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Brasileirão - 2020

Ex-lateral de Botafogo e Bahia trata síndrome rara, e mulher revela sonhos

Ex-lateral Jefferson pelo Botafogo e pelo Bahia - Arquivo pessoal e reprodução instagram
Ex-lateral Jefferson pelo Botafogo e pelo Bahia Imagem: Arquivo pessoal e reprodução instagram

Alexandre Araújo

Do UOL, no Rio de Janeiro (RJ)

30/09/2020 04h00

Botafogo e Bahia se enfrentam hoje (30), no Nilton Santos, pelo Campeonato Brasileiro. Entre os pontos em comum nas histórias dos dois clubes há o nome do ex-lateral esquerdo Jefferson, com passagens marcantes pelo Alvinegro e Tricolor baiano nos anos 90 e início dos 2000. O ex-jogador teve a carreira abruptamente interrompida há 18 anos, devido a uma rara doença: a Síndrome de Behçet.

Ainda hoje, realiza tratamento e a família tenta também driblar as dificuldades impostas pela pandemia do coronavírus. Apesar de tudo, se teve algo que permaneceu inalterado foi o enorme carinho que ele tem, tanto pelo Glorioso quanto pelo Esquadrão de Aço. Logo mais, Jefferson, que já foi protagonista em campo, será um dos espectadores deste duelo.

A partida, válida pela primeira rodada da competição, estava, originalmente, marcada para 9 de agosto, mas teve de ser adiada por conta da final do Campeonato Baiano, que teve a participação do Bahia.

Uma das sequelas com as quais o ex-jogador convive é uma dificuldade na fala e, por este motivo, Adriana Oltramari é quem explica tudo à reportagem. A esposa do ex-jogador descreveu como ele fica tocado em ver o carinho das torcidas com sua situação em um perfil de Instagram feito pela filha. Jefferson realizou sonho de ir ao Nilton Santos, e a família ainda almeja em ir à Arena Fonte Nova, em Salvador (veja mais abaixo).

"Jogos do Bahia e do Botafogo ele não perde (risos). Temos familiares que torcem para o São Paulo, então, ele também acaba assistindo bastante aos jogos. Mas, Bahia e Botafogo ele tenta assistir sempre", afirma ela, ao UOL Esporte.

Jefferson começou no Botafogo-SP em 1990 e, no ano seguinte, se transferiu para General Severiano. Foram três passagens pelo Alvinegro, onde conquistou o Troféu Teresa Herrera de 96 e o Campeonato Carioca de 97. No Bahia, foram mais dois anos e meio, tendo levantado duas edições do Baiano, em 1999 e 2001.

Em quase 12 anos de carreira, o ex-lateral ainda tem no currículo clubes como Palmeiras, Cerro Porteño, do Paraguai, Vasco, Sport e Atlético-MG. Quando estava próximo de assinar com o Juventude, foi internado e veio o diagnóstico de Síndrome de Behçet, doença que paralisou os movimentos e deu um ponto final à trajetória no futebol.

"Quando Jefferson adoeceu, ele estava em Caxias do Sul. Ele foi sozinho e eu estava com as crianças em Belo Horizonte. Então, no terceiro dia que ele estava lá, ainda não tinha assinado contrato com o Juventude, e veio a notícia de que ele estava internado, sem movimento e sem fala. Pensa em como a gente fica? Não tem nem como explicar. É uma sensação de quase não acreditar porque ele saiu tão bem de casa, tão feliz com o novo contrato. As crianças pequenas, 4 e 5 anos... Nossa! Prefiro até esquecer um pouco, quando é possível. Nem sei como a gente sobreviveu. Só Deus mesmo, não tem outra explicação", diz a esposa Adriana Oltramari.

De acordo com a definição do "Manual MSD", "a doença de Behçet é uma inflamação crônica dos vasos sanguíneos (vasculite) que pode causar feridas doloridas na boca e genitais, lesões na pele e problemas oculares. As articulações, sistema nervoso e o trato digestivo podem ficar também inflamados". Atualmente, o panorama de Jefferson está controlado, mas ele ainda convive com algumas sequelas.

