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Vinte e Dois

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Dominação de Trae Young acende sinal de alerta no Milwaukee Bucks

Trae Young, do Atlanta Hawks, tenta o arremesso contra o Milwaukee Bucks nos playoffs da NBA - Jeff Hanisch/USA TODAY Sports
Trae Young, do Atlanta Hawks, tenta o arremesso contra o Milwaukee Bucks nos playoffs da NBA Imagem: Jeff Hanisch/USA TODAY Sports

Vitor Camargo

Colunista do UOL

25/06/2021 04h00

Isso foi o que eu escrevi no fim da minha coluna com a prévia das finais do Leste entre Bucks e Hawks:

"Uma voz dentro de mim me diz para apostar em Atlanta, porque eu não confio nesse time dos Bucks. Se eu tivesse confiança no técnico de Milwaukee para fazer ajustes e tomar decisões, seria diferente, mas não é o caso."

Apesar disso, um lado mais racional dentro de mim prevaleceu; eu apostei Bucks em 6 para a série, em parte porque Milwaukee é simplesmente um time melhor. E eu estaria mentindo se dissesse que, no dia seguinte ao Jogo 1 eu não acordei profundamente incomodado de não ter escutado esse instinto e ido com Atlanta.

Não digo isso por causa da derrota no Jogo 1; foi apenas o primeiro duelo de uma série de sete, e sempre é um erro reagir em excesso à primeira partida. Tem muito chão, e Milwaukee pode perfeitamente virar a série e ir para as finais. O problema foi como o Jogo 1 se desenrolou, um roteiro que seguiu EXATAMENTE tudo que eu temia por parte dos Bucks e que me fez querer apostar nos Hawks em primeiro lugar: Mike Budenholzer tratou as Finais de Conferência como um jogo de temporada regular, demorou demais para fazer os ajustes, Milwaukee não conseguiu acertar nada de fora do garrafão, Khris Middleton atrapalhou todo o ataque e foi péssimo nos arremessos (6-23), e Trae Young simplesmente DESTRUIU a defesa em drop dos Bucks durante três quartos até o adversário finalmente se adaptar. Todos os receios sobre Milwaukee - e, na verdade, todos os problemas dos Bucks de modo geral - estiveram em primeiro plano diante de um time mais faminto, controlado e confiante.

A grande história do jogo, é claro, foi Trae Young. O armador dos Hawks continuou sua pós-temporada espetacular com 48 pontos e 11 assistências no primeiro jogo - números que nenhum jogador jamais teve numa final de conferência - e não importa o quanto os Bucks tenham errado na sua marcação, NINGUÉM vai colocar esses números numa final de conferência só porque o outro lado errou na estratégia. Trae é uma superestrela, um dos melhores jogadores ofensivos da NBA, e de modo algum eu pretendo diminuir o que ele fez no próximo parágrafo.

Mas, por mais que o armador seja espetacular, também é verdade que os Bucks facilitaram demais a vida do armador. Eu escrevi na prévia sobre como Milwaukee não poderia usar sua defesa habitual (com o pivô recuando para o garrafão contra o pick-and-roll) porque Trae iria DESTRUIR esse tipo de marcação, e ofereci algumas soluções sobre como poderiam evitar oferecer esse tapete vermelho para o jogador mais quente da pós-temporada. Os Bucks, aparentemente, não foram avisados desse problema - nem que Knicks e Sixers já tinham apanhado por usar essa mesma defesa - e por três quartos simplesmente não fizeram NADA de diferente, continuaram recuando os pivôs contra o garrafão e deixando Young fazer o que queria da meia distância.

O nível de despreparo dos Bucks nesse sentido foi tão extremo que os Hawks começaram a usar não só Trae, mas também outros jogadores como Huerter e Bogdanovic para explorar o drop e conseguir cestas fáceis.

E, por quase três quartos inteiros, os Bucks simplesmente deixaram isso acontecer; não tentaram ajustar, não tentaram trocar a defesa, nada que alterasse o ritmo e tornasse a vida de Young mais difícil. Foi apenas faltando menos de dois minutos no terceiro quarto que Budenholzer finalmente saiu do seu coma e fez o ajuste mais óbvio para tirar o floater do armador da meia distância: colocar Giannis de pivô, alguém que não só é muito mais equipado para se recuperar contra Trae no garrafão como é um quinteto que permite ao time trocar continuamente a marcação e impedir o astro adversário de conseguir espaço para atacar, forçando o armador a chutar de fora - onde ele tem sofrido nos playoffs, acertando apenas 32,8% das bolas longas. Funcionou: desde a entrada de Giannis como pivô no fim do terceiro quarto, Young arremessou 1-7 no total. Milwaukee foi +8 com Giannis de pivô; o time foi -14 com Lopez na função.

