, Ângelo disse que a vida dele "parou" após o caso e que está, desde 2019, sem clube para treinar.

Nesta terça-feira (27), Vinícius publicou no Twitter um longo relato com acusações de humilhações e bullying praticados por Ângelo contra ele. O jovem de 21 anos também divulgou um vídeo que mostra Ângelo o xingando e lhe dando um tapa no rosto após prendê-lo dentro de um guarda-roupas. Ângelo ainda diz "sai do armário", uma expressão comumente usada no anúncio da orientação de homossexuais.

Vinícius conta que o vídeo foi gravado em 2018, quando ele tinha 17 anos e dividia com Ângelo o quarto de um apartamento alugado pelo clube. A filmagem, que teria sido divulgada em grupos de WhatsApp com o objetivo de humilhar Vinícius, consta em um processo aberto no Tribunal de Justiça Desportiva da Federação de Ginástica para apurar a demissão do ex-integrante da seleção.

"Favores infinitos"

Vinícius ainda relata que a partir de outubro de 2018 foi obrigado a fazer "favores", como lavar a roupa e a louça de Ângelo, depois que quebrou um fone emprestado pelo ex-colega. "Quando eu fui comprar esse fone, ele estava junto comigo no shopping, e falou 'não, você não vai comprar'. Ele sabia que eu não tinha dinheiro e que, se eu comprasse, ia dar problema depois". A solução proposta por Ângelo foi que Vinícius lhe devesse dez favores.

"Eu fui na dele. Só que nesses dez favores, às vezes, ele pedia uma coisa meio nada a ver, e eu falava 'não vou fazer'. Ele falava 'se você não fizer em tantos segundos, eu vou aumentar os favores'. E esses favores iam aumentando e não acabavam nunca e de repente virou favores infinitos."

O ex-ginasta conta que sempre tentou lidar com a situação sozinho, sem envolver técnicos e comissão do clube, mas que as coisas ficaram insustentáveis quando Ângelo começou a obrigá-lo a dormir na sala, em um colchão no chão. Em um final de semana, conta Vinícius, o colega voltou para a casa da família e trancou a porta do quarto, onde estavam a mochila e carteirinha, necessária para ele entrar no clube e se alimentar.

"Naquele momento, eu estava no meu limite, esgotado de todas as coisas que já tinha passado calado. Não tinha o que comer, sem minha carteirinha do clube e sem dinheiro para comprar comida", relembrou Vinícius.

O ex-ginasta conta que teve de ligar para o líder do apartamento, que pediu para Ângelo voltar imediatamente. Mas o ginasta só regressou no dia seguinte. "Quando ele abriu a porta, eu entrei no quarto e não queria olhar para cara dele. Ele começou a gritar, falando que eu não podia ter falado nada daquilo, que eu estava devendo para ele. Voltou a história do fone, falou que eu ia ter que pagar porque eu não estava cumprindo os favores... Eu falei para ele: 'não vou fazer mais favores para você, não vou fazer mais nada do que você pede, do que você manda'".

O jovem disse que resolveu compartilhar as experiências depois que Gabriel Alves acusou o ex-integrante da seleção brasileira de humilhá-lo antes. Em entrevista ao UOL Esporte no final de semana, Gabriel afirmou que desde quando era uma criança de apenas nove anos foi tratado por Ângelo, já adulto, por dois apelidos pejorativos: Rebeca Blackout e Leona, ambos fazendo referência a um garoto negro, gay, que se prostituía nas ruas de Salvador e cujos vídeos viraram memes em 2010. Em resposta enviada à imprensa e publicada nas redes sociais, Ângelo negou as acusações e disse que sempre teve bom relacionamento com todos os colegas do clube.

"É uma coisa que não concordo porque eu era um dos que não tinha boa convivência depois de um certo tempo e eu também via que ele não tinha essa boa convivência com todo mundo do adulto. Então, assim, quando ele postou aquilo, eu pensei assim: 'Meu Deus, como ele tem coragem de postar isso?!'. Ele falou que a acusação do Gabriel era mentira, eu pensei: 'vou ter que fazer alguma coisa'. Eu tenho bastante eventos, tem muitas coisas que aconteceram e eu tenho provas. Então, decidi fazer a minha parte."

Vinícius conta que teve uma convivência muito boa com Ângelo até o episódio do armário e que era fã do trabalho do ex-colega. "A gente foi super amigo, assim. Eu era fã para caramba dele. Entrei no clube justamente por causa dele, porque eu via muito vídeo dele. Mas a partir de um tempo apareceram umas coisas meio estranhas".

Ao final de 2018, Vinícius largou a ginástica depois que lesionou o pé. "Eu não era assim um ginasta", admite. "Em 2017, era minha chance de tentar vingar na ginástica. Eu estava indo bem, mas quando eu me machuquei, estragou o ano inteiro, não consegui competir. Tentei voltar em 2018, mas ainda senti dor. Talvez não era para ser. Eu saí".

O jovem voltou para sua cidade natal, Uberlândia, em Minas Gerais, e, em 2019, passou em "primeiro lugar", ressalta, em uma seletiva da Escola Nacional de Circo, no Rio de Janeiro.

O UOL tentou entrar em contato com Ângelo Assumpção por telefone e mensagem via WhatsApp, mas até a publicação deste texto não obteve resposta. O espaço está aberto para a manifestação do atleta.