Ele já apitou clássico entre Palmeiras e Corinthians. Hoje, vende pastel
Marcelo Rogério já foi muito xingado na vida. Até dezembro, era juiz de futebol. Apitou clássicos do nível de Palmeiras x Corinthians, com Felipão e Tite nos bancos de reservas. Agora, o ambiente de trabalho é muito mais cordial. O ex-árbitro abriu uma pastelaria na Zona Sul de São Paulo. A ideia do negócio apareceu do nada.
"Num final de semana eu estava deitado na rede da casa da minha noiva em Santos e saiu: 'vou abrir uma pastelaria'. Veio tudo na cabeça. Vai se chamar Pastel do Juiz, bolei o logo e a decoração".
Na iminência de se aposentar, o ex-árbitro queria um negócio para substituir o dinheiro ganho como juiz. Assim que levantou da rede, Marcelo Rogério foi para internet comprar equipamentos para a futura pastelaria. O raciocínio é que a região do estabelecimento tem hospitais, universidade e comércio. E por mais que exista crise, saco vazio não para em pé.
"Pensei que comida não tem jeito, o cara tem que comer. Também precisava ser rápido porque a vida hoje está corrida. A resposta foi pastel porque é impossível a pessoa não gostar de pastel".
O raciocínio se provou certo e todos os dias são vendidas 100 unidades. Os de carne e os de queijo são os preferidos dos clientes. Eles comem numa decoração que remete aos tempos em que Marcelo Rogério era juiz. Há camisas de árbitro, fotos dele apitando e os símbolos dos quatro grandes clubes de São Paulo.
O dono conta que tem camisas de vários times e muitas delas autografadas por jogadores famosos. A ideia era colocar parte delas na pastelaria, mas o medo de chamar ladrões fez mudar a decoração.
"Era chamariz para bandido. Capaz estourar a porta para roubar"
Os jogadores mais complicados
"Já tinha comido bastante, mas feito, nunca. Não sabia nem como fritava".
Marcelo Rogério tratou de aprender e inaugurou a pastelaria em abril. Ele também tem uma república para universitários, é chaveiro na região e conhecido de todo mundo. Pela decoração, os clientes desavisados percebem o passado no apito e a conversa vira uma entrevista sobre os tempos de futebol.
As pessoas querem saber como é preparação de um juiz, o que se fala durante uma partida, os jogos mais difíceis e qual jogador era gente boa e quem dava trabalho. Ele não fica em cima do muro.
"O jogador mais legal que encontrei foi o Marcos (goleiro) do Palmeiras. Os mais difíceis foram Luis Fabiano, Kleber (gladiador) e Chicão (ex-zagueiro do Corinthians)".
Marcelo Rogério ressaltou que na pastelaria ninguém quer xingar e os clientes nem lembram do clubismo. Mesmo quando provocados, continuam cordiais e falando de futebol.
"Brinco: 'aproveita que não vai ver árbitro de perto tão cedo'. O cara dá risada".
O jogo mais difícil
O ex-árbitro já apitou clássico como Palmeiras x Corinthians e Santos x São Paulo, finais, mas o jogo mais complicado que apitou foi Palmeiras e Botafogo (SP), pelas quartas de final do Paulistão de 2015. A partida foi cheia de polêmicas porque o uniforme do árbitro estampava Crefisa, mesmo patrocinador do Palmeiras.
Marcelo Rogério contou que foi contra entrar com aquela camisa até o último minuto. Mas quem assina e quem recebe o cheque não estavam preocupados com a temperatura do confronto. Para piorar, os jogadores do Botafogo (SP) não hesitavam e a cada marcação jogavam o patrocínio na cara do juiz.
"É difícil uma equipe do interior chegar. Tinha que entender a situação. Num caso assim, não posso meter um amarelo, um vermelho por reclamarem falando Crefisa. Eu passava para eles, aqui é um profissional, pode confiar. Pode ter erro, mas desonestidade e má fé, não. Fica tranquilo".
Os dias complicados no gramado se foram, mas Marcelo Rogério não se afastou totalmente do futebol. Ele é avaliador dos árbitros para a Federação Paulista de Futebol e a CBF. Muito mais tranquilo e sem exigir preparo físico em dia.
"Antes, era tudo regradinho. Refrigerante, gordura e chocolate não podia. Eu corria 15 quilômetros por dia. Quando concentrava não podia nada. Contrabandeava um Bis para comer escondido no quarto. Hoje, dá para comer meu pastel tranquilo. O preferido é de carne".
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