Algumas pessoas reclamam que eu pego muito no pé do técnico dos Bucks, mas o que mais eu posso dizer? Todo mundo sabia antes do jogo que Trae contra o drop era a receita para o desastre, mas ele insistiu nisso mesmo assim e perdeu como consequência. Jeff Teague, que jogou 0 minutos nas partidas decisivas contra os Nets, chegou a defender Trae Young em certo momento (e tomou 8 pontos seguidos na cabeça), e o mesmo é verdade sobre Bobby Portis. O uso do quinteto baixo - que permite muito mais variedade defensiva e foi a que quase salvou o jogo para os Bucks no último quarto - era a solução mais óbvia disponível, mas estava longe de ser a única; eu mesmo sugeri algumas alternativas que não impedissem que Milwaukee jogasse com Brook Lopez e evitassem medidas tão extremas. E, se o Jogo 1 deixou uma coisa clara, é que o time vai precisar delas.

A formação com Giannis de pivô vai ser fundamental para a série, sem dúvida, mas é menos pela formação em si e mais pelo que ela trouxe de opções defensivas para - no caso, a habilidade de trocar a marcação em Trae. Mas esse quinteto não é perfeito - o time sofreu bastante com os rebotes defensivos no quarto período - e também dificilmente é factível para Milwaukee jogar toda a partida com Giannis de 5, então Bud vai precisar encontrar outras variações para defender Young sem se expor à chuva de meteoros do Jogo 1.

Alguns dados relevantes - embora previsíveis - foram se destacando ao longo do confronto. O mais evidente é que Portis não pode ficar em quadra contra Trae Young, algo que os Bucks já tinham entendido e se adaptado contra os Nets, mas voltaram atrás no Jogo 1. Usar mais Giannis de pivô é óbvio, e eu gostaria de ver testes também formações com Tucker na posição quando Giannis descansar. O resto das respostas vai exigir mais trabalho.

Uma que eu sugeri, mas Milwaukee ainda não tentou, foi inverter a marcação de Giannis e Lopez no garrafão - curiosamente, a estratégia que os Hawks usaram na defesa. Outro ponto é a falta de variação: Trae é um gênio ofensivo, e por melhor que seja sua defesa, se você usar a mesma tática repetidamente ele vai encontrar um jeito de contornar. Você precisa alternar, misturar, e confundir para impedir que o oponente estabeleça um ritmo.

Por exemplo: se Lopez vai recuar para o garrafão, eu gostaria de ver o marcador de Trae passando por baixo do corta-luz e convidando o chute. O armador do Hawks não é um arremessador de fora tão bom quanto sua fama indica - 34 3PT% na carreira, 33% nessa pós-temporada -, e a essa altura é melhor tomar o chute de três que a infiltração do armador. Claro, se você deixar Trae MUITO livre de três o tempo todo ele vai embalar e acertar um monte de chutes (só ver o que aconteceu com Teague), mas Milwaukee tem ótimos defensores capazes de se recuperarem para contestar e atrapalhar o armador.

Embora você não possa fazer isso o tempo todo, é uma opção que Milwaukee precisa explorar pelo menos em algumas posses para tirar o floater. Outra alternativa interessante é simplesmente fazer a blitz e dobrar contra Trae, especialmente se Lopez não estiver em quadra. É compreensível a hesitação dos times em tentar essa tática arriscada, pois o armador é ótimo passador, e o elenco de Atlanta é cheio de playmakers secundários e ótimos arremessadores que podem castigar Milwaukee em um 4-contra-3. Mas se Young vai simplesmente destruir qualquer defesa que você monte, é melhor tirar a bola das mãos dele e forçar o resto do time a vencer a partida. Não existe uma resposta certa universal - Trae é bom demais para isso - mas existem respostas erradas, e os Bucks precisam parar de insistir nelas.

A boa notícia para Milwaukee é que seu ataque foi excelente no Jogo 1; a defesa dos Hawks não teve resposta, e os Bucks conseguiam todos os arremessos fáceis que precisavam perto do aro e achavam bolas livres de três pontos quando os Hawks reagiam - isso é, quando Khris Middleton não sequestrava o ataque para chutes ruins em isolação (ele foi 6-23 no jogo). O elemento problemático é que esses bons arremessos simplesmente não caíram - 8-36 atrás do arco em chutes majoritariamente livres - o que continua uma preocupante tendência. Mas o ataque foi quase impecável, e eu não vejo tantas respostas possíveis para Atlanta nesse sentido; os Bucks só precisam dar um jeito de acertar essas bolas, e a série é totalmente outra.

Trae Young e os Hawks acertaram o primeiro golpe no Jogo 1; vamos ver como ambos os times se adaptam no Jogo 2.