"Dentro de todo o quadro, ele está bem. Agora, na pandemia, a gente busca proteger mais ainda, cuidar bastante. Faz tempo, graças a Deus, que não precisa internar, mas a doença, em si, está estacionada. Não evoluiu para mais nenhum caso grave. Ele ficou com sequelas, que foi o lado esquerdo paralisado e a fala, que a voz não voltou", conta.

Jefferson, ex-Botafogo, Vasco e Bahia, e a esposa Adriana - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Imagem: Reprodução Instagram

A fisioterapia passou a fazer parte da rotina do ex-lateral quase que de forma obrigatória. Profissionais de Educação Física, Adriana e a filha Maria Clara também tentam ajudar.

"Ela faz fisioterapia sempre, até pelo risco de atrofiar. Eu e minha filha somos profissionais de Educação Física, então, também ajudamos. Dentro do que é possível, a gente tem feito. Inclusive, há uns anos, fomos ao Rio com ele para uma consulta com um neurologista. Mas o que falou é que, agora, é tratar para não atrofiar nenhum dos membros, e esperar a evolução e o tempo mesmo. O cérebro ainda é um mistério, até para os médicos. Como a gente acredita em milagre, estamos esperando por um", relata

Além do aumento em relação aos cuidados necessários para a saúde de Jefferson, a pandemia de coronavírus também colocou um outro obstáculo. Segundo Adriana, está sendo, financeiramente, "a fase mais difícil".

"[Tratamento] Tem um custo. O plano de saúde contribui muito quando o Jefferson precisa de alguma consulta, alguma coisa. A gente paga o plano de saúde para ele, e o tratamento, vamos levando. Lutando bastante, tentando cada dia melhorar... Mas, diante de tantos problemas, até mundiais, como a pandemia, atrapalha. Está sendo, financeiramente, a fase mais difícil. Mas acho que para a maioria das pessoas, né?"

Adriana salienta que houve uma consequência direta no trabalho dela e da filha.

"Impactou bastante. Temos alunos de personal, que foi algo que diminuiu. Eles [alunos] também se preocupam, né? A gente nem sabe ao certo como é essa doença. Mas vamos seguindo as orientações e os cuidados. Tem meu filho [Pedro Henrique] também, que estava tentando a carreira no futebol, mas parou tudo e, agora, não sabemos como vai ficar", completou.

Desejo de voltar à Fonte Nova e ao Maracanã

Há quase duas décadas a vida de Jefferson e da família mudou totalmente. Desde então, vão "vivendo dia após dia". Porém, alguns planos não estão de lado. Quando foi ao Rio, aproveitou para assistir a um jogo do Botafogo no, hoje, Estádio Nilton Santos. Pretende ainda, poder visitar o Maracanã e a Fonte Nova, locais onde atuou e que passaram por reformas recentemente.

"A gente vai vivendo dia após dia, não temos muita coisa planejada. É vencer um leão todo dia. Mas mantemos alguns sonhos. Pensamos em, um dia, conhecer a nova Fonte Nova. Isso a gente comenta que quer ir. Quando fomos ao Rio, para a consulta, há uns cinco ou seis anos, fomos assistir a um jogo do Botafogo no Nilton Santos. Fomos lá conhecer. E a Fonte Nova, quando ficou pronta, eu falei a ele que quando estiver melhor, tiver condição, a gente vai lá conhecê-la. O Novo Maracanã ele também tem vontade. Foram estádios que fizeram parte da vida dele", conta.

Carinho da torcida

Uma das formas pelas quais Jefferson ainda recebe o carinho dos torcedores dos clubes por onde passou é por meio das redes sociais. O perfil no Instagram, criado por iniciativa da filha, costuma receber mensagens e marcações de páginas de torcidas.

"A gente mostra para ele. Muita gente queria saber notícias e tudo mais. Minha filha, então, criou um Instagram e, de vez em quando, o pessoal marca ele, as torcidas, e mostramos para ele. É importante. A vida útil de um atleta é muito curta e a dele foi mais curta ainda. Então, ainda ser lembrado, é muito legal", ressalta Adriana.

Convocado para seleção

Em 1995, Jefferson foi convocado por Zagallo para defender a seleção brasileira em um amistoso com Honduras, que aconteceu no Serra Dourada. Foi titular e fechou o quarteto defensivo com Bruno Carvalho, Argel e Gelson. O momento está eternizado na parede de casa, onde há um quadro com a foto dele vestindo a amarelinha.

Lateral-esquerdo Jefferson defendeu a seleção brasileira em 1995 - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

"Foi uma emoção muito boa. É o auge de um atleta ser convocado. Dentre tantos jogadores bons, você ser lembrado pelo técnico. Foi uma coisa muito emocionante. Até temos um quadro."

Sob muita chuva, o jogo terminou empatado em 1 a 1, com gols de Presley Carson, para Honduras, e Túlio Maravilha, para o Brasil. A seleção, naquele 29 de março, foi a campo com Danrlei; Bruno Carvalho, Argel, Gélson Baresi e Jefferson, Leandro Ávila, Zé Elias, Juninho Paulista e Souza; Viola e Túlio Maravilha. Sergio Manoel, Amoroso e Sávio entraram. Jefferson, Juninho Paulista e Souza foram os substituídos.

Passagem pelo Cerro Porteño

Jefferson, ex-Botafogo e Bahia, Adriana e o filhos Maria Clara e Pedro Henrique - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

O lateral esquerdo também teve uma experiência fora do Brasil. No segundo semestre de 1994, defendeu o Cerro Porteño, do Paraguai, levado por Paulo César Carpegiani, que, à época, era o treinador da equipe.

Adriana avalia o período que eles estiveram no país vizinho como uma "fase muito boa" e ressalta que Jefferson tinha o carinho da torcida.

"Eu nasci em Pato Branco [município do Paraná] e aqui é bem próximo da fronteira de Foz do Iguaçu. Mas, a princípio, fomos para lá, receosos. Eu mesmo não conhecia muito do futebol, mas o Jefferson, desde o início, falou que seria muito bom. E realmente foi muito bom. Foi o Carpegiani que o levou. E a torcida gostava muito dele. Tanto que, quando voltou para o Botafogo, ninguém queria que ele voltasse. Foi uma fase muito boa lá", lembra.

Campeão de atletismo

Não foi apenas no futebol que Jefferson teve conquistas. Antes da fama conduzindo a bola pelo gramado, os pés do ex-lateral eram notáveis pela velocidade. Adriana conta que, em 1986, ele foi campeão nos 800 metros em um torneio nacional.

"Ele acompanha não só o futebol, mas também os outros esportes. Jefferson foi campeão brasileiro de atletismo antes do futebol. Ele também gosta de atletismo e assiste aos torneios. Para quem um dia foi atleta, vai ser sempre atleta, independentemente da condição que estiver, da idade... O amor pelo esporte não tem como acabar e, aqui em casa, somos todos envolvidos com esporte."

FICHA TÉCNICA:

BOTAFOGO x BAHIA
Competição
: Campeonato Brasileiro
Data: 30 de setembro de 2020 (quarta-feira)
Hora: 21h30
Local: Nilton Santos, no Rio de Janeiro (RJ)
Árbitro: Sávio Pereira Sampaio (DF)
Auxiliares: Daniel Henrique da Silva Andrade (DF) e José Reinaldo Nascimento Junior (DF)
VAR: Wagner Reway (PB)

BOTAFOGO: Gatito Fernández; Marcelo Benevenuto, Rafael Forster, Kanu; Kevin, Honda (Rentería), Caio Alexandre, Victor Luís; Bruno Nazário, Matheus Babi, Kalou (Pedro Raul). Técnico: Paulo Autuori

BAHIA: Douglas Friedrich; Nino Paraíba, Ernando, Juninho, Juninho Capixaba; Gregore, Ronaldo; Ramires, Rodriguinho, Marco Antônio (Élber); Saldanha (Gilberto). Técnico: Mano Menezes